“Acredito que Putin não fará marcha atrás”

O conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia tem-se intensificado nos últimos dias e a paz parece cada vez mais longínqua.

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O conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia tem-se intensificado nos últimos dias e a paz parece cada vez mais longínqua.

Volodymyr Bezuglyy é cidadão ucraniano, motorista internacional, e reside em Guimarães há 20 anos. Em entrevista ao Mais Guimarães, dá o seu testemunho sobre o que está a acontecer na Ucrânia e garante que pondera regressar para defender o seu país.

Grande parte da sua família e amigos continuam na Ucrânia. Como se lida com a incerteza relativa à insegurança daqueles que lhe são muito próximos?

Atualmente tenho os meus pais, a minha irmã, a minha sobrinha e os meus amigos na Ucrânia. Apesar de já lhes ter oferecido estadia e de sabermos que Portugal terá programas para acolher estas pessoas, eles não querem vir para cá. Aliás, mesmo que quisessem vir, não saberíamos se seria possível, uma vez que residem no centro da Ucrânia e a fronteira com a Polónia fica a 600 quilómetros. Há ataques em todos os lados do país e os bombardeamentos são diários, o que faz com que viajar seja menos seguro do que ficar em casa. Para já, todos vão ficar resguardados em isolamento.

Estes primeiros dias nas fronteiras ficam marcados por filas de 15 quilómetros. Conheço pessoas que estão há três dias parados na fronteira e não conseguem passar, uma vez que a prioridade vai para as crianças, mulheres e homens com mais de 60 anos. Há locais nas fronteiras em que não é permitida a passagem de camiões precisamente para evitar essas mesmas filas.

Como está atualmente a situação em Vinnytska, a cidade onde residem?

A cidade fica a 250 quilómetros de Kiev e há locais onde os ataques têm sido mais frequentes. Temos uma base militar perto, mas não costumamos falar muito sobre o assunto porque os russos escutam muito as chamadas. Aliás, sou administrador de um grupo de pescadores e caçadores nas redes socias com 54 mil pessoas que foi desativado precisamente por esse motivo. Vários russos fizeram-se passar por ucranianos para assistir ao que discutíamos nessa plataforma. Neste momento, só falámos de formas de chegar às fronteiras com pessoas que conhecemos bem.

“Sou novo, consigo lutar e o meu coração dói.”

Volodymyr Bezuglyy

Essa espionagem tem dificultado o contacto com os seus conhecidos?

Apesar de tudo o que está a acontecer, tenho conseguido falar com eles todos os dias. Mesmo na aldeia, os civis já fizeram barricadas com caçadeiras e tudo mais. Nesses locais os conflitos ainda não estão muito intensificados, mas tenho conhecimento de cidades que já chegaram a receber 18 mil armas num só dia.

Eu próprio ainda estou a equacionar onde serei mais necessário. Sou novo, consigo lutar e o meu coração dói. É a minha terra, é o meu país.

Neste momento está num país seguro, perfeitamente integrado na comunidade e com família constituída cá. Que sentimento é preciso ter para largar tudo e ir lutar pelo seu país?

É um sentimento de tristeza inexplicável cada vez que vemos as imagens do que se está a passar. Nós conhecemos as terras, os lugares, as pessoas, todas as palavras. Ver tudo isto rebenta com a nossa fé.

O meu pai, que também lá está, insiste para que eu não vá para a guerra. É também uma guerra em casa porque tenho esposa e dois filhos em Portugal, mas eles compreendem o meu sentimento. Eu não quero que depois olhem para mim e pensem que eu tive medo e não ajudei o meu país.

Tenho pena pela Ucrânia e por todos os meus amigos e familiares. Estou sempre em contacto com eles. Até à meia noite e logo que acordo pela manhã procuro as notícias para estar a par de todos os desenvolvimentos.

O meu trabalho também pode ser importante cá para fazer o contacto com as pessoas refugiadas que virão para cá através dos programas de ajuda.

Neste momento é também administrador de um grupo no Facebook, “Acolher Ucrânia Guimarães”, que pretende recolher toda a ajuda possível para o povo ucraniano. Esta onda de solidariedade tem sido importante?

Sem dúvida alguma que Portugal ajuda muito. Esta guerra não está a passar ao lado dos portugueses. Aliás, estou bastante surpreendido com a quantidade de pessoas que tem ligado comigo para perguntar o que podem fazer para ajudar.

Através deste grupo as pessoas vão encontrar uma conta militária para a qual podem transferir quantias monetárias que vão sempre ajudar.

Até os empresários dos transportes de mercadorias se têm unido para levar bens para a Ucrânia.

Enquanto ucraniano, e com todo o conhecimento que tem sobre este conflito militar, o que reserva o futuro?

Nós temos que ganhar porque a Ucrânia é a nossa terra. Já ouvi muitas coisas que me levam a acreditar que Putin não fará marcha atrás.

Por um lado, é bom que mais nenhum país parta para a guerra porque dessa forma não será oficializada a terceira guerra mundial. Ainda assim, todos sabemos que ele tem bombas nucleares e isso é um problema gravíssimo porque ninguém nos garante que a Rússia não as utilizará. O Putin é maluco, é um Hitler. Ninguém sabe o que ele é capaz de fazer. O exército russo tem rapazes de 18 e 19 anos que estavam na tropa e foram mandados para esta guerra. Muitos já morreram e, certamente, vão morrer mais.

Todos temos assistido ao número de mortes divulgadas pelos órgãos de comunicação social e apercebemo-nos que, além das mortes de militares, têm morrido muitos civis…

Os russos já atacaram infantários e morreram 14 crianças, o que é inaceitável. Eles diziam que só iam atacar bases militares, mas isso não está a acontecer. Há tanques a disparar para as janelas de prédios de civis.

“Ver tudo isto rebenta com a nossa fé.”

Volodymyr Bezuglyy

Vários países têm cedido material bélico à Ucrânia. Acha que estes apoios estão a ser significativos ou seria necessária uma intervenção maior?

É um apoio valioso. Tenho amigos que foram em carrinhas e conseguiram levar coisas até à Polónia, que vai permitir a entrada desses materiais na Ucrânia.

Um dos problemas é que faltam coisas essenciais e que lá não existem. É o caso, por exemplo, das lanternas para capacetes, walkie talkies e binóculos de visão noturna. Estes últimos, apesar de serem permitidos em Portugal, são proibidos na Ucrânia, o que faz com que sejam muito difíceis de arranjar. Temos, inclusive, tentado comprar este material usado.

Temos ouvido relatos de ucranianos que saem à rua para defender o país mesmo sem estarem preparados ao nível de armamento. Tem tido conhecimento desse tipo de situações?

Sim, algumas pessoas já esperam os russos com caçadeiras. Todos os que têm algum tipo de material vão para a guerra e vão defender o seu país.

Tem alguma mensagem que gostasse de transmitir aos ucranianos?

Gostava de dizer que juntos vamos conseguir lutar. Só temos de estar unidos. Fora no nosso país a nossa vida pode ser um pouco distraída, mas juntos temos de lutar. Temos de ajudar com o pouco que seja, dinheiro, roupa, comida ou bens essenciais, tudo é necessário. Nesta guerra, toda a ajuda é bem-vinda.

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