Depressão, uma sombra lenta…

Por Carlos Guimarães.

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por Carlos Guimarães
Médico urologistaExiste um pequeno mundo que é exclusivamente nosso, o mundo dos nossos segredos, tudo o resto é para dar e receber, tudo o resto deve estar aberto. Talvez a gente esteja demasiado fechada a olhar para si porque há sinais que se plantam à nossa frente e não os vislumbramos. Por vezes os sinais estão tão quietos que não os conseguimos ver, contudo eles mexem. Outras vezes os sinais são ruidosos e até gritam, mas não os ouvimos. Sim, temos muito em que pensar e refletir, temos a nossa vida, mas não podemos ignorar o que gravita à nossa volta. Vejo gente a deprimir a cada dia que passa e a culpa não é do vírus. Um apagar tão lento como o movimento da lua na noite escura em que não conseguimos seguir a sua trajetória. Esquecemos que a lua está lá, que se move, e de repente, quando olhamos as estrelas, a lua já desapareceu; tal como as almas que se perdem e que foram dando ténues sinais de movimento para o abismo. Sinais que nos passaram ao lado, que ignoramos involuntariamente e de repente somos confrontados com vidas anuladas, sem pecados nem tentações, sem dentes para mostrar nem cabelos para lavar. Temos a obrigação de ler os sinais antes que as areias movediças absorvam o corpo todo. A nossa atenção pode fazer a diferença e as nossas atitudes podem operar milagres.

Lembro-me bem do nome dela, mas não o posso revelar Na verdade o nome pouco importa. Sempre a conheci de sorriso aberto e contagiante. Até perante o drama, sorria. Emanava luz sem a mais pequena nesga de sombra a ofuscar. O olhar e o sorriso eram tão límpidos que por detrás dos olhos se conseguia ver a alma, e sorria. Passaram anos até a voltar a ver, reconheci-a com dificuldade, na verdade não a vi, não era ela! Aconteceram silêncios que impediram de ver o filme que dentro dela se passava. Aconteceu tudo tão devagar como o movimento da terra sobre si própria, um movimento a alta velocidade que não se vê, contudo ela gira. Os seus olhos colocados no horizonte não faziam nenhuma leitura de si porque lentamente as suas páginas foram ficando estéreis. O vazio foi crescendo tão lentamente e ficou tão grande que o nada se converteu em tudo. Tive de medir todas as palavras para lhe dizer que temos de falar, de contar histórias, de contornar os assuntos sérios e cair em banalidades. As banalidades libertam, os assuntos sérios irritam. Tive de lhe dizer que os gritos nem sempre são audíveis e os murros na mesa nem sempre estremecem. Muitas vezes o melhor é assobiar para o lado e fugir das sombras que lentamente se aproximam de nós.

Partiu da mesma forma que entrou, com os olhos mortos que a máscara permitia ver e eu continuo sem descobrir a fórmula que possa devolver a vida às pessoas, uma fórmula que teima em ficar escondida, uma fórmula secreta num segredo impossível de revelar, um segredo que não me pertence e que provavelmente não pertence a ninguém.

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