O lado certo da linha

Por José João Torrinha.

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Por José João Torrinha, Advogado e Presidente da Assembleia Municipal de Guimarães Quando andava no secundário, estávamos entre a segunda metade dos anos oitenta e o início dos noventa. Apesar de já lá irem uns anos, a revolução ainda era algo muito presente. Por isso, quando se discutia política (como fazíamos incessantemente) ser de esquerda ou de direita não era brincadeira nenhuma.

Verdade seja dita que, na altura, havia algum comedimento em alguém se assumir como de direita, o que é natural atenta a tal proximidade com quarenta e oito anos de uma ditadura oriunda desse lado do espetro partidário. O mesmo comedimento existia nos próprios partidos, mesmo sabendo-se que o país se encontrava sociologicamente partido a meio, como a eleição presidencial Soares/Freitas tinha demonstrado.

Volvidos alguns anos, começou a haver quem dissesse que a dicotomia esquerda/direita já não fazia sentido. Que era uma herança da revolução francesa e que, volvidos mais de duzentos anos, se tratava de uma caracterização vazia e sem conteúdo.

Permito-me discordar. É verdade que a dita separação não dá para tudo. Também é verdade que a realidade é infinitamente mais complexa do que uma versão a preto e branco das coisas. Mas também o é que continua a fazer sentido a distinção. Diria que definir o que é ser de esquerda ou de direita é algo difícil, mas é algo que todos intuímos e sabemos.

Dito isto, nos dias de hoje emerge uma outra dicotomia muito mais atual e decisiva: aquela que distingue quem tem práticas e propostas democráticas dos outros: daqueles que pretendem abalar as fundações do nosso sistema democrático.

Basta olhar à nossa volta para constatarmos que o perigo é real. Alguém acreditaria que em 2020 estaríamos a assistir ao facto espantoso de um derrotado numas eleições americanas e que não aceita os resultados eleitorais?

E se olharmos para a Europa, que dizer de vermos dois países a boicotar o programa de recuperação da pandemia mundial, em reação às sanções que lhes poderão ser aplicadas pelos desvios antidemocráticos que as suas nações têm trilhado?

Por isso, entendo que a grande linha divisória e a que é decisiva, mais do que a esquerda/direita é a tal linha que divide aqueles que pela sua prática e discurso político pretendem abalar os alicerces do nosso sistema democrático e os outros.

Dir-me-ão que a divisão não faz sentido, porque se trata claramente de uma minoria que está do lado errado da história. Eu digo que faz, não só porque essas minorias têm grande potencial de crescimento (atento algum cansaço que se vai sentindo quanto aos partidos e forças políticas tradicionais) mas sobretudo deve fazer-se entre quem contemporiza com essas forças e quem é intransigente com elas.

Esta é mesmo a altura de traçar uma linha na areia, deixando bem claro que não estamos a traçar uma linha entre esquerda e direita, mas entre a decência e a indecência. Entre quem festeja a democracia que tanto custou a construir e quem a quer desfazer, ainda que lentamente.

O artigo primeiro da nossa Constituição diz: “Portugal é uma república soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. Que isso nunca nos saia do espírito no momento de escolhermos o lado da linha em que estamos.

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