CONVINHA TROCARMOS UMAS IMPRESSÕES SOBRE O ASSUNTO

CÉSAR MACHADO Advogado

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por CÉSAR MACHADO
Advogado

Interessante o encontro do passado dia 16 de Março, com Pedro Bacelar de Vasconcelos, numa boa iniciativa do Gabinete de Imprensa de Guimarães. “Justiça e Liberdade de Imprensa” trouxe o jornalismo de hoje, seus problemas, seus desafios.

Recordou-se uma história que contava Mia Couto quando jovem jornalista. Enviado como repórter para o “teatro dos acontecimentos”, para logo ali, rapidamente, escrever sobre assuntos estranhos ao seu conhecimento –em muitos dos casos- pediam-se-lhe certezas,  que enviasse texto para a redacção, e depressa, atenta a concorrência quase instantânea. Mas enviar o quê, se nada sabia do assunto? Estas interrogações metafísicas davam-se mal com o ofício e era enorme o risco de passar o acontecimento e o rescaldo enquanto Mia continuava a “reflectir”, a “enquadrar”, a “aprofundar” antes de escrever. Os colegas já tinham despachado páginas inteiras, tratados  sobre o assunto. Mia pensou e decidiu – “Isto não é para mim, vou escrever romances”, no que ficou a ganhar a literatura, como será hoje consensual.

Surgiu também o western de eleição de John Ford, O Homem que Matou Liberty Valance, Terminada a retrospectiva da epopeia contra o terrível bando de facínoras, heroicamente combatidos até ao último, contada “a realidade”, em frente ao caixão de John Wayne, conclui James Stewart – “Isto é a realidade, o resto é lenda”, esta com mais graça que a primeira, obviamente. A resposta do jornalista foi pronta. “No Oeste, quando a lenda vira realidade, publica-se a lenda”.

Também ali veio “O Testa de Ferro por Acaso”. de Martin Ritt. Durante a caça às bruxas, dos obscuros tempos do MaCartismo, cineastas e argumentistas viram fechadas as portas em Hollyood  porque o seu nome constava da lista. Arranjou-se um néscio, um tipo sem inimigos, para apresentar os argumentos aos decisores das grandes companhias, e é nessa pele que Woody Allen entra pelo filme dentro. A dado passo, aprovou-se uma história que acabava com uma condenação à morte, na cadeira eléctrica. O argumento foi aceite com uma “recomendação” – a cadeira eléctrica daria lugar à inalação de gás. Um dos principais accionistas detinha casa fornecedora de energia eléctrica, caía mal.

Bom, como negócio, a coisa muda de figura. Haja em vista o que sucedeu há uns anos atrás, entre nós, nas eleições para um clube desportivo, dos “grandes”, com uma cadeia de televisão privada a fazer de canal oficial de um dos  candidatos e outra a a fazer o mesmo com o adversário. A coisa não é boa.

Onde entra aqui a Justiça? Há um dado novo. Até há pouco tempo a justiça na comunicação social era tabu, coisa difícil, ia-se a custo. Isto virou. A facilidade com que aparecem hoje na imprensa transcrições de peças processuais em segredo de justiça é motivo de preocupação.

Aqui chegados, convêm recordar– há limitações à completa compreensão, em breves instantes, de um assunto judicial de grande complexidade, que muitos andaram tempos a investigar. Pedir matéria pronta logo ali torna oportuna a dúvida de Mia Couto. E é sabido que a notícia deve ter alguma graça, algum sal, que recorde o que se publicava  quando a lenda virava realidade. E já perdemos há muito a ingenuidade que pudesse subsistir quanto à pureza dos princípios quando sabemos como muitos dos grandes grupos económicos se comportam no seu “mercado”.

O terreno é, no mínimo, problemático;  é-se “humano, demasiado humano”.

Acresce que em processos judiciais mais sonantes, ocorre amiúde a constituição de jornalistas como assistentes em processo penal. Querer intervir, acompanhar, se possível, contribuir ou concorrer para um caminho instrutório, contribuindo para decisão, como cabe  ao assistente. Até aqui, o jornalista investigava, descobria, contava a história. E parava aí. Sendo coisa grossa ia parar à justiça. Hoje parece pouco. Alguns jornalistas entendem que o seu papel não acaba ali. Querem ir mais além, estar no processo, concorrer para a realização da certa justiça. Ora, isto é outra coisa.

Convinha trocarmos umas impressões sobre o assunto.

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