Sinais de crise política ou a Democracia a funcionar?

Por José Rocha e Costa.

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por José da Rocha e Costa

Zygmunt Bauman, filósofo e sociólogo polaco, que viveu em Inglaterra desde o início dos anos 70 até à sua morte em 2017, alertava no livro “Estado de Crise” para a existência de uma falta de poder dos governos ocidentais. Segundo ele, à medida que os governos dos países ocidentais foram privatizando sectores estratégicos que tradicionalmente costumavam ser detidos e geridos pelo Estado, a capacidade desses governos de “ditarem” o rumo da economia ou, pelo menos, criarem incentivos para atingir determinados fins económicos, foi-se desvanecendo. Na ideia de Bauman, passamos a ter Governos, que apesar de governarem, ficaram vazios de poder.

Nos últimos dias assistimos em Portugal a algo inédito, pelo menos por terras lusitanas, que é assistirmos a um Governo que já de si tem pouco poder (ou como diria Bauman: está vazio de poder), ser também “atropelado” naquilo que é a sua capacidade de governação. Estou-me a referir obviamente aos diplomas propostos pelo Bloco de Esquerda, que incidem sobre o aumento do apoio à redução de actividade dos trabalhadores independentes. O apoio em questão já tinha sido recuperado pelo Governo, constando inclusive no Orçamento de Estado para 2021, no entanto, na versão proposta pelo Governo, o cálculo deste apoio baseava-se nos 12 meses anteriores, ou seja, no rendimento médio anual do ano de 2020. O que o Bloco de Esquerda veio propor é que, tendo em conta as perdas de rendimento que os trabalhadores independentes tiveram durante a pandemia, o apoio devia ser calculado com base nos rendimentos referentes ao ano de 2019 ao invés de 2020.

A dita proposta foi a votação no parlamento e foi aprovada com votos favoráveis de todos os partidos à excepção do PS, que evocou a lei travão, uma regra da constituição que impede que os deputados aprovem medidas que aumentam a despesa, para além daquela que já estava prevista no Orçamento de Estado. Os diplomas seguiram posteriormente para o Presidente da República que os promulgou, interpretando que estes estão conformes à Constituição e podem ser aplicados, na medida em que respeitem os limites resultantes do Orçamento de Estado vigente.

Eu não ponho nenhuma questão em relação ao mérito das propostas do Bloco, nem sequer à constitucionalidade de todo o processo, até porque não sou especialista na matéria, mas não deixa de ser estranho que um Governo em funções tenha que aplicar uma medida da qual mostrou ser totalmente contra, ainda por cima por motivos de contenção orçamental num contexto económico difícil como o que vivemos hoje em dia.

Uma coisa é certa, pelo andar da carruagem, não se auguram facilidades no que toca à aprovação do orçamento de Estado do próximo ano. Ainda faltam alguns meses para que essa discussão ocorra, mas ou muito me engano, ou poderemos estar perante o fim de um Governo que se tem mantido de pé sempre à custa de negociações constantes e de avanços e recuos, resultantes de um equilíbrio parlamentar frágil que se agravou com o fim da “Gerigonça”.

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