PELA CIDADE

WLADIMIR BRITO Professor de Direito na Universidade do Minho

Wladimir Brito

por WLADIMIR BRITO
Professor de Direito na Universidade do Minho

Mandei-lhe um cartão
que o Maninjo tipografou:
“Por ti sofre o meu coração”
Num canto – SIM, noutro canto – NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou.

“Namoro”

Viriato Cruz

Perguntará a Cidade porque os versos do poeta angolano Viriato Cruz, quando hoje os efeitos referendo inglês é a nossa preocupação. Relembro esses versos exactamente porque quero falar desse referendo e da antidemocrática mania que os (ir)responsáveis europeus têm de não aceitar que os povos os contrariem.

Importa esclarecer, desde já, para afastar quaisquer dúvidas sobre a minha posição relativa ao referendo, discordo dos razões xenófobas, racistas e intolerantes para com o outro, que levaram a Inglaterra a votar “NÃO” à permanência na UE, e que representam um perigo para a Europa.

Lembramos que quem propôs o referendo, por oportunismo político – manutenção no poder – foi Cameron,  o Primeiro Ministro inglês e não os bandos de bêbados, de velhos e de ignorantes camponeses de que agora nos falam alguns analistas políticos, esquecendo até que são esses camponeses que obrigam o seu Governo a impor à UE uma política agrícola especial e mais vantajosa para o mundo agrícola inglês.

Ao que, tudo indica, quando Cameron propôs o referendo não estava bêbado nem era velho ou camponês ignorantes e não ignorava que, hoje, a política interna e a europeia cruzam-se, entrelaçam-se e afectam, para o bem e para o mal, o quotidiano de todos os cidadãos europeus e que tudo isso iria pesar na decisão a tomar pelo povo.

Assim, foram exactamente aqueles que conheciam toda a complexidade das políticas europeias que quiseram o referendo e bem sabiam que o seu povo era e é constituído, de acordo com aquela vergonhosa classificação, por bêbados, velhos e  camponeses ignorantes e que era esse mesmo povo que teria de decidir que canto dobrar, o do SIM ou o do NÃO.

Houve referendo e a maioria “o canto do NÃO dobrou”, logo essa maioria só poderia ser constituída  por um bando de bêbados, de velhos e de camponês ignorantes, pelo que há que fazer tantos referendos quantos forem necessários para que o povo inteligente e culto dobre o canto do SIM. É esta a prática política dos eurocratas e do establishment europeu que desacredita a União Europeia.

Mas este não foi o primeiro referendo na Inglaterra sobre a UE. Houve outro onde, noutro contexto da construção e da política europeia, se perguntava aos ingleses se queriam entrar na Europa.  Nesse a maioria dos ingleses – esses bêbados, velhos e ignorantes camponeses – o canto do SIM dobrou. Para o establishment  europeia essa decisão foi inteligente e acertada.

Anunciado este referendo por quem sabia o povo que tinha não se ouviu uma voz contrária dos eurocratas e do “establishment”. Convenceram-se que tinham com eles o povo do SIM à permanência, o povo culto e que sabe decidir.

Dobrado o canto “NÃO”, eis que a Europa dos burocratas e dos neo-liberais, das elites dominantes, desencadeia contra o referendo uma propaganda vergonhosa, desleal, divisionista, arrogante e desrespeitosa para com os direitos dos cidadãos.

Na verdade, como a maioria dos ingleses livremente o canto NÃO dobrou, eis que tal dobra só poderia ser feita por um bando de bêbados, de ignorantes, de velhos de camponeses iletrados, todos intoxicados por uma mentirosa, desonesta e nada esclarecedora propaganda do NÃO. Sobre a do SIM esqueceram-se de classificar o povo que fez a dobra e de nos dizer que a campanha foi também desonestamente aterrorizadora, chantageadora e mentirosa.

De facto, é preciso dizer que ambas as campanhas, tiveram etas características inaceitáveis. Ambos os lados fizeram-na para obterem dobras, uns no canto do SIM e outros no canto do NÃO.  Mas, o canto do NÃO ganhou, logo, é preciso fazer mais referendos até que o canto do SIM possa ganhar.

Sejamos sérios e respeitemos a decisão livre do povo, mesmo quando com ela não concordamos.

Dizer agora que o referendo não pode valer porque a questão é complexa e o povo nunca foi devidamente esclarecido e, por isso, nada sabe, revela desespero e desonestidade política e até pessoal e é esquecer que a democracia implica a participação de todos – bêbados, como foi Churchill (que, em 1946, preconizou os Estados Unidos da Europa, mas excluiu o seu país dessa nova entidade, lembram-se?) e muitos cidadãos ingleses, velhos e novos, cultos ou ignorantes, cujos direitos de participação não são limitados por esses factores.

Mas, aos defensores destes argumentos devemos fazer duas singelas perguntas.

A primeira, é a de saber se 48,1% dos cidadãos que votaram SIM não serão uma parte desses bandos de bêbados, de velhos e de ignorantes camponeses ingleses ou será que são a única camada inteligente do Reino Unido?

A segunda pergunta é e esta: havendo novo referendo não serão os mesmos bêbados, ignorantes camponeses, velhos, intelectuais e políticos que votaram SIM e NÃO neste referendo que nele irão participar? Ou será que o Reino Unido terá de mudar de povo para esse novo referendo?

Talvez seja mais fácil e mais barato, em eleições livres e participadas, mudar de política e de agentes políticos na Europa.

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