Adoção: Um compromisso para a vida toda

Inexplicável, desmesurado e eterno. Assim se podem definir os laços que unem um animal de estimação e o seu tutor.

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Inexplicável, desmesurado e eterno. Assim se podem definir os laços que unem um animal de estimação e o seu tutor.

Texto por Juliana Machado

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

Amor sem data de validade

Desde o momento em que chegam às nossas casas, maiores ou mais pequenos, mudam a nossa realidade. Passam a ser parte do nosso lar, das nossas tarefas e das nossas preocupações. O seu bem-estar físico e emocional passa a fazer parte das prioridades e, inevitavelmente, transformam-se em membros da família como qualquer outro.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

As idas às lojas de animais ou mesmo ao supermercado passam a ter um sabor especial. Um brinquedo, uma nova cama ou uma ração diferente do habitual adicionam-se ao carrinho na expectativa de surpreender aqueles que nos esperam em casa, todos os dias, com ânsia e folia.

Apesar da crescente consciencialização para o papel dos “amigos de quatro patas”, em pleno século XXI, chegam-nos dados que são verdadeiramente preocupantes.
Se por um lado o número de adoções aumentou com a pandemia, numa clara tentativa de combater a solidão, é também verdade que o taxa de abandono em Portugal nunca foi tão alta.

Em 2020 a taxa de adoção aumentou tanto para gatos como para cães, na ordem dos 78% e 15%, respetivamente. O mesmo aconteceu em 2021, ano em que de janeiro a março foram adotados mais de 59 mil cães e quase 37 mil gatos, segundo dados do Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC).

Dados oficiais referem que, em Portugal, são abandonados cerca de 30 mil animais por ano, sendo estes maioritariamente cães. Destes, apenas uma pequena percentagem volta a ter um lar e uma família. Em 2022, o abandono animal aumentou já cerca de 35%. Trata-se, por isso, de uma média de média de 119 animais abandonados por dia.

Para este que é o maior número já registado no país, há diversas razões à vista. A evidente diminuição do poder de compra, derivada da perda de empregos durante a pandemia e da inflação dos preços, a falta de condições em casa e o pouco tempo para estar com os animais são as justificações mais comuns para o abandono animal.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

Com a chegada do mês de agosto, em que habitualmente se regista um pico no número de animais deixados “à sua sorte”, importa chamar à atenção para aquilo que são as responsabilidades de cada tutor e para o ato mais reprovável de todos – o abandono.
Atualmente, há várias opções para aqueles que precisam de ajuda para tomar conta dos seus patudos, nomeadamente no período de férias, algumas mais dispendiosas do que outras. Desde pet sitting, hotéis para cães e gatos, às clínicas veterinárias que, em muitos casos, aceitam estadias, é importante lembrar que o abandono nunca é solução.

Liberdade pelos voluntários da SPAG

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

As manhãs de sábado começam bem cedo no Centro de Recolha Oficial Animal de Guimarães (CRO). Pelas 08h30, os voluntários da Sociedade Protetora dos Animais (SPAG) já estão reunidos nas instalações para proporcionarem aquilo que se podem classificar como momentos de liberdade.

Na zona circundante ao CRO é bem percetível a quem passa o que está a acontecer. Dezenas de voluntários levam cães pelas trelas para um passeio, para uma corrida ou até para um mergulho.

Em 2018, os membros contavam-se pelos dedos de uma mão, mas a verdade é que o movimento foi crescendo e, desde o início de 2022, já ultrapassam as sete dezenas.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

Depois da pandemia, tempo em que os animais tiveram muito pouco contacto social, “a situação estava tão dramática que decidimos estender o convite a amigos porque estávamos quase em desespero”, contou Isabel Rodrigues, responsável da SPAG, acrescentando que quando foi alcançada a meta dos 22 voluntários todos se emocionaram.

“As pessoas vinham para passear os cães, mas não conheciam esta realidade. Quando perceberam efetivamente o que é um canil, houve uma onda de comoção e a partir daí recebemos uma avalanche de amor”, confessou.

“Temos pessoas que vêm da Caniçada, de Famalicão, de Braga, de Fafe e que continuam a vir sábado após sábado. É o efeito contágio”, elucidou Isabel Rodrigues.

Alguns voluntários acabam por se render aos patudos que passeiam. Afeiçoam-se e levam-nos para casa.

O grande número de membros do SPAG permite agora cumprir com distinção todos os objetivos: retirar os animais que estão nas boxes e nos parques, passeá-los durante as cerca de duas horas disponíveis, e também promover adoções.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

“Durante este tempo é-lhes possível esticar as patinhas, ter mimos e socialização. Fazemos tudo o que podemos no tempo que nos é permitido”. Ainda assim, é um tempo que parece ser insuficiente para as necessidades dos animais.

“Já pedimos inúmeras vezes para aumentar o horário de voluntariado para que possamos vir cá ao final do dia, tanto ao presidente da Câmara Municipal, como à equipa técnica do município. Até agora, nenhum dos pedidos teve resposta”, constatou.

A seu ver, existe “muito a melhorar nas instalações do CRO” e é necessário “muito bom senso, que tem de ir muito para além daquilo que diz a lei, nomeadamente no que às boxes diz respeito ao espaço que animal deveria ter”. Assim, defende que “a causa animal deveria ser levada a sério pelo município” e critica ainda a falta de investimento nas instalações do CRO.

