CHÁ DE CARIDADE

MARIA DO CÉU MARTINS Economista

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por MARIA DO CÉU MARTINS
Economista

Longe vão os anos em que fazia parte de nosso crescimento, de construção de carácter, ter a oportunidade de participar num projeto de imprensa local. Na altura coexistiam, com áreas de atuação substancialmente distintas, vários jornais – pelo menos quatro, sendo que dois dos mais importantes desapareceram nos últimos anos – o Noticias de Guimarães e o Povo de Guimarães.

Na altura não havia uma base de dados, nem uma carta europeia pro-voluntariado mas todos, ou quase todos, cumpríamos, sem exceção, um dever de participação social nas coletividades – aliás acredito, continuar a ser premissa de cidadania vimaranense, a obrigatoriedade de integrar a rede de ONG locais – e as mais interessantes, as que mais contribuíam para a nossa realização individual e coletivo estavam ligadas aos mass – média ( jornais, rádios locais, ou ambos).

Participar em projetos de imprensa local era, à época, um privilégio que nos permitia um relacionamento aberto, intergeracional, com partilha de valores indubitavelmente mais importantes ou até complementares daqueles que outras estruturas sociais – a família ou até a escola – não tinha condições de nos proporcionar.

O local de encontro, era, por excelência a redação do jornal onde, ciclicamente, íamos alternando tarefas. Ora participávamos na gestão, ora passávamos para a redação, onde cobríamos acontecimentos, redigíamos notícias ou escrevíamos artigos de opinião.

Algures no meio desse longo período de formação “carreguei” com a Direção da cooperativa que produzia o Povo de Guimarães e queimei as pestanas a tentar encontrar formas criativas de tornar viável o que nunca o foi. Aqui, tal como em outras coletividades pelas quais passei, tentava evitar a “lógica do chá de caridade”, ou do “donativo esporádico” (dos quais, mais cedo ou mais tarde se espera contrapartida adequada).

Ali promovia-se o gosto pela verdade, pela justeza de valores, pela liberdade de pensamento. Mas ali, mais do que em qualquer outro local, ter opinião livre custava-nos, frequentemente, a ausência de anúncios. E o jornal editava-se nas semanas subsequentes à custa dos beneméritos da ordem, do chá de caridade ou da paciência do credor.

No dia em que em assembleia geral se discutiu o futuro, a continuidade de um projeto que se revelava, dia a após dia, inviável – financeiramente insustentável – estive, por coerência com os princípios que defendia, do lado de quem defendia a sua dissolução.

Hoje reconheço que um projeto de imprensa local, independentemente da estrutura que o sustenta, deverá ser entendido como um serviço de utilidade pública, enquadrável numa lógica de desenvolvimento sustentável que não se esgota na necessidade de ser viável. Balizado por referências de participação cívica qualificada, a imprensa local deve voltar a cumprir uma missão fundamental de divulgação, de valorização cultural e de crítica social construtiva.

Cabe, pois, à sociedade, como um todo, repor essa necessidade coletiva de estar informado e de estabelecer plataformas de participação abertas – até porque o “chá de caridade” passou, modernamente, a denominar-se “responsabilidade social”.

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