Alberto Martins, um nicolino de (e que começou) abril

Por Paulo César Gonçalves.

Paulo Cesar Gonçalves

por Paulo César Gonçalves

Alberto Martins completou 75 anos. Nasceu em Guimarães, a 25 de Abril de 1945, e viveu no Largo do Carmo (duas características absolutamente premonitórias), junto ao Castelo.

O jovem Alberto começou por embrenhar-se nas questiúnculas estudantis ainda em Guimarães, enquanto estudante do Liceu local. As Festas Nicolinas, regozijo único em Portugal, animaram-no para o envolvimento nos assuntos de capa e batina, tendo feito parte da organização das mesmas.

Como confessaria, anos mais tarde, numa entrevista ao jornal “O Povo de Guimarães” (realizada pelo Professor Silvestre Barreira, seu companheiro de Liceu), “a vida de Nicolino, as Festas Nicolinas, da Guimarães do nosso tempo, foram muito marcantes para todos nós. Era um momento, naquela altura, num tempo relativamente obscuro, cinzento, difícil, de ditadura, de grande contenção de costumes, no qual as Festas Nicolinas serviam como momentos lúdicos de rebeldia e de libertação da juventude. A comunidade aceitava a rebeldia, o espírito crítico e a dimensão lúdica da vida dos estudantes. Eram pequenas ilhas de liberdade durante uma semana, quinze dias. Foi esse gosto pela rebeldia, pela liberdade, que fez com que tivesse a liberdade de me exprimir, já em Coimbra.”

Lá, Alberto Martins vai cursar Direito. Naturalmente, envolveu-se na forte dinâmica estudantil da “Lusa Atenas”.

Em 1969, já depois do terramoto do Maio de ’68, em França, a direcção-geral da Associação Académica de Coimbra foi ganha por uma lista afecta ao Conselho de Repúblicas, alma da contestação ao panorama estudantil e social que o Estado Novo patrocinava. O presidente, oriundo da República dos ‘Pyn Guyns’, era, agora, Alberto Martins.

Para 17 de Abril de 1969, estava marcada a inauguração do novo edifício das Matemáticas, da Universidade de Coimbra. O momento era solene: vieram Presidente da República, Ministros e outras individualidades.

A direcção-geral fez saber que queria falar no acto inaugural, mas viu a pretensão negada.

No decurso da inauguração, já dentro do novo edifício, completamente lotado (tanto do lado de dentro como de fora), Alberto Martins levantou-se e, em nome dos estudantes de Coimbra, ousou pedir a palavra ao Presidente da República, Américo Tomás.

A pretensão foi-lhe negada, anunciando-se que iria falar o Ministro das Obras Públicas. A reacção estudantil revelou-se tremenda: a comitiva abandonou a sala, apupada, tendo a mesma sido inaugurada, entusiasticamente, pelos estudantes.

Nessa mesma noite, como consequência do acto de coragem, Alberto Martins foi detido pela PIDE (Polícia Política) e houve confrontos entre a polícia e os estudantes.

Seria decretado o luto académico, assim como a greve aos exames (com uma esmagadora maioria a revelar-se favorável, mesmo com o fantasma da guerra colonial a pairar sobre as suas cabeças).

A Académica, a equipa de futebol, chegou à final da Taça de Portugal. O Estádio do Jamor viveu o maior comício contra a ditadura a que alguma vez se assistiu. À contestação nas bancadas juntaram-se os jogadores da Briosa, entrando a passo, de capa pelos ombros.

Pela primeira vez, a final da taça não foi transmitida em directo pela RTP. Houve estudantes expulsos e incorporados, compulsivamente, na tropa, inundando a estação de Coimbra-B de lenços e de lágrimas.

Foi em Coimbra, a 17 de Abril de 1969, que começou a ganhar forma o 25 de Abril de 1974, pelas palavras, como referiria o próprio, na mesma entrevista ao Professor Silvestre Barreira, “de um jovem de Guimarães que estava lá. Tive muito orgulho em ser Presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra nessa altura, nesse momento muito difícil. O maior combate, porventura, da geração universitária contra a ditadura, combate esse que tive a oportunidade de travar.”

Alberto Martins merece, por isto, mas não só, o mais sincero reconhecimento, tendo lutado, com risco pessoal elevado, por uma causa que não era apenas sua, mas de todos.

Certo de que as homenagens são para enquanto se está vivo, urge que a sua terra-natal lhe preste a devida. Assim esperamos.

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