Portugal em chamas: Quando a tragédia se torna rotina
Todos os verões, Portugal arde. A cada ano, renovam-se os cenários de destruição: hectares de floresta consumidos pelas chamas, aldeias evacuadas, bombeiros no limite, animais mortos, e populações deixadas à mercê do vento e do fogo.

© Eliseu Sampaio
Já não se trata apenas de fenómenos naturais, mas de uma crise estrutural que, por mais que se anuncie, continua a ser empurrada com promessas e planos que nunca saem verdadeiramente do papel.
Os dados são claros: Portugal lidera, de forma quase crónica, o número de hectares ardidos na Europa. E se há anos piores do que outros, a tendência é alarmante. O clima é cada vez mais seco, as temperaturas mais extremas, e o território, com florestas desordenadas, carregadas de mato e dominadas por monoculturas como o eucalipto, está preparado não para resistir ao fogo, mas para o alimentar.
No entanto, insistimos numa lógica reativa. Apostamos milhões no combate, mas pouco na prevenção. Continuamos a tratar os incêndios como inevitabilidades sazonais, em vez de consequências de um modelo falido de gestão florestal e abandono rural. A agricultura tradicional desapareceu, os campos estão ao abandono e as aldeias esvaziaram-se. O interior tornou-se combustível à espera de um fósforo.
Desde Pedrógão Grande que ouvimos falar em reformas estruturais, em novas estratégias e entidades criadas para dar resposta à ameaça dos incêndios. Mas, na prática, pouco mudou. A burocracia continua a travar ações no terreno, os planos de ordenamento não saem do papel.
Não é aceitável que um país moderno veja populações encurraladas, casas destruídas e ecossistemas inteiros desaparecerem, ano após ano, sem uma resposta à altura.
Portugal precisa de uma nova visão para o seu território. É urgente valorizar o mundo rural, diversificar as espécies florestais, reforçar a vigilância, responsabilizar os incendiários e, sobretudo, agir com continuidade, e não apenas quando o país já está a arder.
Enquanto não o fizermos, continuaremos a escrever os mesmos textos, a ver as mesmas imagens e a chorar as mesmas perdas. E essa, sim, é a verdadeira tragédia.