“Passamos a vida a desinfetar a casa e as mãos”: os novos hábitos de uma nova vida

A pandemia trouxe novos hábitos para dentro das nossas casas e, agora, faz-se o possível para evitar ao máximo o contágio.

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O filho de A. passa uma semana em sua casa e outra na do pai, que continua a conviver com pessoas diferentes todos os dias. A enfermeira Soraia tem uma casa de banho só para si. Os pais de Sara não dormem juntos — a mãe é enfermeira. A pandemia trouxe novos hábitos para dentro das nossas casas e, agora, faz-se o possível para evitar ao máximo o contágio.

©iStock

A rotina de Soraia Moreira é, hoje, muito diferente. A enfermeira de 33 anos, que vive com os pais e a irmã, ponderou “sair de casa” durante este período, “como alguns colegas fizeram”. “Depois, eu e a minha família determinamos que ficaria aqui, em casa, e decidimos adotar medidas de prevenção e proteção”, conta. Soraia trabalha no Hospital da Senhora da Oliveira de Guimarães (HSOG) e, por isso, os cuidados são redobrados: “Antes de sair, do bloco, troco de farda e visto a limpa. Depois, tomo banho e visto a roupa do dia-a-dia. Antes de entrar em casa, tiro os sapatos e dispo a roupa, vou tomar banho novamente e visto outra roupa para andar em casa.” A vimaranense está, neste momento, a lidar com suspeitas de covid-19, pelo que todos os cuidados são poucos.

O caso de Soraia Moreira é apenas um entre vários (já vamos aos outros), mas reflete a mudança forçada que o coronavírus trouxe à organização, às limpezas e à logística dos dias de hoje. Quando chega a casa com compras, todos os produtos embalados são prontamente desinfetados, mas não é esse o único cuidado. É que se viver em pandemia mudou a forma como fazemos as nossas compras — e como as colocamos nos armários, frigoríficos e congeladores —, também terá mudado a nossa abordagem às limpezas domésticas.

A vida na casa de A., que preferiu não revelar o seu nome, também mudou (e muito) com as novas rotinas. Divorciada e vivendo a guarda partilhada do filho de 11 anos, a vimaranense diz que este “é um momento muito difícil”: “É muito complicado gerir a segurança e o bem-estar do nosso filho. Por vezes não existe muita comunicação entre os pais e então temos de continuar na mesma: uma semana com a mãe e uma semana com o pai.” O ex-marido continua a trabalhar e “a ter as suas rotinas normais, a conviver com pessoas”, já que o trabalho “assim o exige”. Por isso, de cada vez que o filho volta a sua casa, “a primeira coisa que faz é retirar a roupa à porta”. “Desinfeta as mãos e vai diretamente para o banho”, acrescenta. Ainda assim, os carinhos continuam: “É inevitável. Temos consciência de que não devemos, mas, estando uma semana separados, é difícil. O facto de gerir a separação não é fácil e ainda ter de lhe dizer que não há abraços e carinhos…”

Ir às compras também é muito diferente. Soraia diz que todos os produtos são desinfetados. © João Bastos/ Mais Guimarães

Contudo, A. também vive também com os pais, que fazem parte de um dos grupos de risco devido à idade. Para além disso, o pai “é doente crónico”. “O meu maior receio é que o meu filho seja um meio de transmissão para eles. Tenho de gerir esta triste realidade como mãe, mais o sentimento como filha”, lamenta. Assim, “as refeições são feitas à parte”: come com o filho na sala de estar, ao passo que os pais fazem as refeições na cozinha. “Todos os talheres, copos e outros utensílios que o meu filho utiliza são desinfetados”, garante. Os afetos entre avós e neto estão proibidos: “Mantemos o distanciamento, falam a dois metros de distância. E passamos a vida a desinfetar a casa, as mãos…” Em casa, também há uma casa de banho que só o filho de A. utiliza.

A situação é igual na casa da enfermeira Soraia: “Tenho uma casa de banho só para mim. Jantamos todos na mesma mesa, mas sempre com distância. O mesmo acontece em espaços comuns, como a sala de estar, onde tenho um sofá só para mim.” Quando sai de casa para o trabalho, o telemóvel é desinfetado e segue em película aderente, sendo desinfetado também no hospital. No que diz respeito às marmitas, os recipientes são, agora, “todos descartáveis”. “O que entra no hospital, destas coisas, não sai. Vai diretamente para o lixo”, explica. Para manter a família em segurança (o pai também tem de sair de casa para trabalhar), as maçanetas e outras superfícies são desinfetadas diversas vezes.

A enfermeira Soraia Moreira.
© ACM

E também não há “beijinhos nem abraços” nesta altura. O mesmo acontece em casa de Sara Marques, já que a sua mãe é enfermeira. Chegando a casa, e “mesmo não trabalhando com a roupa com que chega a casa”, a mãe de Sara “vai logo tomar banho e mudar de roupa”. As toalhas de mão são diferentes para cada um e, agora, os pais de Sara dormem em camas separadas. Tanto Sara como o pai estão em regime de teletrabalho: “Eu e o meu pai não temos contacto com ninguém.” Mesmo assim, quando é necessário sair, fazem para não frequentar espaços fechados. As compras, por exemplo, são encomendadas e levantadas no espaço destinado do supermercado escolhido.

Junte-se a toda esta logística a pressão de “não errar” no hospital. “Estou mais familiarizada, agora, com toda aquela artilharia do equipamento de proteção individual”, conta a enfermeira Soraia, que confessa: “Não é confortável, faz calor e ficamos com aquelas marcas todas na cara.” Mais do que isso, preocupa-lhe “o medo de comprometer a segurança” do doente e dos próprios colegas, bem como dos familiares.

Por isso, a enfermeira vimaranense apela: “Se todos ajudarmos, as coisas vão passar mais rápido. As coisas vão correr melhor se tivermos cuidado.” Soraia é da opinião que “os vimaranenses estão a cumprir o confinamento” e prefere ser otimista: “Parece sempre muito tempo, mas cada dia é menos um dia que falta.” Contudo, é realista: “Vai marcar negativamente as pessoas. Porque há gente a morrer mesmo sem ser de covid-19 e que não pode estar com os familiares no último momento. É muito triste.” Assim, reforça que é necessário adotar “todas as precauções para que, em breve, consigamos ultrapassar isto”.

Com Mafalda Oliveira

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