“Para mim, andar de skate é tudo. É libertar-me, esquecer os problemas e, sobretudo, fazer o que gosto”. É desta forma que João Carvalho, mais conhecido na comunidade skater como Kiko, define os momentos que passa sobre quatro rodas.

Praticante da modalidade há 12 anos, quase diariamente, afirma que a liberdade é aquilo que mais o cativa, a par da falta de regras e rotinas. “É muito individual, não há um compromisso, é só fazer porque gostamos”, explicou à Mais Guimarães, numa fria tarde de outono, acompanhado de cerca de uma dezena de colegas.
Durante os dias de semana, a afluência é menor. No entanto, aos fins de semana, quando não chove, o número triplica. Chegam a estar reunidos cerca de 30 skaters, o que faz com que estejam “grande parte do dia parados à espera de vez”.
“Houve muita malta que não conhecíamos que começou a praticar a modalidade. Acho isso uma coisa muito positiva em prol dos skaters. Há muita gente que não faz ideia que há um skate park em Guimarães e não dá para mostrar realmente o que é a modalidade”, acrescentou.
Além da falta de espaço, obstáculos e limpeza, os skaters apontam outras falhas ao skate park, inaugurado em agosto de 2018. Não há casas de banho próximas ao equipamento, nem bicas de água para que se possam hidratar. “Estivemos cerca de meio ano sem luz no parque e, quando chove, fica cheio de água e terra”, explicou.

Para Kiko, a modalidade pode representar uma carreira profissional, sendo esse um dos seus sonhos a concretizar. Para que isso aconteça, refere, “não depende só de mim e do skate, mas também de sair daqui”.
“Neste parque não conseguimos progredir. O ideal seria ir para o estrangeiro ou outra cidade do país”, elencou o skater, que também treina frequentemente na cidade invicta.
Apesar de já ter marcado presença na Liga Pro, o único campeonato nacional de skate, diz ter feito uma pausa nos campeonatos, uma vez que estes representam uma grande despesa.
“O skate não é feito só de provas. Às vezes, vale mais um vídeo na internet para mostrar o que verdadeiramente estamos a fazer do que uma prova em que podemos não estar no nosso melhor dia. Neste momento, a internet é a melhor plataforma para qualquer skater ganhar visibilidade”, opinou ainda.
Aos mais jovens apela que “não desistam”. “O skate não é só o skate park de Guimarães. Sei que quem gostar mesmo não vai desistir”, finalizou.
“Há pessoas que me dou muito bem e que nunca teria conhecido se não fosse pelo skate“

Tiago Oliveira tem uma história diferente para contar. Apesar de ter tido um skate quando era mais novo, a verdade é que nunca lhe prestou grande atenção. O facto de nenhum dos seus amigos ter esse interesse também não ajudou a que embarcasse na aventura sozinho.
“Comecei a andar de skate há cerca de três ou quatro anos, também por influência de um amigo que conheci na altura”, disse à Mais Guimarães.
A seu ver, toda a gente que começa a andar de skate rapidamente percebe que “é tudo muito progressivo” e que “ninguém nasce ensinado”. “No início começa-se a vir para aqui e sente-se um bocado de vergonha, até porque há outros que já cá estão há muito tempo. Com o passar do tempo vamo-nos apercebendo que ninguém quer saber disso e todos nos damos muito bem. Isso é essencial”, garantiu Tiago Oliveira.
Outra das características da comunidade skater vimaranense é que a rivalidade fica “à porta”. “Se alguém vier aqui fazer uma manobra que eu já estou a tentar fazer há um mês, eu fico muito feliz por ele”, referiu. Prestes a completar 23 anos, acrescenta que tem “pena de não ter começado mais cedo”.

Destacando a união e companheirismo entre o núcleo de skaters, garante que a modalidade lhe trouxe amizades para a vida. “Há pessoas que me dou muito bem e que nunca teria conhecido senão fosse pelo skate. Quando comecei, pelos meus 20 anos, pensava que nunca mais iria fazer amizade com miúdos. Alguns deles são dez anos mais novos que eu. Trocamos mensagens quase diariamente e temos grandes amizades”, confessou.
E porque o skate é aventura, já foram em grupo explorar outras cidades do país. São jovens e querem novos desafios, novos obstáculos, mas também mais oportunidades.
“Uns trabalham, outros estudam, e a organização nem sempre é fácil. Já fomos todos em tour e ficamos a dormir em acampamentos, mas também vamos treinar para as cidades vizinhas”.
Também Tiago Oliveira aponta algumas falhas ao skate park da sua cidade. “Acho que devia estar num sítio mais apelativo, até porque pode haver pais que não deixem os seus filhos vir para aqui à noite”, começa por dizer, explicando que, como nesta fase do ano se faz noite mais cedo, isso pode significar menos tempo de treino. Ainda assim, garante que sempre se sentiu seguro no local, uma vez que está na sua cidade e diz conhecer “todos os que cá param”.
O skater enaltece ainda a necessidade de um novo parque, uma vez que este tem “problemas estruturais que não são possíveis de resolver” e não há muitas oportunidades para se “ser criativo”. O novo equipamento poderia também servir para “distribuir os praticantes aos fins de semana, quando a afluência é maior”.
Praticando a modalidade por lazer e não com objetivo profissional, destaca que se inspira mais nos seus colegas skaters do que “nos grandes nomes nacionais e internacionais”. “Vi-o a começar, a evoluir. Quando ele começou eu já sabia fazer algumas coisas. Hoje em dia, provavelmente, há manobras que ele já consegue fazer e eu não”, confessou, apontando para Francisco Tomás.
Confidenciou-nos que para conseguir a sua primeira manobra – um ollie – foram necessárias muitas horas de treino e algumas nódoas negras. E esse foi o mote para o seu apelo aos jovens praticantes: “Não desistam!”.
“Já o conhecia da escola, mas foi aqui que criamos amizade“
Foi através de uma prenda de Natal dos seus pais, há quase dois anos, que Francisco Tomás descobriu a sua nova modalidade favorita. “Não diria um skate profissional, mas já era um skate bastante bom”, o que fez com que investisse um pouco mais de tempo na modalidade, que também já tinha sido praticada por outros membros da família.

