In Memoriam: José Casimiro Martins Ribeiro

José Casimiro Martins Ribeiro nasceu em 5 de Março de 1940, na freguesia de Gondar, concelho de Guimarães.

© César Machado

Por César Machado.

José Casimiro Martins Ribeiro nasceu em 5 de Março de 1940, na freguesia de Gondar, concelho de Guimarães.
Era o mais novo de sete irmãos. Seu pai era proprietário de uma pequena empresa de carpintaria. Seu irmão mais velho, Eduardo Ribeiro, era dos mais destacados activistas de um vasto grupo do distrito que viria a ser designado como Democratas de Braga, juntamente com Santos Simões, Vitor de Sá, Lino Lima e Humberto Soeiro. Estes resistentes encontravam-se, por vezes, na oficina da família.

Muito cedo começou Casimiro a ter perfeita consciência que os ideais daquele grupo lhe eram muito caros. E que não suportava o regime vigente. Seria uma questão de tempo até à ruptura. Assentou praça na Escola de Cavalaria de Santarém em 1961 e, logo ali, teve ocasião de manifestar ideias muito próprias, desafiando a rigidez do quartel, dizendo alto e bom som que nunca combateria na guerra colonial, enfim, criando sarilhos graves que apelidou terem constituído um “desamor à primeira vista”.

E foi na tropa que, pela primeira vez, conheceu a prisão, aqui em contexto de castigo militar. Assim, quando mobilizado para embarcar para África desertou e rumou a Paris, para o que contou com a ajuda de seu irmão Eduardo, Vitor de Sá e Santos Simões, que considerou ter sido a sua “escola política”. Nos primeiros dias de 1963 chega a Paris, e como trabalhador-estudante viria a cursar Línguas e Civilização Francesa, na Sorbonne e desenho de construção civil na École de Travaux Publique. Frequentou, ainda, o curso de Sociologia.
Integraria a Comissão Franco-Portuguesa de Apoio aos Emigrantes e Desertores Portugueses. Já em 1972-1973 seria assistente de realização e na produção de filmes da televisão francesa sobre a emigração portuguesa.

Pelo meio, refere a felicidade de ter vivido o forte estremeção que constituiu o Maio de 68 em França, Paris, particularmente. “Para um jovem, vindo de um país oprimido e fortemente policiado, participar no Maio de 68 foi realizar o irrealizável. O impossível tornou-se possível. Já não se tratava só de exigir alterações no ensino mas na sociedade. Já não era só uma questão estudantil mas de civilização. Não se discutia já o poder da Universidade mas as relações de poder na sociedade. Lutava-se agora contra uma certa forma de civilização. Estava em causa a mudança na relação de poder do Estado com os cidadãos”.

A experiência revolucionária e fortemente activa e empenhada nos acontecimentos de Maio de 68, nas barricadas consecutivas com a polícia do lado contrário, viria a reforçar a vontade de luta pelos ideais que perfilhava, agora, porém, de modo mais activo e consequente. “Quem lutou no Maio de 68 estava preparado para lutar em qualquer frente. E sobretudo nas que nos diziam mais directamente respeito. Nas mais directas e certeiras. Tínhamos aprendido a utopia”.

(…) “Depois da experiência de Maio de 68 as minhas opções estavam tomadas. Entregar-me totalmente à luta contra a ditadura e pela liberdade e democracia em Portugal exigia, naquela altura, uma disponibilidade total e um empenhamento intenso. A vivência rotineira e a obtenção do canudo não eram prioritárias. Não havia tempo nem espaço , e como tive que optar…Maio de 68 empurrou-me para o combate de que Portugal precisava para ser Livre.”

Não admira, portanto, que muito pouco tempo depois deste sobressalto José Casimiro estivesse na LUAR, Liga de União e Acção Revolucionária, ao lado de Hermínio da Palma Inácio, Camilo Mortágua, Ayalla, e outros…”Tomei uma opção política clara. Ao aderir de corpo e alma à LUAR, com o percurso que já tinha feito no Maio de 68, estava, definitivamente, a dar uma enorme reviravolta na minha vida. Era um passo em frente na luta pela liberdade, pela democracia, por um Portugal fraterno e feliz.” (…) “ Tinha consciência que a LUAR não se limitava a distribuir panfletos A luta armada fazia-se com armas e com meios. Ainda assim, sempre com o princípio de não matar”. (…) “Antes de participar em operações ou acções directas, havia um período de instrução por que passavam todos os membros, em que se aprendia a manejar uma arma, a montar e trabalhar com explosivos, técnicas de combate e defesa, preparação de comportamento para a hipótese de ser preso, era uma espécie de Escola Prática. Funcionava numa quinta arrendada à LUAR nos arredores de Paris.”

