“Gostava que que cada família de Guimarães tivesse em casa um Manual do Nicolino”
Vai na terceira edição o Manual do Nicolino e é, nada mais nada menos, um guia leve, de leitura acessível a todos, interativo e original sobre as Festas Nicolinas, da autoria de Paulo César Gonçalves.
Considera que a obra não é um manual “nem de boas, nem de más práticas”, mas sim uma apresentação dos números, das particularidades, de um dos marcos mais identitários de Guimarães e dos vimaranenses.
O autor garante que não tem ambições com a republicação desta obra, mas confessa que “gostava que cada família de Guimarães tivesse em casa um exemplar”, e que seria “perfeito que todas as escolas do concelho se envolvessem”. É que Paulo César Gonçalves entende, pela experiência que alberga, que o espírito Nicolino não chega, como devia, às periferias do concelho de Guimarães.
Quem é o autor do Manual do Nicolino?
Sou uma pessoa que teve sorte de nascer num sítio muito bonito e de conhecer algumas pessoas que me ajudaram a estimular a imaginação e a criatividade. Esse foi o melhor período da minha vida. Cresci na zona da Costa, a meio do caminho da Penha, no meio do verde que é um antidepressivo. Ali, todo o contexto era bonito. Se quiserem achar que a minha veia de autor vem desse tempo, eu acho que sim.
Desde cedo, aos cinco anos, que despertei para a leitura. Apesar de ainda não ter a capacidade de ler, os meus avós tinham caseiros e um deles, vizinho de porta, tinha um filho mais velho do que eu, e lembro-me de lá pedir livros de banda desenhada só para olhar para eles. Fui introduzido às Nicolinas com seis anos e aconteceu tudo ao contrário. Hoje em dia, o número anunciador das Nicolinas é o Pinheiro, mas há muito mais do que isso.
Porquê uma terceira edição, tem sentido essa necessidade?
Sim, sinto, ainda mais quando não tenho livros e as pessoas me pedem. O livro foi lançado a 14 de outubro, está a correr bem.
As pessoas gostam muito do livro, esteticamente é muito bonito e, em termos históricos está bem escudado. Pedi o Prefácio à pessoa que mais sabe sobre Nicolinas, que é o professor António Amaro das Neves, que é uma bíblia em termos de história local.
O Posfácio é do professor antropólogo Jean-Yves Durand, que fez um estudo sobre as Nicolinas. A história é efabulada pelo engenheiro Hélder Rocha, foi a forma que encontrei de o homenagear nos seus 100 anos, em 2016, na primeira edição. Senti que estaria salvaguardado com estas pessoas, porque, garantidamente, não iam deixar passar inverdades.
Vai na terceira edição, olhando para traz e recordando os objetivos iniciais traçados, chegou onde queria com a publicação desta obra?
Queria ir bem mais longe. O livro, apesar de ser bonito esteticamente e de ter aquele apelo todo, em termos de ilustração de relevo pop queria ir além, mas o preço ia inflacionar e o livro já não é barato. Se eu pudesse seria totalmente gratuito. Tive a ajuda de muitas pessoas, institucionalmente é apoiado pela Associação dos Antigos Estudantes do Liceu de Guimarães, que me cederam o link para os toques nicolinos, que constam na publicação através de QRCode.
Além disso, a Câmara de Guimarães também apoia e fica com uma parte da edição. Na prática, o ideal seria que o livro pudesse ser oferecido às crianças que ingressam no primeiro ciclo. A maior parte só conhece o Pinheiro, um número rural, lembrando que em tempos, a primeira coisa que se fazia numa festa era a erguida do mastro, da bandeira, e ainda é em muitas aldeias.
As escolas têm um papel fundamental no que toca à promoção da cultura local. Têm cumprido?
