MÁRIO SOARES E “REINVENTAR A DEMOCRACIA”.

CARLOS VASCONCELOS Advogado

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por CARLOS VASCONCELOS
Advogado

Este artigo de opinião será publicado no dia em que se realizarão as cerimónias fúnebres do Dr. Mário Soares.

Nestes momentos, marcados por natural emoção e comoção, existe uma tendência absolutamente compreensível, porque humana, para um certo endeusamento. Independentemente disso, não precisamos de “descolar da realidade” para se reconhecer o papel absolutamente central e essencial do Dr. Mário Soares na segunda metade do século XX e no início do século XXI, em Portugal, na Europa e no Mundo.

Papel central e essencial pelas melhores razões. Pode não ter sido sempre consensual – e, em política, o não se ser consensual é, na maior parte das vezes, o melhor “cartão de visita” -, mas foi sempre um defensor intransigente da liberdade e da democracia, de uma democracia pluralista, em que todos os democratas tivessem lugar.

Os portugueses têm para com Mário Soares uma enorme dívida de gratidão. No âmbito da sua riquíssima vida cívica e política, permito-me destacar quatro momentos que considero determinantes.

Em primeiro lugar, o seu combate à ditadura de Salazar e de Caetano, que lhe valeram a deportação e prisão para S. Tomé e Príncipe e o exílio em França. Em segundo lugar, o seu papel crucial no Verão Quente de 1975, ao ter contribuído de forma decisiva, para evitar a transformação de Portugal numa espécie de “Cuba europeia”. Em terceiro lugar, a sua coragem no processo que levou à Revisão Constitucional de 1982, que institucionalizou o essencial do regime político em que vivemos, tendo contado, na ocasião, com a forte oposição inicial do seu Grupo Parlamentar e do Secretariado do PS, em que pontificavam nomes como Vítor Constâncio, Jorge Sampaio e António Guterres. Em quarto lugar, a sua visão política ao ter apostado na adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia e a defesa que sempre fez do projecto europeu.

Um exemplo de como é possível viver uma vida inteira, de forma autêntica, e defendendo-se sempre aquilo em que se acredita.

 

  1. Realizou-se no último fim-de-semana, em Lisboa, o primeiro Fórum dos Cidadãos, organizado com o objectivo de “revigorar a democracia portuguesa” e de melhorar a comunicação entre cidadãos e políticos. Uma iniciativa apresentada como uma iniciativa da sociedade civil, financiada pela Universidade Nova de Lisboa e pelo Instituto Gulbenkian da Ciência. A iniciativa merece atenção, apesar de assentar na alternativa de representatividade expressa no livro “Reinventar a Democracia”, de Manuel de Arriaga, livro em que, entre outras, se equaciona como proposta a criação de um “parlamento de cidadãos”, escolhidos por sorteio.

A meu ver, e fazendo a ligação com a primeira parte deste artigo, não é necessário reinventar nada, muito menos por via da criação de parlamentos escolhidos por sorteio. Sem prejuízo da possibilidade – que existe sempre – de aperfeiçoamento da democracia, o essencial continua a ser o mesmo: a defesa de valores e de princípios acima dos interesses materiais; a defesa do interesse geral, em detrimento dos interesses particulares; a defesa de ideias, de programas, de compromissos com o eleitorado, sem conceder à “tirania absoluta” da tendência cada vez mais crescente para reduzir quase tudo à imagem, associada à falta de conteúdo, de ideias e de compromisso.

 

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