“Os meus pais sempre me apoiaram em tudo o que eu faço. Trazem-me aqui ao skate park várias vezes por semana, apesar de não morarmos muito perto”, adiantou.
Logo de seguida fala-nos de Ricardo que, assim que ouve o seu nome, se junta à conversa (de skate, claro!).
“Conheci-o por causa do skate. A verdade é que eu nem gostava dele. Já o conhecia da escola, mas foi aqui que criamos amizade”, contou, lembrando o skater Rodrigo Nunes, que faleceu em agosto deste ano. “Ele ajudava-nos muito aqui no parque e era sempre a nossa companhia”, acrescentou.
Também Ricardo confessou que não simpatizava muito com Francisco, mas desde há meio ano que se tornaram inseparáveis. “É a mesma coisa que se passava com o Rodrigo. Ele ajudava-nos em muitas coisas e, apesar de tudo, vai estar sempre connosco”, acrescentou.
“É um sonho ser profissional, mas sabemos que é complicado em Portugal. Até o nosso melhor skater, o Gustavo Ribeiro, fica mais vezes lá fora do que cá, até porque é onde se realizam os melhores torneios”, exemplificou Francisco.
Salvaguardando que “ainda é muito cedo” porque só pratica a modalidade há dez meses, também Ricardo partilha do mesmo sonho. Ambos anseiam pela primeira participação numa competição, mas, antes disso, ainda há muita evolução a ser feita.
“Eu tive uma evolução muito lenta. Demorei seis meses até aprender o meu primeiro truque, o que não é muito normal porque há quem o faça em apenas uma semana”, realçou, acrescentando que a persistência que a modalidade requere o vai ajudar em desafios futuros.
“Como em tudo na vida, as coisas não acontecem no imediato. É preciso ter paciência”. Classificando o skate como “uma arte”, é no skate park que ambos encontram um refúgio para “fugir dos problemas” e “refrescar a cabeça”.

“A meta a longo prazo passa pela criação de um novo skate park, mas ainda estamos numa fase de intenção”
Nelson Felgueiras, vereador do Desporto na Câmara Municipal de Guimarães, reconhece que houve um grande crescimento da comunidade skater em Guimarães.
“Quando o skate park nasceu, em Guimarães, foi para criar um público e isso, felizmente, tem vindo a acontecer. Naturalmente a exigência sobe”, revelou à Mais Guimarães, garantindo que tem estado em “constante diálogo com os skaters”.
O vereador admite ainda que “uma das questões que tem chegado mais frequentemente prende-se precisamente com a limpeza do espaço, sobretudo nesta época de outono, em que começa a haver muita folhagem”. Para o evitar, foi solicitado aos serviços urbanos de limpeza que fizessem uma passagem mais regular naquele espaço, de forma a que a limpeza “seja diária, ou, pelo menos, de dois em dois dias, no máximo”.
Relativamente à sugestão dada pelos atletas acerca da criação de uma infraestrutura onde possam armazenar alguns utensílios de limpeza, Nelson Felgueiras confirmou que “essa solução será criada” e que “se trata apenas de uma questão de tempo”.
A par disso, está ainda a ser equacionada a criação de um pequeno muro que evite a escoagem de água e terra cada vez que há chuvas mais intensas com regularidade. “Há situações que não controlamos, mas estamos prontos a resolver as situações que surjam”, assegurou.
Aquilo que os skaters realmente ambicionam é a criação de uma nova infraestrutura, desejo esse que também é partilhado pela Câmara Municipal.
Apesar de “a meta a longo prazo passar pela criação de um novo skate park, ainda estamos numa fase de intenção”, afirmou, acautelando que “não há projeto, não há local, nem verba alocada”.
O vereador enalteceu ainda a necessidade de, com as condições existentes, tentar trazer para Guimarães alguns eventos e torneios da modalidade, de forma a “fundamentar a necessidade de investimento num novo equipamento”.