Motor Clube de Guimarães: Uma paixão que move multidões
Criado por "um grupo de pessoas adeptas do desporto automóvel" há 36 anos, o Motor Clube de Guimarães é o principal clube de desporto motorizado na cidade berço e trabalha para promover eventos desportivos motorizados na região.
Depois de um período de dedicação às provas de todo-o-terreno, raid’s e rampas, a estrutura desportiva vimaranense foca-se atualmente na organização de ralis, super-especiais e perícias, sendo responsável pelo Rally Vieira do Minho, Vizela Motor Festival e Guimarães Motor Revival.
Atualmente presidido por Emanuel Moreira, o clube tem como objetivo dinamizar o Guimarães Motor Revival, tentar fazer regressar o Rally Cidade de Guimarães e reavivar o Transvimaranes. Acima de tudo, pretende “fortalecer os laços com a nossa terra e a nossa
gente”.
A Mais Guimarães conversou com o presidente do Motor Clube de Guimarães para conhecer melhor o seu projeto no desporto automóvel.
O que encontrou o clube para nascer e crescer em Guimarães?
O Motor Clube de Guimarães nasceu em 1988, fruto de uma série de pessoas adeptas do desporto automóvel, e realmente havia uma
carência na nossa região, porque não existiam clubes federados ligados ao desporto motorizado. Surgiu, então, a necessidade de criar um clube que começasse a promover algum tipo de atividade ligada a este setor. No seu início, o Motor Clube de Guimarães dedicou-se muito à promoção e difusão de provas de todo-o-terreno e raid´s, com veículos de duas e quatro rodas.
Posteriormente, pelo tamanho que estava a alcançar com os seus passeios e raid´s, o clube deu o próximo passo e decidiu federar- -se para fazer provas com a chancela da Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting (FPAK). A partir daí, o clube fez um trajeto muito ligado ao todo-o-terreno, rampas e ralis, e nos últimos anos está mais focado nos ralis e super-especiais.
Qual o salto que o clube deu ao federar-se?
O que uma mera associação amadora pode fazer são atividades de cariz lúdico, como passeios e encontros de clássicos. Não pode realizar provas oficiais que estejam presentes no calendário nacional. Ao estarmos licenciados na federação, a partir de 1994, temos um alvará que nos permite realizar provas em espaços públicos, porque este tipo de eventos carecem de documentos e de licenças municipais e só um clube federado pode requerer os mesmos. Todos os restantes clubes amadores que gostem de automobilismo não podem realizar provas federadas.
A partir desse momento houve uma maior responsabilidade para a estrutura?
Sim, claro. O clube, a partir dessa altura, começou a fazer provas que passaram a integrar o campeonato nacional. Depois há muitos encargos que o clube tem de cumprir, o que requer um maior dinamismo e profissionalismo por parte dos órgãos sociais.
“O nosso objetivo a médio prazo é voltarmos a ter uma prova de todo-o-terreno”
Referiu que o Motor Clube de Guimarães foca-se agora mais nos ralis. Porquê?
O desporto motorizado é muito amplo e tem várias modalidades mas o clube, por opção estratégica da anterior direção, direcionou- -se para os rallys devido a alguns problemas que encontraram. O primeiro problema está associado aos custos elevados que se prendem com questões de segurança, como policiamento e bombeiros. E estamos a falar de uma prova de todo-o-terreno com cerca de 300 quilómetros. Colocar um dispositivo com essa distância tem custos enormes, e isso leva-nos ao segundo problema: O grande número de voluntários e staff.
Atualmente, não é fácil angariar voluntários nas gerações mais novas. Para fazer uma prova destas, 100 pessoas não chegam. Nos ralis são preciso menos, e foi um pouco por esse caminho. Hoje continuamos porque temos tido sucesso, e porque existem acordos com as câmaras que querem esse tipo de provas. E se tem funcionado, vamos continuar a apostar.
Sobre outras modalidades, na zona Norte é muito difícil organizar provas de velocidade. Tínhamos o circuito de Braga, mas perdeu o seu licenciamento e vive hoje uma instabilidade por questões legais entre os proprietários. Então, mesmo que tivéssemos a ambição de fazer provas de velocidade não poderíamos, porque só existem o circuito do Estoril e de Portimão.
Gostaríamos muito de voltar a organizar provas de todo-o-terreno, mas atualmente só há uma prova no Norte. Teríamos todo o gosto em ter uma nova prova cá em cima, mas é preciso que o clube continue a crescer e tenha mais voluntários, porque dá muito trabalho. O nosso objetivo a médio prazo é voltarmos a ter uma prova de todo-o-terreno.
Atualmente fazemos também as perícias, prova que até foi inserida no Guimarães Motor Revival, e que pertence ao Campeonato de
Portugal.
