Os ignorados

Por princípio, não sou de destacar individualidades, porque acredito que somos o produto de muitas pessoas e muitas circunstâncias.

© Paulo César Gonçalves

Também não sou de exaltar determinado acontecimento ou determinada pessoa por ser desta ou daquela terra.

Nasci em Guimarães. Vivo em Guimarães. Não sou mais ou menos vimaranense do que alguém que tenha escolhido cá viver ou fazer vida, ou alguém que estabeleceu todo o seu percurso por estas terras. O bairrismo não me feriu (nem me afectou).
Gosto de Guimarães, mas teria todo o direito de não gostar. E há muito mesmo de que não gosto.

Diz-nos o adágio popular, no que toca a esta banda, que “Guimarães é má mãe, mas boa madrasta”. A julgar pelo que fez e faz a determinadas pessoas, umas mais anónimas do que outras, talvez haja um fundo de verdade.

Temo esquecer muita gente, mas o que quero, nestas linhas que escrevo, destacar, neste ano em que se celebram os 50 anos desde o luminoso* 25 de Abril de 1974, é o papel de alguém que, nascido em Guimarães, curiosamente a 25 de Abril, mas de 1945 (dia da libertação de Itália), teima em ser esquecido por quem tem o dever cívico de lembrar e relembrar o papel que desempenhou, nos anos que antecederam a revolução, para que a democracia fosse uma realidade.

Sei que o Dr. César Machado, no seu livro “Daqui houve resistência”, o relembrou (o livro até dará origem a uma série televisiva). A Dra Isabel Santos Simões chamou-o para as comemorações do centenário do seu Pai, o extraordinário Dr. Santos Simões, mas Guimarães, e quem lhe giza os destinos, persiste em ignorar o extraordinário e corajoso contributo do Dr. Alberto Martins no processo que conduziu ao 25 de Abril de 1974.

Foi a 17 de Abril de 1969, em Coimbra, na Universidade, que o “peço a palavra” provocou um terramoto sem precedentes no Estado Novo, inaugurando uma nova era, um Maio de ’68, mas em Portugal (e em Abril), que culminaria no maior comício ao ar livre contra a ditadura (a final da Taça de Portugal, em Junho, entre Benfica e Académica).

Foram muitos os milhares que com risco pessoal se colocaram ao lado do presidente da Direcção-geral da Associação Académica de Coimbra, quer nesse dia, quer em todos os que se seguiram.

A coragem de Alberto Martins é uma inspiração e um acto de rebeldia que partiu de um – à altura – estudante.

Adriano Correia de Oliveira cantava, com palavras de Manuel Alegre, “capa negra, rosa negra, bandeira de liberdade”. É essa bandeira de liberdade, etérea ou não, que o Dr. Alberto Martins, vimaranense de nascimento, nascido e criado pelo centro histórico, nicolino militante (para quem ligar a isso), ainda carrega.

Mas Guimarães não sabe. Ou não quer saber. Espero que não se apressem a lembrá-lo só quando já cá não estiver (entre os vivos).

*”luminoso” é uma expressão que o próprio Dr. Alberto Martins utiliza, quando se refere ao 25 de Abril.

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