Mauro Fernandes: “O financiamento deve estar afeto a projetos ou a objetivos”

Desagrado com o corte nos apoios ao Xico Andebol, num ano marcado por um aumento no número de eventos, Mauro Fernandes, presidente do clube, não escondeu o desagrado com a redução das verbas destinadas ao clube. O dirigente já expôs o descontentamento a Domingos Bragança, presidente do município, e acredita que alguns problemas serão resolvidos.

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Revelou, recentemente, desagrado com os últimos apoios da autarquia. O que está na base do seu descontentamento?

Depois do ano que findou e do trabalho que tivemos muito próximo com o município, tendo o município, inclusive, importado alguns dos nossos projetos e ideias, que agora replicará para outros clubes, estávamos à espera de um reforço da verba e não de um corte, nomeadamente na rubrica de eventos em que realizamos mais eventos do que nunca, relatório de atividades do Xico Andebol atualizado em março regista mais de 423 eventos desde Setembro, e não estamos contabilizar os eventos dos nossos projetos especiais/socais, equipa de andebol adaptado e o Walking Handball. Foi um corte de 60% (de 13 mil euros para 5 mil), num ano em que o município duplicou essa verba. Fomos apanhados de surpresa. É uma medida discriminatória pela negativa com o Xico Andebol, num ano em que o município nos considerou o “Projeto Desportivo do Ano” e o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) também. Tivemos reconhecimentos de gestão que nunca existiram na história do clube, e que não existem em Guimarães, quer a nível regional e nacional. Passamos neste mandato a ser o maior clube da Associação de Andebol de Braga (AAB), com mais atletas inscritos, somos o único clube certificado como entidade formadora da AAB e integramos os 8% a nível nacional. É para nós incompreensível que o município aproveite e trabalhe os projetos do Xico Andebol e depois faça um corte no apoio aos eventos de forma inexplicável. É ofensivo para o Xico Andebol.

Acresce a este problema, um mais complexo. O Xico Andebol, ao contrário de outros clubes, não tem apoios para obras nos últimos seis anos. E o clube, tendo pavilhão próprio, tem mais um encargo adicional. E o Xico Andebol, de momento, tem de alugar mais quatro ou cinco pavilhões. A questão é simples. Ou se fecha a porta, porque não é viável, ou mantém-se a porta aberta e as despesas recaem sobre quem financia, de alguma forma, o clube, que são os atletas, os pais, os sócios e os patrocinadores. O que contraria por completo a lógica do clube e da missão do andebol em Guimarães. O Xico Andebol é um clube popular e acessível e não queremos elitizar o clube limitando quem a ele pode aceder para iniciar ou manter a prática desportiva. E sabemos as dificuldades que os pais têm. Não queremos seguir esse caminho, mas se o clube se quer manter aberto, terá de avançar com soluções deste género. O clube tem sido gerido de forma muito otimizada e por isso não há margens para cortes em desperdícios, talvez por isso seja reconhecido pela sua vertente sustentável nas três dimensões, social, financeira e até ambiental. Além disso, não deixa de estranhar discursos, nomeadamente na assinatura dos contratos-programa, o senhor vereador referiu que os clubes têm de procurar autonomia financeira. Ora bem, estamos a falar de um financiamento do município bem abaixo dos 20%. Mais do que isto, só se nos transformarmos numa empresa e numa SAD. O único clube, provavelmente, que apresentou um projeto ao município que prevê, a curto prazo, autonomia financeira, foi o Xico Andebol. Não compreendemos porquê colocar entraves neste caminho e crescimento coeso e estruturado. Não temos justificação para isso e não esperamos, sinceramente, que seja possível, seguirmos as outras vias que passam por despedimentos dos seus quadros, sim porque até aqui seguimos as melhores práticas, os nossos colaboradores têm contratos em vigor conforme exige a legislação laboral em vigor. Aliás, consideramos, de forma geral, que os clubes em Guimarães, pelo que devolvem à sociedade, à economia e pelo nome que levam da cidade a outros locais, são muito subfinanciados. Basta comparar com os principais clubes, nas mesmas modalidades, nos municípios vizinhos. Fizemos esse exercício com o Fafe e o ABC, mas podíamos ter feito na AAB. Sendo nós o maior clube, somos o que tem menor financiamento público de todos.

Não entendo como o município quer que sejamos viáveis financeiramente e ter a capacidade de formar e cativar atletas, quando é o próprio que nos despromove financeiramente a todos. Em vez de premiar pela atitude, pela gestão, e pelo trabalho que temos feito e que são referência, acontece o contrário. Há um discurso nacional, local, e o senhor vereador está farto de focar no crescimento no feminino. Mas o mesmo crescimento no feminino ditou um corte de 61%? Não compreendemos estas lógicas, até porque não há uma tabela e uma relação direta com os níveis de execução e o financiamento. O financiamento deve estar afeto a projetos e ou objetivos. Se temos mais projetos, devemos de ter um apoio maior sobretudo se esses projetos cumprem desígnios nacionais e locais. Não nos podem pedir e aconselhar crescimento, alargamento, democratização do acesso e depois cortar nas verbas. É incoerente.

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Vai solicitar alguma reunião com o presidente Domingos Bragança ou com o vereador Nelson Felgueiras?

