AVE sobre nova lei dos solos: “É de legalidade duvidosa, sem fiscalização”
José Cunha, da AVE – Associação Vimaranense para a Ecologia, diz que a alteração à lei dos solos não está clara em determinados pontos. Critica a falta de fiscalização que irá existir, caso o diploma seja aprovado no Parlamento, fala em legalidade duvidosa, com risco de casos corruptivos.

Como é que a AVE- Associação Vimaranense para a Ecologia olha para esta alteração à Lei dos Solos?
Existe uma série de associações ambientais que vão lutar contra, incluindo a AVE, dependendo do que vier aí, mas, da forma que está, é indiscutivelmente uma lei que vai ter danos agravados no ambiente. E é nessa perspetiva, e outras apontadas por outras ordens profissionais, seja dos arquitetos paisagistas, dos urbanistas, não há ninguém que esteja contente, a não ser os promotores de imobiliários.
O que não está aceitável nesta alteração?
Abre a discricionariedade dos municípios transformarem solo rústico em solo urbano. O que leva a que seja permitido ou potenciado o tráfico de influências, corrupção, e que essa transformação não tenha como interesse o bem comum. Conhecendo como conheço a ânsia dos municípios, não só Guimarães, em transformar solo rústico em urbano, e as pressões que eles fazem junto das CCDRN, acho que vai ser desastroso.
Teme que haja um descontrolo na aplicação da nova lei?
O que está na lei é que o solo rústico só deve ser transformado em solo urbano de forma muito excecional. E, ao permitir que os municípios o façam sem obter a aprovação de outras entidades, como a RAN ou a CCDR N, fica tudo na mão deles. Tudo bem que a proposta deve passar pela Assembleia Municipal, mas toda a gente sabe que será aprovada.
Ao nível local qual o impacto da reestruturação da lei?
A AVE está a tentar ver o que pode fazer em relação a uma série de contratos de planeamento que foram tornados públicos e que agora se encaminham. Essa forma dos planos de pormenor com efeitos registrais é um dos métodos previstos na lei para transformar solo rústico em solo urbano e que devia ser feito de forma muito excecional.
Esta alteração à lei agora, para além de criar um mecanismo especial para o solo, para a construção da habitação, também retira uma série de requisitos que davam essa consistência à parte do excecional, que tinha que ser demonstrado que não havia solos disponíveis para o mesmo efeito e que tinha que ser feita uma apreciação da viabilidade financeira. Tudo isso, nesta alteração também caiu. Tínhamos a expectativa de que, através dessa demonstração, iria ser muito difícil para a Câmara mostrar que não há terrenos disponíveis naquelas áreas para aqueles efeitos. Caindo esse requisito, será mais difícil tentar combater essa transformação e essa desorganização que, no nosso entender, esses contratos de planeamento vão trazer.
Mas ao nível de biodiversidade e da agricultura, até porque estamos numa região onde o setor primeiro ainda é forte, também haverá impacto negativo?
Sim. Em Guimarães, não só através deste novo regime simplificado, mas também pelos contratos de planeamento e os planos permanentes, também há uma grande transformação e ocupação de solo agrícola em solo para uso habitacional ou uso de indústria.
O presidente da Câmara tem anunciado, desde há muito, que esta alteração do PDM queria criar cerca de mais de 500 hectares em solo que não estava como urbano ou urbanizável e que o ia transformar em urbano. Boa parte dele será à custa de solo agrícola. Por exemplo, estes 13 contratos de planeamento têm 185 hectares de solo RAN – Reserva Agrícola Nacional que irão ser transformados em solo urbano. Portanto, é lógico que isto tenha impacto. As associações ao nível nacional também têm referido que é uma forma dos municípios ocuparem terrenos agrícolas com construção, porque geralmente é o terreno que está mais barato e mais à mão.
Como perspetiva o futuro, caso a lei seja aprovada?
Há municípios em que os presidentes vão achar que é uma loucura fazer isto, outros que não. Tem muito a ver com a cultura do ordenamento do território de cada município, de cada presidente, de quem gere o ordenamento do território ao nível local. E depois, as pressões a que vão estar sujeitos para construir.
Depois será muito difícil recusar alguns pedidos. Não estou a dizer que haja corrupção, mas… O que vai acontecer é a pressão dos municípios para o fazerem, mesmo sabendo que, se calhar, isso não é o mais benéfico em termos de sustentabilidade de infraestruturas no futuro.
Isto depois não vai ser fiscalizado ou não vai ser tutelado pela CCDR N nem pela RAN, é a grande falha de todo este sistema. Ninguém vê se está coerente com a política ao nível mais macro. Cada paróquia vai fazer o que quer e o que não quer. Depois alguém há de vir e fechar a porta. Outra coisa que é perversa é que os municípios decidem o que se vai transformar e o que não vai. Uma boa parte da receita dos municípios, é feita à custa de taxas e licenças de construção. É de legalidade duvidosa. Há algumas associações que depois de ser conhecida a versão final, vão estudar se é possível contestá-la por inconstitucionalidade ou por outra coisa qualquer.

© CMG
O que está em causa?
O novo diploma introduz uma possibilidade para o ordenamento do território: a reclassificação de terrenos rústicos como urbanos. No entanto, para que isso aconteça, pelo menos 70% (ou seja, 700 metros quadrados por cada 1000 metros quadrados) da área total de construção acima do solo deve ser destinada a habitação pública ou a habitação com “valor moderado”. O conceito de “valor moderado” é uma tentativa de tornar as habitações mais acessíveis. Este valor é determinado com base no preço por metro quadrado da construção, que não pode ser superior à mediana do preço de venda nacional ou se superior, 125% da mediana do preço de venda praticado no concelho onde o terreno se encontra.
Ou seja, esta medida visa garantir que a requalificação de terrenos rústicos seja voltada, essencialmente, para soluções habitacionais acessíveis. No entanto, a sua eficácia dependerá da realidade do mercado imobiliário em cada região, uma vez que os preços médios variam significativamente entre diferentes zonas do país. Assim, em áreas metropolitanas com preços elevados, o impacto na redução dos valores pode ser limitado, enquanto em zonas de menor procura pode ter um efeito mais significativo. A responsabilidade pela decisão de reclassificar um terreno recai sobre a Assembleia Municipal, que deverá tomar a decisão com base numa proposta da Câmara Municipal local.
O decreto simplifica esse processo ao dispensar a necessidade de aprovação por entidades superiores, como a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). Embora essa medida torne a conversão de terrenos mais rápida e menos burocrática, também levanta preocupações quanto à transparência e à possível influência de interesses privados nas decisões municipais. Essa flexibilização pode facilitar o desenvolvimento habitacional, mas exige um acompanhamento rigoroso para evitar usos indevidos e especulação imobiliária.
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