Os milhões e as boas intenções (que enchem o inferno)

Por Carlos Guimarães.

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por Carlos Guimarães
Médico urologistaOs dias preenchidos impedem os nossos movimentos. Aquela tarefa de “tratar de assuntos” é cada vez mais difícil devido à exiguidade do tempo, o qual se tem de encaixar em horários de serviços por vezes um pouco “esdrúxulos”. Vi-me forçado a suprimir um dia de trabalho para “tratar de assuntos”. Com o dia todo por minha conta, cedo me apercebi que pelas 8:00h não é possível “tratar de assuntos” porque todos os expedientes abrem mais tarde. Vivo numa freguesia rural na fronteira entre Guimarães e Braga e decidi fazer o dia usando os transportes públicos. O autocarro que me levou à cidade demorou cerca e 50 minutos e a minha mobilidade pedonal entre os serviços demorou cerca de 30 minutos. Mal os serviços abriram removi a minha senha aqui e ali, esperei e fui atendido dentro das demoras expectáveis. Com os assuntos resolvidos em Guimarães, dirigi-me à estação da CP para me deslocar ao Porto. Ignorei a internet e as aplicações e procedi como se fazia à moda antiga. Entrei na estação um pouco depois das 10:00h e fui informado que só teria comboio perto do meio-dia, ou seja, a “emergência climática” que nos deve obrigar à mobilidade sustentável disse-me que entre um comboio e outro que liga Guimarães ao Porto existe um espaço de 2h! Esperei o tempo devido pouco agradado com o absurdo dos horários e 7 minutos antes do meio-dia o comboio iniciou a marcha. Cheguei à estação de S. Bento perto das 13:30, momento em que já não era possível tratar do meu assunto devido ao encerramento para almoço. Aproveitei para enfardar e em seguida passei no Mercado do Bolhão para “fazer horas”. Uma obra de bandeira, geometricamente alinhada, limpa, asseada e triste. Senti que o Bolhão respirava sem alegria, sem pregão, sem poesia, sem desalinhamento. Ninguém me tentou vender peixe, carne, flores ou fruta. O bolhão está morto. Não há sujidade, as galerias estão vazias, os preços nada têm a ver com a tradição dos mercados. Podem dizer que o Bolhão está bonito, mas a beleza está na alegria e na verdadeira essência das coisas que me pareceu pervertida para sempre. Em Portugal, fazemos obra, gastamos milhões e trombosamos a corrente sanguínea, removemos a alma dos sítios e das gentes, deixamos de ser nós e passamos a ser um produto do instagram, atados em regulamentos, enjaulados.

Após o desgosto do Mercado do Bolhão, fui “tratar do meu assunto” mesmo ali ao lado. Em 10 minutos fiquei despachado e regressei à estação de S. Bento para regressar a Guimarães. Pouco passava das 15:00h e fiquei a saber que o próximo comboio para Guimarães partiria às 16:20, ou seja, duas horas depois do anterior! Que deus os perdoe! Regressei com as composições apinhadas e perto das 18:00 h pisei o solo na cidade berço. Caminhei até apanhar o autocarro que me levou de volta a casa onde entrei pelas 19:30h.

Agora digo-vos; fui à EDP, à Vimagua e a uma ótica no Porto e em nome da “sustentabilidade ecológica” saí de noite e cheguei de noite, mais de 12 horas para fazer aquilo que no meu veículo pessoal faria num quarto do tempo. Daqui se infere, e numa conclusão real, que por cá me manterei a poluir a parte que me é devida, sem peso na consciência.

Como diz o inteligente, “contra factos não há argumentos”.

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