O clube esteve adormecido por uns tempos e voltou a “renascer” recentemente. O que aconteceu nesse período?
Entre 1994 e até 2014, o clube viveu um momento muito próspero com as provas do Campeonato Nacional de todo-o-terreno e com a Rampa da Penha, e outras rampas do campeonato nacional. Depois a Rampa da Penha passou para a mão de outro clube. E, como disse há pouco, o clube foi deixando de fazer provas de todo-o-terreno porque são dispendiosas e os clubes precisam de apoio dos municípios. Então começou a abrandar e teve o infortúnio de em 2014 realizar uma prova em Guimarães que teve um acidente com vítimas mortais.
O clube foi arrastado para um injusto processo judicial, que desgastou muito quem estava cá. Todos Fazemos isto por gosto, mas quando as coisas acontecem, isso causa um impacto tremendo na vida pessoal de cada um. Enquanto geria todo o processo, o clube passou a fazer eventos mais pequenos e dava apoio a outros clubes nos seus eventos.
“A Rampa da Penha não pode ser vista como um evento que está à parte da cidade”
Em 2016, começou a fazer o Rallly de Vieira do Minho e o processo de renovação deu-se no final de 2017, quando fui convidado para vir para o clube e, juntamente com outros colegas, mostramos vontade de relançar a estrutura. A partir desse momento, o clube voltou a ficar mais dinâmico, realizando novos eventos como o Vizela Motor Festival, por exemplo, que tinha existido em tempos mas com um
formato mais simples.
O Rally Vieira do Minho foi reforçado e felizmente em 2023 concretizamos um dos nossos objetivos, que era voltar a fazer uma prova em Guimarães com o Motor Revival. Conseguimos isso também fruto do trabalho e visão do atual vereador do Desporto, Dr. Nélson Felgueiras, que nos tem ajudado muito. Agora é nossa ambição manter tudo o que temos e crescer na vertente desportiva, mas também pretendemos que o evento alcance uma parte lúdica e social, como a aposta numa zona de alimentação, festa e entre outras coisas para prender as pessoas na cidade durante vários dias.
O ideal era fazer isso no centro da cidade. Este tipo de eventos está a ser bem difundido noutras terras, como em Penafiel, que em três dias tem cerca de 100 mil pessoas. É um evento que não pára, com exposições, festas, música e desporto. No centro de Guimarães seria muito difícil, porque não temos espaço para o que queremos. O espaço que combinaria melhor seria o Multiusos de Guimarães e a
área envolvente.
Esse evento seria benéfico, além do clube, para a cidade?
Essa é a nossa principal preocupação. Para nós, as relações entre entidades só fazem sentido numa visão onde todos ganham. E o nosso parceiro ganha se for um evento bem conseguido, em segurança, e com retorno. O desporto automóvel é a segunda modalidade que mais consegue ter retorno direto e indireto. Se fizéssemos isso no Guimarães Motor Revival, ou se conseguíssemos voltar com o Rally Cidade de Guimarães, o que gostaríamos muito, poderíamos colocar em Guimarães milhares de pessoas, a dormir e comer aqui, durante vários dias.
Mesmo o futebol não consegue fixar aqui durante tantos dias essas pessoas. No automobilismo, cada carro traz duas pessoas, as equipas trazem mecânicos e ainda têm as famílias e amigos, juntando todos os adeptos. Então estamos a falar de muitas pessoas aqui a dormir e a comer, dando um imenso retorno direto.
Além da Rampa da Penha, Guimarães precisava de mais eventos com continuidade assegurada?
Sim, Guimarães precisa, nós queremos e os pilotos também querem, porque gostam da Rampa da Penha, que esperemos que permaneça muitos mais anos. Mas existe muito potencial que não é aproveitado. A Rampa vive do esforço da Irmandade da Penha, na pessoa do Dr. Roriz Mendes, e é necessário um intercâmbio maior entre o município e a irmandade. Acredito que um dia a rampa pode voltar a casa, e sinto que o nosso papel é puxar o município, para que veja a prova como um evento que prenda na cidade várias pessoas, e isso tem um grande potencial a explorar.
A Rampa da Penha não pode ser vista como um evento que está à parte da cidade. Está na Penha e vão lá algumas pessoas que gostam de automobilismo. Sinto que devia ser uma festa da cidade toda. Guimarães tem uma particularidade por ser grande e por ter uma agenda cultural enorme, mas não tem eventos que tragam tanta gente como a Rampa da Penha se for bem potenciada, e é esse trabalho que podia ser bem explorado. Os carros têm que vir à cidade, até um parque central para uma exposição e um contacto entre o público e os pilotos, seguida por um desfile no centro. Temos que fazer este trabalho.
