Chega como principal partido da oposição: um sintoma, não a doença

A nova configuração parlamentar é um aviso. Portugal está a mudar, não porque os portugueses tenham subitamente ficado extremistas, mas porque se sentem desamparados.

© Eliseu Sampaio

A subida do Chega nas eleições legislativas de 2025 é inegavelmente um marco no xadrez político português. De 50 para 58 deputados, e com a possível eleição de mais dois pelo círculo da emigração, o partido de André Ventura pode, em breve, ultrapassar o Partido Socialista em representação parlamentar, assumindo o papel de maior força da oposição.

Este resultado não deve ser tratado como um simples desvio ou acidente político. É antes um sinal claro e contundente de que o sistema democrático português está em mudança.

Há quem procure respostas fáceis, colando rótulos e insultos ao eleitorado do Chega. Mas esse é um caminho curto, simplista e perigoso. Ignorar ou menosprezar mais de um milhão de portugueses que depositaram o seu voto no partido é, no fundo, ignorar o que eles nos estão a dizer.

Os partidos do chamado arco da governação têm, ao longo dos anos, acumulado promessas, apresentado políticas distantes da vida real dos cidadãos, e uma resposta tímida ou ausente a problemas estruturais como a habitação, a justiça lenta, os salários estagnados, a degradação dos serviços públicos, e a corrupção. A confiança foi-se esvaindo — e, com ela, cresceu o espaço para discursos radicais e soluções simplistas que falam à raiva, ao desespero e à frustração.

O combate aos radicalismos, à direita ou à esquerda faz-se com reformas reais, reduzindo os motivos reais da sua ascensão. Faz-se eliminando pontos de tensão social, garantindo justiça célere, políticas de habitação acessível, mobilidade eficaz, salários dignos e respostas concretas à insegurança económica e social.

Depois do ato eleitoral, depois da “Festa da Democracia” de que tantos dizem gostar mas pouco quando o resultado não lhes convém, cabe aos partidos provarem que a política ainda serve para resolver problemas.

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