Estamos em negociações com várias entidades. Pedimos explicações ao município e estamos a aguardar uma explicação mais detalhada. Mas, numa primeira conversa, senti da parte do senhor presidente, reforço positivo e uma compreensão e, de alguma forma, solidariedade com esta situação. O presidente da Câmara percebeu o que está mal, embora de momento não haja uma solução formal e assumida para o problema. Senti, que o presidente ficou a par do problema, tivemos a oportunidade de partilhar o nosso ponto de vista, que se resume a um financiamento deficitário no desporto em Guimarães, estranhamos inclusive o desconhecimento desta realidade, o apoio aos clubes não deve ser analisado em valor absoluto, sob pena de todos ficarem serem muito menos apoiado que os concelhos a nível nacional, não podem os clubes de Guimarães serem prejudicados por terem mais iniciativa, mais modalidades e por serem mais do que os concelhos vizinhos.

Por outro lado, não são conhecidos os critérios de financiamento, logo não são mesuráveis, perdemos, pois, uma oportunidade de valorizar o mérito em detrimento de outras agendas mais ou menos desconhecidas, perde a transparência. Também não existe previsibilidade nos orçamentos e apoios, o que volta a prejudicar aqueles que ousam planear, gerir com mais rigor e profundidade… Em última instância transformamos os clubes, aqueles que são associações sem fins lucrativos, em entidades autónomas e autossuficientes não dependendo de qualquer financiamento público, poderá assim o executivo alhear-se de pensar o desporto e definir estratégias, mas nesse caso abdicaria também de ter pelouro para o efeito, nem precisaria de um qualquer burocrata para fazer a divisão das verbas. Enfim, há muito para fazer…

Falou na falta de apoio nas obras. A que se deve?

Há um conjunto de requisitos legais e administrativos que tiveram e têm de ser cumpridos que causaram alguns constrangimentos na atribuição destas verbas, como solução foram sendo transitadas de ano para ano. O que era pedido agora e que era compreensível é que tendo em conta esta realidade, sabendo das dificuldades de manter um equipamento destes no centro da cidade, não estávamos à espera de mais um corte a dificultar a já quase impossível missão. Temos dificuldades e não temos apoios para esse equipamento. Toda a verba acumulada para formação e eventos do município não chegam sequer para pagar os gastos de água, luz e gás. Mas não estamos parados. Somos o primeiro clube em Guimarães e dos primeiros no país a criar uma comunidade de energia renovável. Estamos a combater a questão dos consumos energéticos e estamos a cumprir com o nosso plano estratégico em todos os vetores de atuação.

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Mas existe uma “dívida” da autarquia com o Xico Andebol?

Há o dever de transferir um valor de obras e um compromisso que nunca esteve e que não está em causa. Mas enquanto não se fizer a transferência desses valores, estamos com mais pressão sobre despesa corrente, há obras com impacto financeiro nos consumos energéticos. E um corte no financiamento público ainda vai prejudicar mais.

Está a falar de que valores?

Estamos a falar entre 100 e 125 mil euros de obras. São verbas que não tivemos acesso ao longo de sete anos e foram transitando de ano para ano. Numa situação normal o valor atribuído para obras seria de 25 mil euros. O município tem a noção deste processo e terá certamente valores. Estou a falar de valores aceitáveis e que estariam contratualizados anualmente.

Convicto que o problema será solucionado?

Completamente convicto. Tenho total confiança no presidente da Câmara. O doutor Domingos Bragança conhece perfeitamente o clube e é uma pessoa com palavra nunca me passou pela cabeça por isso em causa. Até hoje, não tenho qualquer razão de queixa. A minha grande admiração é o que o senhor presidente promove e trabalha connosco, mas depois a realidade fora do seu gabinete não é a esma. Há uma discrepância e não me parece que seja fruto de má vontade do presidente. Antes pelo contrário. Portanto, acho que se vai resolver com toda a certeza, uma vez que o dirigente máximo do município ainda é o presidente da Câmara. Deduzo que as palavras dele tenham um efeito prático e concreto.

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Há um timing?

Sim e já não sobra muito tempo. Este mandato está a terminar. Portanto, para quem está cá e quiser tomar uma decisão, este problema já deveria estar resolvido. Dificulta a transição para um novo mandato ou até a continuação desta direção. Tendo em conta este cenário, não me parece que haja grande motivação para apresentar um novo projeto. Há um descrédito, desgaste e perda de confiança nestes processos (não no presidente) que são constantes. Todos os anos temos estes problemas e vão acumulando. E o clube é referência nacional em várias áreas. Não é um cenário convidativo a quem possa querer apresentar uma lista à direção do clube.

A falta de financiamento está a complicar as obrigações do clube com os seus funcionários e colaboradores ou o clube ainda tem margem de manobra?

Vou confessar que, perante este cenário, organizei uma reunião com todos os colaboradores e transmiti as dificuldades que temos. Correndo o risco de ser injusto, o Xico Andebol é dos poucos ou o único clube que tem os seus colaboradores com contrato de trabalho ou prestação de serviços. Dos 16, dois estão com prestação de serviços por vontade própria. Seguimos a lei, cumprimos a lei, e uma boa ação e exemplo torna-se um problema. Os próprios colaboradores disponibilizaram-se a abdicar dos vencimentos para que o projeto sobrevivesse. Fiquei sensibilizado, mas obviamente que não será essa a solução. Não compete aos colaboradores sustentarem a atividade do clube. Se tivesse de demitir alguém, demitia-me primeiro!

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