“No Norte e no Minho existem, talvez, muitos dos adeptos mais fervorosos do país”
Todos os outros eventos têm de ser pensados desta forma: Haver uma vertente desportiva, mas também lúdica, para ser da cidade e não estar deslocado. Temos que envolver toda a gente, porque as pessoas gostam mesmo muito de automobilismo.
O facto da cidade de Guimarães e da região do Minho não terem muitos espaços adequados para essas provas tem impacto na não realização das competições?
Sem dúvida que é um handicap muito grande. É quase paradoxal. No Norte e no Minho existem, talvez, muitos dos adeptos mais fervorosos do país, sem estar a comparar nem criar guerras fúteis. Em Guimarães, Fafe, Braga e nas terras de Basto existe muita gente apaixonada por automobilismo. Mas aqui nunca se trabalhou para termos infraestrutras para apoiar o desporto automóvel.
O que existe é natural, que são as PECs de terra, e estradas para se fazer rallys de asfalto. Há, por exemplo, uma carência grande de kartódromos. Temos mais perto o de Fafe mas não está adequado para ter um campeonato nacional. Guimarães nunca teve e Braga tem problemas legais. Depois há circuito de rallycross em Lousada e Montalegre, e pouco mais.
Aqui, realmente, existe uma carência de infraestruturas que nos permitissem apostar em formação, porque também temos de criar o gosto e vício pela modalidade desde cedo nas pessoas, indo às escolas e levando experiências às crianças. É um pouco esse caminho que temos que percorrer na nossa região.
De que forma o Motor Clube de Guimarães tenta promover o desporto motorizado às crianças e jovens?
Este é um tema muito importante e que não é fácil. Se quisermos praticar futebol, vamos a uma das lojas que vendem material desportivo e compramos o material por 20 ou 30 euros. Depois podemos jogar num ringue, pavilhão ou campo. Se quiser fazer ciclismo, compro uma bicicleta por 200 ou 300 euros e faço na via pública ou nas ciclovias.
“Sinto que há um trabalho que tem de ser feito pela federação, que tem de olhar para a formação de uma forma diferente”
No desporto automóvel, isto não existe. Tudo exige um esforço financeiro enorme. O karting, que é a iniciação, não é barato. Um kart usado custa por volta dos mil euros, mais o equipamento de segurança. E depois temos de ir para Fafe, porque Guimarães não tem kartódromo. Não é fácil começar no desporto automóvel.
Sinto que há um trabalho que tem de ser feito pela federação, que tem de olhar para a formação de uma forma diferente. Temos de falar com os municípios para tentar criar umas pistas em terra, com buggys para as crianças aprenderem e gostarem do desporto. De momento, era interessante juntarmos o Motor Clube de Guimarães, o município e os agrupamentos de escolas para fazermos algum trabalho de consciencialização rodoviária. Podemos ir aos estabelecimentos com material didático e carros a pedais e simular trajetos, por exemplo, ao mesmo tempo que falamos e lançamos as bases sobre o desporto automóvel.
Desta forma, tínhamos o papel cívico de incutir bons hábitos e começar o “bichinho” pelo desporto. E porque não falar com as escolas quando houver a Rampa da Penha para os alunos irem visitar? Ou criar um horário para contactar com os pilotos? É com este tipo de ações que se começa essa paixão. Sinto que, com isso, estamos mais perto de atrair mais pessoas para o nosso desporto.
As ações que temos atualmente são nos nossos eventos, como o Rally de Vieira do Minho ou em Vizela e tentamos que a população interaja com a prova e com os pilotos. Os nossos parques de assistência são abertos e tentamos que os carros passem pelo centro da cidade. É das poucas coisas que podemos fazer para nos aproximar das populações. Mas há mais por onde explorar.
Quais são os eventos que o clube organiza? É uma estrutura de Guimarães mas organiza provas além desta zona…
O Motor Clube de Guimarães, entre 2014 e 2023, só fazia provas fora da cidade e isso causava-nos alguma mágoa. Não conseguimos fazer na cidade na altura e desde que o Dr. Nélson Felgueiras ficou com o pelouro do Desporto, as vias de comunicação ficaram mais facilitadas e conseguimos mostrar os nossos planos para ajudar o desporto. Felizmente, tudo evoluiu. O clube tem novamente um evento em Guimarães e esse foi o primeiro passo. Agora temos de o fazer crescer.
“Gostava de profissionalizar o clube, que é um caminho que tem de ser feito em Portugal”
Além disso, fazemos o Rally de Vieira do Minho desde 2016, feito na Serra da Cabreira, que faz parte do Calendário Nacional (campeonato Promo), fruto de uma excelente parceria com o município. Temos o Vizela Motor Festival, que já ganhou o seu espaço e está enraizado nas preferências dos praticantes, e que este ano terá mais uma excelente edição.