Elencando que o que a move não são o número de adoções, mas sim as adoções de qualidade, a associação tem levado a cabo um papel ativo na divulgação não só através das redes sociais, mas sobretudo através do passa a palavra.

Outra das preocupações da SPAG é precisamente o acompanhamento após a adoção de um animal. É preciso verificar as condições em que este ficará na sua nova casa, bem como a sua adaptação, evitando assim um possível caso de abandono.

Com a chegada do final da manhã, pelas 11h30, é hora de voltar a enfrentar a realidade e devolver os patudos ao lugar para onde não costumam gostar de voltar.

As duas horas sabem a pouco aos cerca de 50 gatos e 100 cães que aproveitam todos os momentos para usufruir de companhia, afeto e carinho.

Quanto aos membros da SPAG, tiram a habitual fotografia de grupo que eterniza mais uma sessão de voluntariado e despedem-se. Dentro de uma semana, voltam a marcar presença na rua 24 de Junho, em Aldão.

“Somos o momento deles de alegria e eles são o nosso”

Nasceram com um número reduzido de voluntários, mas hoje já são dezenas. Desde os mais jovens aos mais velhos, todos consideram o tempo passado no Centro de Recolha Animal como uma terapia.

Cada um deles tem uma história para contar sobre como lá foi parar e de como foi a sua primeira experiência junto dos animais.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães


Para Vânia Freitas, voluntária da SPAG, marcar presença no CRO aos sábados de manhã “não é um trabalho porque é tudo feito com gosto”.

Decidiu experimentar há alguns sábados atrás e desde então que percebeu que “valia muito a pena”. “É um grupo muito bom e acho que se faz aqui um trabalho cívico. O que fazemos aqui é muito bom para os animais. Somos o momento de alegria deles e eles são o nosso também”, vincou.

Salientando que é sempre um momento de felicidade quando sabem que um animal é adotado, a jovem voluntária reitera a necessidade de consciencializar a população de que “um animal não é só para uns meses” e que “sim, vai dar trabalho, mas é a maior recompensa de todas”.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

Com apenas oito anos, Marta Castro da Silva é a mais jovem voluntária do SPAG. Revelou à Mais Guimarães que os cães são a sua paixão e que “estava muito nervosa na sua primeira vez no CRO”.
Agora, várias semanas depois, é presença assídua nas instalações. Costuma fazer-se acompanhar do seu pai, mas mesmo quando este não pode vir, Marta faz questão de pedir boleia a outro voluntário.

“Gosto de passear os cães, gosto muito de como eles são e sinto-me muito bem à beira deles”, confessou, acrescentando que um dos seus sonhos é levar um deles para casa.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães


Rafael Araújo percorre cerca de 36 quilómetros para alimentar a sua paixão pelos animais. Natural da Caniçada (Gerês), diz que a viagem até Guimarães “junta o útil ao agradável”, uma vez que lhe permite estar com os animais e visitar a sua namorada. Ouviu falar do CRO a primeira vez através de um colega, e desde aí que tem vindo quase todas as semanas.
“Estando a semana toda em teletrabalho, é bom dar uma volta com eles até porque é a única altura da semana em que se sentem livres”, finalizou.

A substituição da placa de “animal perigoso” para “Júnior” foi uma conquista celebrada por todos.”

Helena Semelhe

Reiki: Um passo em frente na cura

A história do Júnior é daquelas que emociona todos aqueles que passam pelo CRO. Pode mesmo dizer-se que é um caso de sucesso, quando muitos já não acreditavam ser possível.

Helena Semelhe teve o seu primeiro contacto com o Júnior em abril, numa das suas primeiras vezes nas boxes do CRO.

A placa “animal perigoso” fazia jus ao estado de espírito do patudo. “Ele ladrava imenso e ninguém se conseguia aproximar dele. Houve ali uma comunicação, entre o olhar dele e o meu, que não consigo explicar. Foi como um pedido de ajuda”, explicou Helena, acrescentando que a possibilidade de aplicar Reiki nos animais foi um dos motivos que a levou a ingressar na SPAG. Detentora do curso de Reiki nível três, considerou que a técnica poderia ser uma grande ajuda “uma vez que pode ser aplicada em qualquer ser vivo”.

© Cláudia Crespo / Mais Guimarães

Sábado após sábado, durante duas horas, por mais de dois meses, “ficava sentada em frente à box do Júnior a dar-lhe Reiki”. Os resultados são percetíveis: ao fim do primeiro mês conseguiu tocar-lhe e ao fim de dois meses foi possível tirá-lo da box.
A substituição da placa de “animal perigoso” para “Júnior” foi uma conquista celebrada por todos.

Mas o caminho é longo e ainda há muito a fazer para que Júnior reestabeleça a confiança, não só nas pessoas, como nos da sua espécie. Para além de Helena, o único que consegue tocar-lhe é o seu tratador, que o alimenta diariamente.

“Não sabemos muito bem o passado dele, mas sabemos que a dona faleceu e ele foi entregue aqui. Sabemos que lida com a dor da perda. Ele não lida bem com a presença de outros cães, mas está a controlar-se e está a evoluir muito”, revelou.

“Este foi o meu primeiro desafio e o meu primeiro amigo para a vida”, confessou.

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