O atoleiro da propaganda verde.

Por Paulo Emanuel Mendes.

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por Paulo Emanuel MendesJá lá vai o tempo em que o termo “verde” era utilizado para os militantes do um partido satélite do Partido Comunista Português. Hoje não. Hoje todos são verdes, todos são ecologistas, todos defendem as árvores e os bichinhos.

Não há nenhum político, nenhum “opinion maker”, nenhum orador que se pronuncie em qualquer palco, desde os faustos palcos das Nações Unidas e dos Governos aos modestos palcos da Junta de Freguesia ou da Escola lá da terra sem que faça questão de utilizar os termos “eco”, “sustentabilidade”, “neutralidade carbónica”, “biodiversidade”, “floresta autóctone”, “ordenamento do território” e muitos outros termos que fazem de nós verdadeiramente VERDES quando os pronunciamos.

Faço uma referência especial ao termo que talvez seja hoje o mais usado – Sustentabilidade. Há “sustentabilidade ambiental”, “sustentabilidade energética”, “agricultura sustentável”, “pesca sustentável”, “utilização sustentável da água”, etc, etc.

E as pessoas falam nisto, mesmo que muitas vezes não percebam bem os temas, porque já perceberam que algo de errado está a acontecer no planeta e temem pelo seu futuro. Ou seja, têm medo. Este sentimento agudiza-se nos jovens que receiam não poder vir a disfrutar da vida como viram fazer as gerações anteriores a eles.

Claro está que muita gente já compreendeu que a os temas ecológicos, e os sentimentos gerados de culpa por fazer lixo, de alegria por plantar uma árvore, de medo por temer fome, guerra e pobreza por causa das alterações climáticas, e muitos outros sentimentos, podem ser explorados para ganhar dinheiro.

As empresas e associações que exploram os temas ambientais espalham-se como fogo em restolho seco. Há hoje organizações que nos vendem o céu desde que se pague o preço justo. A sua fábrica queima um milhão de litros de gasóleo por ano? Não há problema. Nós plantamos 500 árvores. A sua autarquia tem as ETARs em sobre capacidade? Não há problema. Nós vamos ao fundo do mar e retiramos uma tonelada de plástico. Ninguém vai para aquela praia fluvial? Não há problema. Nós vendemos uma bandeira e vamos proteger a nascente do rio.

Como vimaranense, foi com um misto de orgulho e curiosidade que li uma postagem, numa rede social, da autoria de Domingos Bragança, presidente da Câmara Municipal de Guimarães, dando conta de que Guimarães é uma das três cidades finalistas para obter o galardão de Capital Verde Europeia 2025.

Fiquei também a saber, através de outra postagem de Domingos Bragança que Guimarães é o município com o maior número de freguesias (um total de 19) galardoadas com “Bandeira Verde” da Associação Bandeira Azul Europa (ABAE). Isto foi revelado na cerimónia “Galardão Bandeira Verde Eco-Freguesias XXI 2023”.

Aqui, com tanta pompa, tanto galardão, tanto verde, tanto eco, tanta ecologia, tanta qualidade ambiental, já fiquei com aquela sensação que nos faz lembrar o velho adágio popular “quando a esmola é muita, o pobre desconfia”.

Nestas minhas reflexões lembrei-me de um artigo escrito pelo biólogo, naturalista e conservacionista Nuno Gomes de Oliveira (que fundou e fez crescer o Parque Biológico de Gaia, só para mencionar uma das suas obras) sobre o “greenwash” e o “greenwashing”. Passo a citar:

“(…) Estas ações foram batizadas em 1989 como “greenwash”, palavra que deu origem a greenwashing (do inglês, verde + lavar) e consiste em usurpar valores ambientais para, com recurso a técnicas de marketing, transmitir à opinião pública a ideia de que são empresas ambientalmente muito responsáveis. Para isso recorrem a informações falsas, troncadas e frequentemente aos termos “eco”, “ecológico”, “sustentável”, “verde”, etc.

(…)

O mesmo acontece com autarquias que também recorrer a associações ambientalistas para branquearem a sua imagem, embora hoje a maioria das autarquias já tenha serviços próprios de greenwashing (…)

Infelizmente há várias associações de defesa do ambiente (ou ditas como tal) que se sujeitam a alimentar essas ações de greenwashing a troco de apoios que lhes permitem viver confortavelmente.”

A minha memória foi buscar as recordações da minha infância de Guimarães, de como a cidade era e do modo como se foi expandindo pelo território, sendo hoje um contínuo estradas e de edifícios destinados à habitação, comércio, indústria e armazenagem. Este é o resultado de décadas de construção desordenada

Guimarães não é propriamente conhecida pela sua qualidade ambiental. Pelo contrário. Uma breve pesquisa no google revela-nos que:

– “Detetadas seis descargas poluente para troço do rio Vizela em Guimarães” (Observador, 23/07/2021).

