RONDA DA LAPINHA E O TURISMO RELIGIOSO EM GUIMARÃES
FLORENTINO CARDOSO

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por FLORENTINO CARDOSO
Hoje fala-se cada vez mais de turismo religioso como uma potencialidade económica emergente para uma Cidade ou para uma Região. E a verdade é que, a partir do PENT, o turismo religioso tem-se afirmado como um produto estratégico e tem ganhado peso e importância no panorama do turismo nacional. “Portugal é um roteiro de templos, cultos e festas religiosas que podemos percorrer cheios de fé ou duma espiritualidade de raiz mais universal, seja em busca do sagrado, seja em busca de nós próprios”, lê-se no “sítio” institucional do Turismo de Portugal.
Por todos os atributos que possui no contexto do património religioso – tanto material como imaterial – será que Guimarães tem potencialidades, ou produtos, para se afirmar como um destino referencial de turismo religioso?
Antes de procurar uma resposta, há duas notas importantes que convém fixar:
– Guimarães situa-se a escassos quilómetros de uma outra cidade, Braga, que se intitula de “Roma Portuguesa” e de “Cidade dos Arcebispos”, não só porque tem inúmeras igrejas, mas também porque o seu Arcebispo foi o mais importante na Península Ibérica durante séculos;
– Com a crescente vaga de “secularização”, o fenómeno religioso entrou em campos até então interditos. E por isso, como diz o Dr. José da Silva Lima, “o religioso hoje está em situação de mercado e sem dúvida que neste contexto, há que cultivar a qualidade do produto e também o seu marketing”. E este autor acrescenta ainda que hoje “a experiência religiosa é tão compósita como os ingredientes de uma refeição entre amigos”, uma espécie de “cocktail religioso” (in Entre Rezas & Romarias, páginas 23 e 24).
Antes de passar em revista aquilo que foi o resultado da minha ação na direção da Irmandade de Nossa Senhora da Lapinha ao longo dos últimos cinco anos, queria deixar bem claro que foi com a consciência destes dois pressupostos que aceitei o cargo, em Dezembro de 2010.
E aceitei, porquê?
Porque senti que Guimarães estava completamente alheada dum “produto turístico” com características únicas, chamado Ronda da Lapinha, e que era preciso “tirar das trevas” ou “pôr no mapa” este precioso património cultural imaterial da nossa terra!
Por isso, em Março de 2011 foi promovida a realização de uma conferência no pequeno auditório do CCVF, com a participação de vários oradores, entre os quais o Dr. Franquelim Neiva, que descreveu com enorme rigor histórico como o Clamor-em-Ronda da Lapinha conseguiu resistir e sobreviver a todas as restrições sucessivamente impostas pelas autoridades religiosas e civis.
Apesar de não ter sido integrada na programação da CEC 2012 como prometido, pela expressividade da experiência religiosa que envolveu, a edição da Ronda de Lapinha de 2012, comemorativa dos 400 anos do evento, conseguiu juntar no Largo do Toural 30.000 fiéis e elevar a sala de visitas da cidade à categoria de “plateau” da religiosidade popular portuguesa.
No ano seguinte, repetiu-se o Clamor, desta vez com a presença da imagem peregrina de Nossa Senhora da Lapa, que esteve exposta desde a véspera na Igreja de S. Francisco e no dia da Ronda saiu em procissão até ao Largo do Toural, acompanhada pela Irmandade de Nossa Senhora da Lapa da Póvoa de Varzim.
Em 2014 esteve presente no mesmo cenário a imagem peregrina de Nossa Senhora da Nazaré, acompanhada por representantes do Círio de Olhalvo e outras individualidades.
Por último, da programação da edição 2015 fez parte um Clamor no Largo do Toural, com a presença do Senhor Arcebispo de Karachi, Paquistão, D. Joseph Coutts.
Deste modo, permito-me concluir que, fruto da introdução de elementos programáticos inovadores, como o Clamor Solene, e da ampla repercussão mediática que todos os descritos eventos mereceram, a Ronda da Lapinha está hoje revestida de suficiente visibilidade e implantação no contexto das manifestações portuguesas de religiosidade popular, e em condições de acrescentar valor à oferta que Guimarães possui no âmbito do turismo religioso.
Creio que Guimarães tem potencialidades, ou produtos, para se afirmar como um destino referencial de turismo religioso. O que faz falta é a implementação de uma estrutura de trabalho, que congregue os vários “players” nesta matéria, que valorize os produtos com recurso à tríade ideias, competências e contactos e que, finalmente, monitorize o seu desenvolvimento.
Se Guimarães quiser competir no turismo religioso com cidades da sua dimensão ou maiores – nomeadamente com Braga – tem de saber utilizar e combinar perfeitamente todos os ingredientes que possui, para produzir um “cocktail religioso” apetecível!