O ano dos cisnes negros
Por Rui Armindo Freitas.

por Rui Armindo Freitas
Economista e Gestor de Empresas
Há pouco mais de um ano, nesta mesma coluna de opinião, no início da pandemia, escrevia sobre impactos que eventualmente sofreríamos nas nossas vidas. Ainda tudo era novo, e todos esses exercícios eram de certa forma especulativos, um somatório de possíveis consequências, aos olhos de alguns exageradas, mas que a realidade conseguiu ultrapassar, para espanto inicial de todos, mas hoje, acomodados, de forma mais ou menos dolorosa, nas vidas de cada um de nós.
De facto, no último ano, aquilo a que os economistas, matemáticos e estatísticos gostam de chamar cisnes negros, com base na teoria de Taleb, isto é eventos altamente improváveis e difíceis de antecipar, têm surgido com a frequência que obviamente ninguém espera, e tal como os caracteriza, sem que ninguém conte com eles. Estes eventos inesperados vieram por a nu debilidades da organização da sociedade, na forma como se relaciona num mundo globalizado. Nesse artigo a que chamava Globalização Total, alertava para a necessidade de diversificação geográfica das cadeias de aprovisionamento. Mais de um ano depois, e com o mundo a mostrar que a globalização tem os méritos de conseguir pôr todos a trabalhar em simultâneo para que se tivesse obtido uma vacina em tempo recorde, que é possível produzir em múltiplas geografias, as suas vantagens ficam à vista se bem que alguns não resistem à tentação de defender regimes autocráticos, economias mais fechadas, que lhes garantam uma defesa intransigente das suas economias, na defesa tosca de empregos para os seus nacionais, esquecendo tudo quanto foi possível alcançar por vivermos num mundo aberto. Mas se este discurso pró globalização foi reforçado nos esforços para debelar o SARS-Cov2, de repente somos deparados com um navio, sim, um navio, para pôr de novo em causa toda esta teoria. O Canal do Suez, cuja importância já Eça de Queirós, que assistiu à sua inauguração, relatou, viu-se estrangulado e com ele grande parte do comércio internacional afectado. Mais uma vez os cépticos da globalização, os autocratas, os defensores de uma economia menos eficiente, vieram a terreiro defender uma inversão do caminho que permitiu que o mundo fosse hoje um lugar melhor para viver. Seja a nível local, seja a nível global, o tempo que vivemos traz enormes desafios. Para a nossa região em concreto, vem mostrar que a lógica, não de economias mais fechadas, mas mais diversificadas do ponto de vista geográfico, vêm reafirmar a necessidade de existência de um tecido industrial diversificado, com valor acrescentado e com lugar na economia de futuro. A nossa região e o nosso concelho em particular, poderão ter um papel pivotal nesta necessidade não autocrática de ver a economia, mas global, que tenha na diversificação e descorrelação geográfica uma oportunidade para o desenvolvimento económico e social. Por isso, e o que aqui mais nos interessa é a nossa terra, reforço os apelos que tenho deixado ao longo de anos, nos vários fóruns concelhios onde tenho assento, para que se olhe de forma estratégica para o futuro económico do nosso concelho, que não fiquemos fechados em torno de nós próprios mais uma vez, enquanto os nossos vizinhos se abrem ao mundo. Que se diversifique enquanto é tempo, e que se assuma de uma vez por todas a liderança económica da nossa região.
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