Temos uma abrangência geográfica grande, mas é preciso saber gerir com cautela, porque não é fácil construir uma equipa para trabalhar de forma amadora neste desporto. Isto é um hobby para nós, só conseguimos angariar para as despesas, e temos de ter cuidado para não saturar a equipa. O Rally de Vieira do Minho será feito em abril de 2025 e já estamos a trabalhar nele. Vizela será no final de setembro e está quase tudo pronto desde maio. O Motor Revival, feito em julho, começou a ser feito em janeiro. É um processo que exige muito de nós.
Para 2025, queremos apostar forte no Guimarães Motor Revival, para dar um passo em frente e para se assumir como um evento de destaque.
O município de Guimarães tem como objetivo atingir a neutralidade climática até 2030. Há, de alguma forma, incompatibilidade entre as ambições do Motor Clube de Guimarães e da Câmara Municipal nesse âmbito?
Não, não há incompatibilidade por várias razões. Em primeiro lugar, a poluição atual feita pelo desporto automóvel é uma percentagem muito baixa, estaríamos a falar de muito menos que 1%. Não tem impacto. Qualquer autocarro que circule aqui num dia faz mais poluição que um rally inteiro.
Ainda assim, o desporto motorizado, a FPAK e os clubes perceberam que tinham de traçar um caminho e que não poderiam continuar a fazer de conta que não existem problemas ao nível do clima. Então, em todas as provas que realizam têm que ter um plano ambiental, com recolha de lixo, separação de resíduos e um trabalho de consciencialização. Com as viaturas por exemplo, tentamos poupar ao máximo as deslocações para evitar emissões desnecessárias.
E há uma parte importante: Atualmente, no Campeonato Nacional, já temos os veículos a correr com gasolina 100% ecológica, em que a emissão é quase nula. Tem-se feito um caminho de neutralização carbónica para o desporto automóvel e o Motor Clube de Guimarães abraçou esse projeto desde o primeiro dia. Com as ações que a FPAK tem feito juntamente com os clubes, quando chegarmos a 2025 a balança ecológica está a zero, porque o que estamos a dar sobrepõem-se ao que é retirado. Por exemplo, no Rally Vieira do Minho, o Motor Clube de Guimarães realizou uma reflorestação, juntamente com o município, de cerca de 340 árvores na Serra da Cabreira. Agora trabalhamos para que essas árvores cresçam e para que vinguem. Se assim for, superamos em muito aquilo que tiramos com a prova.
Em Guimarães, sendo candidata a Capital Verde Europeia, estamos dispostos a tudo para fazer esse mesmo equilíbrio no que diz respeito ao desporto automóvel. Além disso, temos um projeto interessante, que seria trazer para a cidade um Rally de viaturas elétricas. É um campeonato recente, que vai na segunda edição, e é uma das provas que queríamos promover. Queríamos trazer esse rally para Guimarães já este ano sem pertencer ao Campeonato Nacional, para que no próximo faça parte do mesmo.
Teríamos o evento centrado em Guimarães, mas por vários fatores, como o número de quilómetros e a despesa monetária, precisamos de mais parceiros. Se conseguirmos puxar outros municípios para este evento, a fatura final será dividida por todas e teremos uma abrangência geográfica mais favorável. Temos que dar uma resposta brevemente, porque teria de ser realizado em 16 de outubro. Temos de tomar essa decisão brevemente.
Por onde passará o futuro do clube?
Desde que esta direção tomou posse, fizemos uma junção de pessoas experientes e mais antigas com alguma juventude, e temos ambição de continuar durante algum tempo a gerir o destino do clube. O caminho será crescer de forma sustentada, sem dar passos maiores que as pernas. Por vezes surgem convites para fazer mais eventos e é tentador, mas temos de pensar no desgaste que isso causará na equipa. Preferimos fazer as provas bem feitas, e aos poucos ir introduzindo novos eventos.
Gostava de profissionalizar o clube, que é um caminho que tem de ser feito em Portugal. Não podemos ter pilotos, equipas e projetos profissionais e depois clubes amadores a gerir o desporto. Isto é mau. Há um desfasamento entre o empenho das estruturas profissionais e os clubes. Sinto que os clubes devem fazer esse caminho e gostava que o Motor Clube de Guimarães estivesse nesse projeto.
Também ambiciono fazer um projeto de formação com o município, tal como referi anteriormente, de forma a apoiar e fomentar o nosso desporto. Gostava de trazer de volta o todo o terreno para o clube e para a região, reativando o Transvimaranes, que juntava cerca de 300 jipes e motas. Já em 2024 queremos trazer esse passeio, por volta de novembro. Por fim, queremos fortalecer os laços com a nossa terra e a nossa gente.
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