Habitação, redes sociais e estado da democracia marcam discursos solenes do 25 de Abril

O Teatro Jordão serviu de palco para as comemorações dos 51 anos da Revolução dos Cravos. O grupo B-Jazz Choir interpretou o Hino de Guimarães, Grândola Vila Morena, de Zeca Afonso, e o Hino de Portugal.

© Helena Lopes/Mais Guimarães

O estado da liberdade, a forma como é encarada nos dias de hoje e a importância de a preservar para que não esteja em causa no futuro, perante ameaças que surgem. Todos unânimes nesta linha de pensamento, nos discursos dos representantes dos partidos com assento na Assembleia Municipal de Guimarães, que assinalou o 25 de Abril numa sessão solene que teve como palco o Teatro Jordão.

A cerimónia contou com intervenções de José João Torrinha, presidente da Assembleia Municipal, José Bastos (PS), Natália Ribeiro (PSD), José Eduardo Dias (CDS-PP), Inês Rodrigues (CDU), Nuno Vaz Monteiro (Chega), Maria Francisca Sousa (BE) e Gil Leitão (IL).

“Atrás dos teclados, por entre postos de tiktoks, campeiam os tudólogos que tudo julgam saber, que do nada sacam certezas absolutas”, José João Torrinha

José João Torrinha, teve um discurso marcante, abordou a ideologia sendo hoje uma palavra criticada, e referiu também que é necessário ir além da condição dos iludidos, que pensam saber tudo”. Mas disse mais: “O mundo das redes sociais contribuiu decisivamente para um estado de coisas em que cada um, entreencheirado nas suas ideias, nunca pensa duas vezes no acerto das mesmas. Pelo contrário, vê o dissenso como uma agressão”. “Daí à tal polarização carregada de fel é um passo. A ignorância passou a ser o estado que define o outro, nunca ao meu próprio. A assunção de que não se sabe tudo sobre um determinado tema e se procura a mediação de quem sobre os assuntos se debruçou aturadamente passou a ser vista não como um estado que conduz à aprendizagem, mas como uma fraqueza”.

Disse que  “vivemos tempos, por isso, que já se apelidaram de ignorância agressiva”.Apesar de eu não saber, estou convencido que sei tudo. E quem é o outro que não pesca nada disto? Atrás dos teclados, por entre postos de tiktoks, campeiam os tudólogos que tudo julgam saber, que do nada sacam certezas absolutas, que disparam sentenças, tantas vezes com base em percepções ou memes da internet, que destilam o ódio pela ponta dos dedos”.

José João Torrinha não tem dúvidas de que “tudo isto é corrosivo para a democracia, pois quer-se a vida do combate e troca de ideias e não de uma interminável guerra das trincheiras”.

“A todos os democratas e antifascistas rendemos a nossa sentida homenagem”, Inês Rodrigues, CDU

Uma das frases proferidas por Inês Rodrigues, representante da CDU, que lembrou o papel de “relevo do poder local democrático”. Esse poder local que expressa e assegura o direito do povo de decidir sobre os problemas das suas terras e o seu desenvolvimento”, disse ainda.

A terminar, referiu que “o que a vida cada vez mais mostra é que não basta mudar de governo, é mesmo preciso derrotar uma política que, independentemente de quem a realize, não serve e não pode continuar, é negativa pelo que fez e pelo que ambiciona fazer”, afirmou a poucos dias das Legislativas e a poucos meses das Autárquicas.

Entende Inês Rodrigues que “este é um momento de comemoração, mas é também um tempo de opções”: “De opções por Abril, pelos seus valores. Tempo de criar condições para a afirmação e construção de uma verdadeira alternativa à política de direita na vida nacional. Uma verdadeira alternativa vinculada aos valores e ideais de Abril, valores que permanecem válidos e actuais como são: os valores da liberdade”.

“É importante olhar para o futuro, refletir sobre novos rumos e objetivos”, Nuno Vaz Monteiro, Chega

Recuou no tempo para lembrar o histórico de conquistas da cidade berço, descrevendo o povo como lutador, “que não ficou ancorado no passado” e “com o passar dos séculos, a cidade soube reinventar-se”.

Hoje, Guimarães é uma cidade que honra o seu passado. É uma cidade de cultura, de juventude, de inovação, onde o passado e o presente se encontram nas ruas de calçada, nos edifícios seculares, nos murais contemporâneos, nos centros de investigação e nas vozes da sua gente. Por isso, é importante olhar para o futuro, refletir sobre novos rumos e objetivos”, disse Nuno Vaz Monteiro.

“Precisamos de Guimarães com vida, com alegria e dinamismo, diria que com o fervor de outros tempos”, referiu ainda o deputado do Chega.