– “Guarda-rios de Guimarães denunciam foco poluidor no rio Ave (vmtv.sapo.pt, 27/04/2023).

– “Há mais de 5000 mortes por ano em Portugal relacionadas com poluição atmosférica – Regiões do Porto, Lisboa e Guimarães registam taxa de mortalidade mais elevada relacionada com dióxido de azoto.” (Publico 18/09/2022).

– “Inspeção-geral do território quer travar a via do Avepark” – “A Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (Igamaot) requereu, ao Ministério Público, que invalide a autorização de construção da estrada de acesso ao Avepark, em Guimarães, em terrenos de Reserva Agrícola Nacional. A informação surge em resposta à queixa da Associação Vimaranense para a Ecologia (AVE).” (Jornal de Notícias 18/05/2023).

Quando observamos o município do ponto de vista da utilização agrícola verificamos exagerada predominância da agricultura intensiva de culturas de apoio à produção animal e de vinhas, sendo que o concelho segundo a informação mais recente tem apenas 15 pessoas a trabalhar em modo de produção biológico (Observatório Nacional da Produção Biológica, 2020). Não é, portanto, pelo setor agrícola que Guimarães é “verde”, pois bem sabemos a quantidade de herbicidas, pesticidas e fertilizantes químicos utilizados na agricultura não biológica.

Já os espaços florestais são ocupados predominantemente com floresta intensiva onde se destacam pela área ocupada e pelo seu poder invasivo os eucaliptos. A expansão de outras espécies exóticas invasoras (EEI), como por exemplo a mimosa, é também um problema ambiental de grande relevância no território vimaranense. Esta floresta industrial alimenta de forma recorrente fogos que degradam cada vez mais os solos e a vegetação natural ainda existente.

Todo o concelho é de baixa biodiversidade e sem valores naturais relevantes dado o estado de degradação ecológica em que se encontram.

Por curiosidade fui ver os procedimentos para as candidaturas à “Bandeira Verde” das Freguesias e verifiquei que há um “custo” que varia entre os 225 € e os 750 € por freguesia a pagar à organização não governamental de ambiente (ONGA) Associação Bandeira Azul Europa (ABAE). Havendo em Portugal 3.091 freguesias, se todas concorrerem, a Associação ABAE arrecadaria um valor algures entre os 695.475 € e os 2.318.250 €, o que não são propriamente trocos.

Esta associação promove também o programa Eco Escolas implementado em 250 municípios com um custo de 80€ por escola e atribui também as bandeiras azuis sendo que o site da ABAE informa que foram “atribuídas” 394 a praias, 17 a marinas e 21 a embarcações ecoturísticas – não consegui apurar o preço a pagar em cada candidatura à bandeira azul.

Guimarães pode e deve promover a Natureza e o Ambiente. Para isso são necessárias políticas adequadas, acompanhadas de orçamentos apropriados e realistas, que resultem em atos concretos e não em intenções, ações de sensibilização, plantações de árvores para a fotografia, apanha de plásticos para a reportagem da televisão, etc. Assim rapidamente se cai nas garras do “greenwashing”.

Para resolver os problemas ambientais são necessários atos corajosos, caros, impopulares o que na prática se torna extremamente difícil.

Para não ser acusado de não falar em ações concretas, vou aqui divulgar algumas que considero necessárias e urgentes:

– Restauro dos ecossistemas florestais com substituição dos eucaliptais por espécies nativas;

– Parar definitivamente com desafetações de áreas da Reserva Agrícola Nacional (RAN);

– Apoiar financeiramente a transição para o modo de produção biológico;

– Aumentar os espaços verdes nas zonas urbanas;

– Nos futuros licenciamentos para construções diminuir os índices de construção para haver mais espaços verdes e menor percentagem de área impermeabilizada.

Mas as ações para proteção e restauro do planeta não podem ser feitas apenas pelos líderes em cargos eleitos ou de administração. É fundamental a participação empenhada de todos os cidadãos cientes que vamos ter de fazer alguns esforços e abdicar de alguma comodidade. Há muito “ecologista” que vive na Avenida de Londres e vai de carro para o ginásio da Avenida de Conde de Margaride, que fica largos minutos parado dentro do carro a trabalhar enquanto manda mensagens de telemóvel, ignorando as emissões poluente do veículo, que vai à rua fumar um cigarro e atira a prisca para a sargeta. Podiam-se descrever milhares de situações. Todos nó temos mesmo de fazer a nossa parte e pressionar os dirigentes para fazerem a deles.

Os assuntos da ecologia, conservação e sustentabilidade ambiental são vastos em complexos, e ocupam milhares de milhões de páginas em artigos, teses e livros por todo o mundo.

Deste modo muito mais haveria a dizer e a debater. Talvez numa próxima oportunidade.

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