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La Fura dels Baus: “Voltar a Guimarães 10 anos depois seria muito bom”

Artigo publicado na edição de fevereiro da revista Mais Guimarães.

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A Capital Europeia da Cultura já passou por Guimarães há 10 anos, mas o tempo não é suficiente para apagar todas as memórias. Miki Espuma foi o diretor musical dos espetáculos de La Fura Dels Baus em 2012 e, à Mais Guimarães, conta como foi trabalhar com os vimaranenses.

© Direitos Reservados

Estiveram em Guimarães há já 10 anos…

O trabalho em Guimarães foi único, porque nunca, ou muito poucas vezes, tens a oportunidade de trabalhar cinco espetáculos nas mudanças de estação. Começou em janeiro, depois primavera, verão, outono, e depois outra vez no Natal. Para a Fura é uma experiência única e inesquecível.

Jürgen Müller (diretor artístico), que infelizmente faleceu no ano passado, foi visitar a cidade várias vezes, acho eu. Eu trabalhei nestes espetáculos como compositor musical apenas e não conhecia a cidade antes dos espetáculos. Mas, realmente, é uma cidade com um tamanho que a faz totalmente habitável e amável, uma cidade comodíssima para viver.

“Guimarães deu um salto importante no seu lugar no mundo”

Miki Espuma

Lembro-me das pessoas muito, muito prestáveis e muito, muito amáveis. Sabes que, quando vens numa cidade grande, como Barcelona, apercebes-te de que as cidades mais pequenas são mais habitáveis, são mais fáceis para conviver.

Trabalharam com voluntários, pessoas que muitas vezes nunca viveram o mundo do espetáculo. Como é que foi?

Perfeito! A Fura, desde, penso, o espetáculo das Olimpíadas, começamos a trabalhar na rua com formatos muito grandes, com elementos de cenografia. Recordas, por exemplo o boneco gigante. Estas coisas são para trabalhar com voluntários, precisas sempre de mais gente do que aqueles que pertencem ao grupo. Assim, é claro que o trabalho começa uma semana antes do espetáculo.

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Todo esse contacto e essa conexão com as pessoas da cidade faz-nos entender melhor a cidade, o país, a própria gastronomia… As pessoas levam-te a comer ao melhor restaurante, ou levam-te a comer pratos típicos. Numa semana, entras no mundo da cidade e é muito mais fácil entender e compreender a filosofia, neste caso, do norte de Portugal.

Toda o gente tinha a ideia de colaboração desde o primeiro momento. Não houve nenhum momento de conflito, foi uma relação perfeita. Tanto com o grupo de caixas, tradições, com a orquestra municipal… Fizemos bons amigos! Não tenho nenhuma queixa nem tenho nenhum problema em dizer que as pessoas foram amabilíssimas.

Trabalhar com 50 ou 100 pessoas de uma cidade, neste caso em Guimarães, implica mais tempo de ensaio, de reuniões, de colaboração entre a filosofia da Fura e a maneira de ser das pessoas. Acho que, entre Portugal e a Catalunha há uma relação de ponta a ponta da península. Ao mesmo tempo, acho que Portugal tem um aspeto muito mediterrânio, apesar de ser um país atlântico. Há algo na maneira de ser dos portugueses que se acopla perfeitamente com a maneira de ser dos catalães.

“Este é o jogo da Fura dels Baus, construir novas tradições para países ou cidades”

Miki Espuma

Como é o processo criativo de La Fura dels Baus?

Neste caso, trabalhamos na equipa com o Jürgen Müller, com o guião e a sua ideia, de uma forma um pouco crítica. Construímos uma tradição inventada, uma tradição nova. Pode parecer uma contradição, duas palavras opostas, tradição e nova, mas este é o jogo da Fura dels Baus, construir novas tradições para países ou cidades novas também. Acho que, neste caso, Guimarães deu um salto importante no seu lugar no mundo. Criar esta tradição com os cavalos, o boneco gigante, com as tradições antigas… toda esta mistura construiu uma nova tradição. É como um jogo de contradições entre duas palavras que parecem contrárias, mas que, em teatro, é permitido. Construir uma tradição nova, que nunca foi feita, pode permitir que a partir desse ano, a cada ano, haja uma repetição dessa tradição até que consigas construir uma verdadeira tradição de 20 ou 100 anos. Sei que é uma loucura, mas é o jogo.

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Como foi a reação dos vimaranenses?

O mesmo grupo, as mesmas pessoas, com diferentes ideias, construímos cada mudança de estação do ano na cidade. Fomos do Toural e chegamos ao Castelo. O público foi sempre fiel. Isto é maravilhoso para um grupo de teatro. Os cinco espetáculos foram seguidos com muita atenção, sempre cheios. Passaram 10 anos e lembro-me como se fosse ontem, porque foi muito emocionante que cada trabalho tivesse a mesma reação do público, super entusiasta. Não posso dizer nada mau de Guimarães. Era um milagre pensar que o público aparecia sempre. Para nós foi emocionante.

Gostavam de voltar?

Que pergunta! Só te digo uma coisa, recuperando o que disse anteriormente sobre construir uma tradição, adorava voltar a Guimarães para repetir a tradição. Com cinco espetáculos num ano… Quando Guimarães quiser, a Fura sempre está disponível. 10 anos depois e depois de tudo isto do covid, toda a gente fechada em casa, era perfeito e uma forma de aliviar e abrir as janelas. Voltar a Guimarães 10 anos depois seria muito bom.

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