“Estamos hoje aqui para renovar o compromisso com futuro”, Gil Leitão, Iniciativa Liberal

Foi a Iniciativa Liberal a abrir os discursos com Gil Leitão a considerar que hoje, não é celebrado apenas um dia, mas sim “um grito que ecoou há 51 anos, feito de cravos, coragem e convicção”. O representante da IL, disse ainda que as celebrações hoje não servem “para repetir o passado, mas sim renovar o compromisso com o futuro”: “Os valores de Abril não vivem nas paredes dos Parlamentos, vivem no respeito que temos uns pelos outros, vivem no diálogo entre vizinhos, gerações e ideias”.

No entanto, chamou ao discurso a honestidade para dizer que tem havido “erosão de todos esses valores”: “Temos assistido à polarização, à desconfiança e à fragmentação, aos crescimento de muros, quando Abril que nos ensinou a construir pontes”. E falou em democracia para dizer que esta “não significa votar de quatro em quatro anos”: “É participar, estar presente, exigir com responsabilidade e servir com humildade”.

“Passou a ser possível sonhar com um país justo e igualitário” Maria Francisca Rodrigues, Bloco de Esquerda

A jovem bloquista incluiu no seu discurso a realidade vivida antes do 25 de Abril, para abordar depois as conquistas com a liberdade, como o Serviço Nacional de Saúde e a escola pública para todos, conquistas também abordadas pelos outros intervenientes. Disse ainda a bloquista que “Abril abriu portas e que “passou a ser possível sonhar com um país justo e igualitário”.

No entanto, 51 anos depois de todas as conquistas, “Portugal hoje enfrenta lutas”: “Entre elas, no país e na nossa cidade, uma grave crise habitacional, o direito à habitação já não pode ser assegurado (…) a habitação digna carece de soluções. Nasce a nova realidade do ser humano que trabalha, mas sem rendimentos para suportar uma casa, que muitas vezes vai para as ruas”.

“Hoje não é possível fazer pontes e confiar nos inimigos, enquanto desconfiamos até dos nossos aliados”, José Eduardo Dias, CDS/PP

Para o representante do CDS/PP, celebrar os 51 anos da Revolução de Abril “é um enorme feito”: “Porque é impossível ignorar a situação atual e o mundo em que  vivemos, cada vez menos podemos cantar os feitos de um mundo livre e próspero”. “Hoje não é possível fazer pontes e confiar nos inimigos, enquanto desconfiamos até dos nossos aliados”, acrescentou.

Mas, por outro lado, considera que “há sempre uma candeia dentro da próxima desgraça e Portugal é, desde há 51 anos, essa candeia luminosa para o mundo”. Referiu que é importante “não criar ilusões”, o 25 de Abril “foi um movimento militar “que triunfa pela enorme adesão popular, o 25 de Abril está cumprido”. “A partir do 25 de Abril de 74 tudo é responsabilidade nossa, de eleitores e de eleitos”. E abordou o 25 de novembro: “A comemoração da data na Assembleia da República de 2024, foi apenas um ato de justiça”.

“A democracia que Abril trouxe é de construção permanente”, Natália Ribeiro, PSD

Depois de abordar o caminho da democracia, desde 74, Natália Ribeiro abordou o papel do PSD na história política do país: “Ao longo destes 51 anos fomos chamados nos momentos mais críticos da democracia, recorde-se que foi o PSD que resgatou por três vezes Portugal da banca rota, somos talhados para resolver os problemas do país quando outros o criam”.

Deu conta que, para o PSD, “a democracia que Abril trouxe é de construção permanente, nunca está acabada ou perfeita terá de se reconstruir se for necessário e aperfeiçoar se for amordaçada”. Lembrou os emigrantes portugueses que desertaram por não verem futuro no país, “o 25 de Abril veio-nos dar esperança de futuro para todos os que escolheram, em liberdade, o país para viverem”.

“Quem tenta apagar a pluralidade trai o espírito de Abril”, José Bastos, PS 

O representante do PS usou por diversas vezes poesia de Ary dos Santos na sua intervenção, no Teatro Jordão. “As portas que se abriram há 51 anos, abriram-se para o povo — para o poder do povo, com o povo e ao serviço do povo. E não há melhor lugar para reafirmar isto do que uma Assembleia Municipal”, referiu. O poder local não foi esquecido por José Bastos: “Foi através do poder autárquico que Abril chegou a todos os lugares. Foi nas freguesias, nas aldeias, nos bairros, que a liberdade deixou de ser palavra e passou a ser prática. E será também pelas mãos do poder local que venceremos os desafios que ainda temos pela frente”.

E não esqueceu o populismo: “Hoje, o populismo cresce onde falta confiança. Alimenta-se da frustração, do medo e da mentira. Mas a resposta nunca pode ser a conivência. Tenta restaurar uma ideia única de povo, de nação, de pertença. Mas não há um “nós” verdadeiro que exclua os “outros”. Quem tenta apagar a pluralidade trai o espírito de Abril”.

E continuou: “A democracia não sobrevive à mentira. A liberdade não se constrói sobre o engano. O populismo floresce onde a verdade é descartável. E é nesta hora que temos de escolher: entre o conforto da manipulação e a exigência da verdade”.

 

 

 

 

 

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