José Casimiro participou em operações de variado tipo, e….como sucede em percursos semelhantes, viria a ser preso pela PIDE, nessa época já designada de DGS, em Novembro de 1973, em Lisboa, juntamente com Palma Inácio. A tortura foi pesadíssima, a pancada, o isolamento, a torura do sono, tudo o que se entendeu ser devido aos operacionais da LUAR, “inimigos particulares” da polícia.

José Casimiro só seria libertado na sequência do 25 de Abril de 1974, já na madrugada do dia 27. O retardamento da libertação deveu-se a forte oposição de Spínola quanto à natureza das acções de vários presos políticos –designadamente dos membros da LUAR- que viria a determinar o ultimatum colocado pelos presos, a uma só voz:- ou saem todos ou não sai nenhum. Esta indecisão de Spínola, na verdade, vinha carregada de certezas, funestas certezas que o tempo ajudaria a confirmar.

“Com o tempo e com o prosseguimento do processo de normalização democrática entendemos que a LUAR já não fazia grande sentido”. E decidiram dissolver a organização.

Regressado a Guimarães em 1977 estará na criação de uma rádio local, a Rádio Guimarães, é co-fundador de uma Galeria Bar, o Finalmente, que transformou a noite vimaranense e lhe trouxe cultura, de modo muito singular, foi co-fundador da Cooperativa Editorial O Povo de Guimarães, em cujo jornal teve inúmeras participações, foi co-fundador do CICP, Centro Infantil e de Cultura Popular, que gostava de designar de Escola Primária da Democracia Interactiva. “O CICP teve um Infantário, um Grupo Coral.

Entre outras activides o CICP organizou, em 1982, uma coisa fantástica designada a CIRCULTURA”. José Casimiro foi dos grandes responsáveis desta iniciativa que traria a Guimarães nomes como José Afonso, José Mário Branco, Carlos do Carmo, Vitorino de Almeida, entre vários outros.

Integrou a Direcção do Convívio, Associação Cultural e Recreativa, e, por via disso, a Comissão Organizadora do primeiro Guimarães Jazz, em 1992. Foi também co-fundador da CERCIGUI, dirigente do Cineclube de Guimarães e membro da MURALHA – Associação Para a Defesa do Património.

Fez parte da Comissão que organizou a grandiosa Homenagem a Santos Simões, em 1989. “Um grupo de companheiros alongavas as noites no Convívio em sã fraternidade que a conversa amiga propicia. E a todos estava a incomodar um conjunto de textos publicados contra Santos Simões no Povo de Guimarães por uns tipos quaisquer, não interessa. E ali nasceu a iniciativa de fazer uma homenagem ao enorme Joaquim Santos Simões”

(Estas memórias seguem de muito perto o depoimento de José Casimiro Martins Ribeiro publicado em “Guimarães, Daqui Houve Resistência”, Recolha e Organização de Textos de César Machado, edição Cineclube de Guimarães, 2014. Aproveito, aliás, para agradecer profundamente ao José Casimiro todo o incentivo e disponibilidade amiga para que o livro se realizasse, muito antes de sabermos se teríamos apoios ou não. “Avança, faz o livro. Se os apoios não aparecerem o livro publica-se! Obrigado por tudo, Amigo José Casimiro!

Naquele depoimento José Casimiro termina com estas palavras:
“É com esta exaltação da vida que quero terminar este testemunho. De um percurso feito com alguma loucura, com uma total entrega, e com uma imensa vontade de lutar pela liberdade.

Como dizia Antero de Quental
“NÃO É TUDO A LIBERDADE
MAS É O PRIMEIRO PASSO
PARA QUE TUDO SE ALCANCE
É A PRIMEIRA CONDIÇÃO
DE TUDO O QUE É JUSTO E SANTO

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