Elegia a António Rocha e Costa – Esteta da Vida e da Amizade

A. Rocha e Costa foi colonista regular do Jornal Mais Guimarães. O Mais Guimarães lamenta a partida tão precoce de uma das vozes mais habilitadas do concelho de Guimarães. A homenagem prestada por Esser Jorge Silva e os seus amigos, na despedida.

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“Elegia a António Rocha e Costa – Esteta da Vida e da Amizade

Querida Helena, querida Ana, caro Zé, caros amigos:

Partiu o nosso querido amigo António Rocha e Costa. Tinha 74 anos — uma idade que, nos dias de hoje, parece ainda prometer tantos anos de vida a muitos de nós. E o António amava profundamente a vida. Amava a sua família — a Helena, a Ana, o Zé. Amava as irmãs, os irmãos, as cunhadas e os cunhados, amava os sobrinhos. Amava os amigos, com quem gostava genuinamente de estar.

Era um homem generoso e afável. Tinha um apurado sentido de humor. Amava a conversa, amava o debate de ideias, os livros, amava a escrita.

Partiu serenamente, lúcido até ao fim, consciente de um destino que se revelou cruel.

A sua vida foi limpa, o seu comportamento cívico exemplar. Tinha uma atitude compreensiva e fleumática, um compromisso constante com as coisas simples, uma dedicação exemplar à vida profissional. Tudo nele parecia credenciar uma estadia longa e merecida neste mundo.

Apesar de tantas qualidades, era discreto e sereno. Não falava alto, mas impunha-se pelas ideias. Nunca atropelava ninguém, mas imprimia sempre um ritmo elevado em tudo o que fazia. Regulava a vida por padrões elevados. Nas suas atitudes, o Rocha e Costa era, de facto, um esteta. Podemos dizê-lo com convicção: o António casava a ética com a estética no modo como vivia.

Perder alguém assim, neste tempo já por si estranho, faz-nos morrer um pouco também. Fere, em certa medida, a nossa fé na bondade humana. O Rocha não merecia esta crueldade do destino. Há quem diga que os deuses chamam mais cedo aqueles que amam. Se assim for, consola-nos melhor compreender porque levaram, os deuses, o nosso amigo António Rocha e Costa.

Raras vezes — talvez nunca —  ouvimo-lo lamentar-se da sua sorte ou das dificuldades que atravessava.

Raras vezes — talvez nunca — o vimos indiferente ao sofrimento ou ao infortúnio de quem o procurava.

Tinha uma ideia muito clara do que era a amizade: estava sempre disponível para escutar. Ouvia em silencio. Com atenção. Concentrado no seu contraponto. Escutava com presença verdadeira. Fazia-o com interesse em compreender o problema do Outro. Escutava para saber. Para ajudar.

Num tempo em que o tempo parece faltar a todos, o Rocha tinha sempre tempo. E dava mais do que isso — dava-se! Dava-se a si mesmo. Entregava-se sem esperar retorno. Dava, apenas porque sim. Porque lhe estava no âmago um profundo respeito pela essência humana.

Depois de escutar, deixava quase sempre uma palavra sábia, ponderada, certeira — muitas vezes encerrada com um toque do seu humor particular: realista, gracioso, assertivo.

Hoje, sentimos todos um vazio profundo. Ao vê-lo partir, sentimos também a dor dessa injustiça do destino, que parece escolher os bons, os generosos, os que fazem falta.

Até sempre meu amigo, nosso amigo, António Rocha e Costa”.

– Texto lido na manhã do dia 10 de julho, dia da cerimónia fúnebre de António Rocha e Costa, durante a missa de corpo presente.

Esser Jorge Silva

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