A ESTATÍSTICA E A FELICIDADE
ANTÓNIO ROCHA E COSTA Analista clínico
por ANTÓNIO ROCHA E COSTA
Analista clínico
Sem pretender entrar em especulações filosóficas, é comum dizer-se que nascemos para sermos felizes, correspondendo a suprema felicidade a um completo bem estar espiritual e material, sendo que o lugar onde isso é possível chama-se paraíso.
Desde tempos imemoriais que os líderes espirituais e religiosos, bem como os líderes políticos e, atualmente, os santos mercados, se encarregam de zelar, respetivamente, pela nossa paz de alma e pela satisfação das nossas necessidades materiais. São eles os guardiães da nossa felicidade e vão desde o Papa até ao presidente da junta de freguesia.
Há dias a ONU publicou o seu Guia Mundial da Felicidade para 2017, no qual Portugal aparece em 89º lugar, muito atrás da Turquia, de toda a UE, da Argélia e da Arábia Saudita.
Esta necessidade de reduzir tudo a estatística, incluindo a própria felicidade, é um sinal dos tempos modernos e todos sabemos que os critérios e tratamento dos dados usados na avaliação, nem sempre são claros, nem traduzem a realidade. Por isso o nosso 89º lugar do ranking da felicidade, num mundo com tantos demónios só pode resultar do nosso pessimismo e défice de autoestima. A nossa vida não está nada fácil e o futuro poderá não estar muito risonho, mas também não estamos assim tão mal como nos querem fazer crer.
Para combater o estado de espírito que torna as pessoas mais ou menos infelizes, existem as drogas (antidepressivos, álcool, etc.) ou as palavras de incentivo, sobretudo as que traduzem bons resultados estatísticos.
Charles Bukowski um dos autores contemporâneos mais conhecidos a nível mundial, via mais a felicidade como a satisfação dos prazeres e dos vícios mais terrenos e por isso afirmava, pela boca de um dos seus personagens: “sinceramente, horrorizava-me a vida, aquilo que um tipo tinha de fazer só para poder comer, dormir e andar vestido. De maneira que fiquei na cama a beber. Quando bebemos, o mundo continua lá fora, mas por instantes deixa de nos sufocar.”
Já Domingos Bragança, presidente da Câmara de Guimarães, procura animar os seus munícipes, utilizando placards colocados nas entradas da cidade, onde informa que “Guimarães é já o quinto maior exportador do país” e “Guimarães é o quarto património da UNESCO mais recomendado do Mundo”.
Com efeito, o ranking concelhos CEDRAC – 2015/2016, coloca o concelho de Guimarães numa posição elogiosa no que respeita ao saldo – Exportações/Importações de bens, tendo em 2016 importado cerca de 732 milhões de euros e exportado cerca de 1,5 mil M. €, donde resulta um saldo positivo de aproximadamente 750 M. €. Comparando com a totalidade do país, os concelhos do Norte apresentam um saldo exportações/importações de bens de aproximadamente 6 mil M. € positivos enquanto a totalidade do país apresenta um saldo negativo de 11 mil M. €.
Sendo que o rendimento per capita no norte é cerca de 80% da média nacional, só podemos concluir que quem gera mais riqueza e mais poupa, nem sempre é quem é melhor recompensado. Daí que os dados publicados pelo presidente da Câmara, não sendo bem enquadrados e explicados, tendem a não cumprir os objetivos que subjazem à sua divulgação: a satisfação e a felicidade dos seus eleitores e dos munícipes em geral.
Em jeito de conclusão, cumpre-nos afirmar que a felicidade não é uma bênção dos Deuses nem é tão pouco um bem adquirido, o que é o mesmo que dizer “fia-te na Virgem e não corras”, mas se correres fá-lo com gosto, porque “quem corre por gosto não cansa”. Felizmente…
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