Não. Acho que o património das Nicolinas é muito rico, tem um valor cultural incalculável e o que acontece é que as escolas tomam por garantido. Mas há exceções. É uma patetice uma escola se assumir como mãe das Nicolinas, porque a história diz que as festas não eram de origem exclusiva, eram estudantes pobres, coreiros, miúdos que iam pedir no 06 de dezembro pelo S. Nicolau e há todo o caminho até entrar no ensino organizado. Não acho que os miúdos, ao nível institucional, por parte das escolas, tenham um apoio sério.
Os estudantes que organizam as Nicolinas mereciam outro reconhecimento, é muito mais importante o que eles estão a fazer de setembro a dezembro, organizando umas festas com esta simbologia para a cidade e para a comunidade estudantil, do que fechados dentro de quatro paredes durante seis meses, não serve para nada.Acredito muito na educação colaborativa, não há muita crença na educação não formal e é uma estupidez.
Como podemos apresentar o Manual do Nicolino?
É uma obra infantojuvenil e embora possa ser lido por qualquer pessoa, está escrito de uma forma não infantilizadora. O objetivo é aguçar a curiosidade e ela está lá para toda a gente. Em 2012 tinha a ideia de escrever uma espécie de biografia, ou monografia, sobre uma pessoa em questão ligada às festas Nicolinas que estava esquecida em Guimarães, o engenheiro Hélder Rocha. Mas depois percebi que teria de ser alguém mais capacitado do que eu para fazer um trabalho destes.
Há imensas publicações sobre as festas, não havia era uma direcionada ao público mais jovem, que é malta que vai participar e levar as Nicolinas para o futuro. E é importante porque há muita gente que não sabe. Estive em escolas e percebo que, saindo da cidade, há um desconhecimento total. Este ano os miúdos da Comissão de Festas fizeram uma coisa extraordinária, a meu ver, que foi promover um ensaio nas Taipas, porque têm uma Secundária. Isto porque chegar às pontas do concelho é importante.
No seu ponto de vista, há algo mais que possa ser feito?
No âmbito das instituições Nicolinas, não acho que haja falhas, sabemos que é complicado, porque todos os que estão por trás têm o seu trabalho e conciliar é difícil.
Quando demonstro disponibilidade para ir às escolas, às vezes sinto que julgam que é para vender livros. É o meu trabalho, da mesma forma que o trabalho dos bibliotecários existe, porque há livros e que os faça. Disseram-me que numa escola de Guimarães as crianças não sabiam o que era o Pinheiro e os pais também não. Podem dizer que as famílias estão sobrecarregadas, mas não é obrigatório comprar. É importante as pessoas perceberem isso.
A candidatura das Festas Nicolinas à Unesco faz sentido?
Não sei se essa candidatura devia avançar. Já fui a favor, mas há um trabalho ainda a fazer nos arredores, que também são Guimarães. É preciso lembrar que os Nicolinos do passado, muitos deles não eram de Guimarães, vinham sim estudar para Guimarães. O Liceu tinha o Internato, havia Nicolinos nas Terras de Basto, Fafe, Famalicão, que depois regressavam à base.
Até onde gostaria de chegar com o Manual do Nicolino?
Não tenho ambições. Estamos a falar de 5 mil exemplares em três edições, em termos demográficos, não sei quantas famílias terá Guimarães, provavelmente mais, mas um por família era perfeito.
E como está a agenda de apresentações?
Na semana do Pinheiro tenho agenda cheia. Vou estar no dia 27, no Alto da Bandeira e a 28, em Fafe o dia todo, porque a vereadora da Cultura me convidou. Como o livro foi reeditado a 14 de outubro, data de aniversário da madrinha dos estudantes, a dona Aninhas, que é de Fafe, vou à escola de Quinchães que era a sua terra natal. E a 29 vou estar o dia todo no Colégio do Ave, e à noite estou no Pinheiro, não posso falhar.
Resolvi alterar o título, detesto que lhe chamem “pequeno Nicolino” ou “Manual do Pequeno Nicolino”, mas a culpa é só minha porque pus esse título no início, entre aspas. O título original que sempre pensei é “Manual do Nicolino”, a minha ideia perfeita é que o livro esteja sempre na mochila.
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