Um silêncio ensurdecedor.
Por César Teixeira.
Por César Teixeira.
Recentemente fomos confrontados com uma notícia publicada num conhecido jornal nacional que dá nota de que “A Associação de Desportos de Combate KTF está a usar as redes sociais para angariar militantes para o PS. As mensagens, dirigidas aos residentes em Guimarães, podem ser lidas num grupo de whatsapp por atletas, pais e treinadores. Vamos ajudar quem merece e nos tem ajudado”. O beneficiário deste apelo é, nem mais nem menos, do que o vereador que tutela a pasta do desporto no Município de Guimarães: Nelson Felgueiras.”
Fundamenta-se este apelo no seguinte “o vereador do Desporto precisa um pouco da nossa ajuda, como tem ajudado no que pode, cabe agora tentarmos retribuir”. Será que a ajuda consistirá em definir uma melhor estratégia e abordagem quanto aos desportos de combate em Guimarães? Poderia ser, mas não é. A ajuda tem um objetivo muito mais prosaico: aumentar o número de militantes no PS para ajudar Nelson Felgueiras a concretizar os seus objetivos nas eleições internas do PS de Guimarães, a realizar em janeiro de 2024.
“Vamos ajudar quem nos tem ajudado”, diz a mensagem. Vamos então ao pedido, ao “quem” ajuda e ao como “ajuda”.
Quem fez o pedido para a angariação de militantes? Confessadamente o próprio Nelson Felgueiras. Que confirmou ao jornalista ter pedido a ajuda em causa. Em sua defesa diz de forma surpreendente que “o problema daquela mensagem é identificar-me como vereador, não foi nessa qualidade que fiz o pedido”. Ou seja, o problema não está no que se fez, mas no como se fez! É surpreendente – e preocupante – a incapacidade para se perceber a dimensão institucional dos cargos que se desempenha.
Estamos mesmo a imaginar o cenário. Quando fez o pedido, o vereador do desporto despiu a sua veste e advertiu o destinatário do pedido: quem aqui está não é o vereador do desporto que vos tem ajudado, mas sim o cidadão. O interlocutor até ficou aliviado. Se fosse o vereador do desporto a fazer o pedido, seguramente que teria de recusar o pedido. Agora como o pedido é feito pelo cidadão Nelson, pode aceitar.
Enfim esta heteronomia naturalmente não tem caminho a percorrer e sofre KO ao primeiro assalto. A heteronomia pode até ocorrer na literatura, mas é mais difícil ocorrer em política. Porque na mensagem que dirige na rede social da instituição, o próprio dirigente da KTF não separa o Nelson Vereador, do Nelson cidadão. Refere expressamente que o Vereador do Desporto que nos tem ajudado, merece a nossa ajuda.
Vamos agora aferir quem tem ajudado a associação. Também aqui a mensagem é esclarecedora. A ajuda que a associação tem recebido é a ajuda do vereador Nelson Felgueiras. A ajuda não é do cidadão Nelson Felgueiras. Precisamente por ser do vereador é que a mensagem claramente refere que “o vereador do desporto precisa da nossa ajuda”. Por isso procurar separar Nelson vereador, de Nelson cidadão é uma procura em vão.
Diz ainda a mensagem em causa que o Vereador do desporto “tem ajudado no que pode”. Mas de que ajuda estamos concretamente a falar? Na época desportiva 2021/2022 a KTF recebeu do Município apoios no valor de €16.000 euros e em 2022/2023 recebeu €19.000. Será que esta associação foi favorecida face às demais? Seria de todo em todo interessante perceber que apoios têm recebido as associações similares. Só assim poderemos perceber a dimensão da “ajuda” e se há ou não tratamento diferenciado desta associação. A notícia tem a resposta a esta pergunta: “no mesmo período todas as outras coletividades do género receberam um total de €21.250”.
Este episódio é muito revelador. Expõe a evidente a confusão entre o Partido Socialista e o Município de Guimarães. Demonstra a incapacidade de titulares de cargos políticos saberem desempenhar as respetivas funções de acordo com a dignidade institucional que os cargos merecem.
Mas este episódio também evidencia que a guerra interna do Partido Socialista está a condicionar a atuação do executivo municipal. A Câmara Municipal não é do PS, mas é de todos os vimaranenses. Naturalmente que esta notícia contém em si um manto que prejudica todo o executivo: que lógicas compreendem os subsídios e apoios municipais?
Desde que a notícia foi publicada Domingos Bragança, Presidente da Câmara de Guimarães, mantém-se em silêncio. Há silêncios ruidosos. Seguramente que Domingos Bragança estará absolutamente consternado com esta situação e será o primeiro a impedir que o manto se estenda a todo o executivo. Uma rápida e eficaz demarcação de Domingos Bragança será essencial para salvaguardar a dignidade institucional da Câmara Municipal de Guimarães.
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