O coração que marcou 2012: O coração de cada um, o coração de todos
Entrevista publicada na edição de janeiro da revista Mais Guimarães.
Em outubro de 2010, João Campos venceu um concurso para desenvolver a identidade visual de Guimarães 2012 — Capital Europeia da Cultura. Tornou-se o responsável pelo logótipo da Capital Europeia da Cultura 2012 que esconde a muralha e a viseira de um elmo. “É rematado sob a forma de um coração, em evocação do orgulho e sentimento de pertença dos vimaranenses em relação à sua cidade”, confessou à Mais Guimarães.
Como é que surge o coração da Capital Europeia da Cultura 2012?
Para uma marca territorial, como a marca Guimarães 2012 teria inevitavelmente de se assumir, os elementos potenciadores da identidade gráfica devem ser procurados nas características identitárias do território e respetiva comunidade. Particularmente, no caso de Guimarães 2012, o conceito base procurou refletir a cidade naquilo que é verdadeiramente diferenciador, reconhecido nacionalmente e único na história de Portugal — o seu papel da fundação da nação. Assim, o símbolo agrega alegoricamente a muralha, em representação do Património da Humanidade presente em Guimarães, o desenho da viseira de um elmo, que presta homenagem à visão de D. Afonso Henriques, e é rematado sob a forma de um coração, em evocação do orgulho e sentimento de pertença dos vimaranenses em relação à sua cidade.
Porém, não foi intenção tornar esta representação historiográfica como um fim em si mesmo. Garantida a pertinência histórica e adequação cultural, o símbolo foi desenhado para ser visualmente distintivo e salvaguardar o seu reconhecimento nas mais diversas variações gráficas, reunindo as condições necessárias para se tornar numa base sólida e consistente, potenciadora de explorações gráficas múltiplas. Uma janela aberta a cada visão pessoal ou uma tela em branco para qualquer expressão individual.
Foi fácil criar uma relação com Guimarães?
Sim, bastante. Além de uma história muito particular, única e cativante, o legado de Guimarães está bastante presente no pulsar da cidade e no espírito dos seus cidadãos. Tratou-se de um projeto de grande responsabilidade, tanto a nível da representação identitária, como na capacidade de envolver a comunidade. Mas sem dúvida que as respostas estavam todas em Guimarães. A força da nossa proposta, em última análise, esteve na forma como ligava os pontos certos — o que, embora aparentemente simples, não é, necessariamente, coisa fácil.
Há uma frase de Pina Bausch na apresentação deste trabalho, “o público é composto de indivíduos, todos eles diferentes; posso mostrar ou oferecer uma certa coisa, e cada um reagirá segundo a sua própria sensibilidade”. Qual foi a reação dos vimaranenses?
Houve gente que chegou a tatuar o coração no corpo, portanto, diria que, em muitos aspetos, superou as expectativas. Por envolver dimensões comunitárias e pessoais muito íntimas, um projeto desta natureza é sempre um projeto sensível. E, até, volátil, diria. Estamos, afinal, a falar de identidade. Neste caso em particular, pelo orgulho militante que é reconhecido aos vimaranenses, sabíamos que a identidade da CEC ou era entusiasticamente recebida ou liminarmente rejeitada. Dificilmente haveria um meio termo. Foi por isso indispensável assegurar, primeiro, a tal pertinência histórica e adequação cultural que uma identidade territorial está obrigada a representar. Mas, mais importante, era vital que essa representação fosse um convite à participação e à expressão individual. Uma cidade é experimentada por cada pessoa nas suas circunstâncias particulares. É depois a partir do conjunto das experiências individuais que surge o contributo humano para a identidade territorial. A diversidade é, aqui, o ponto-chave. Ora, foi esse espaço de expressão individual que quisemos que a identidade, na sua essência, celebrasse, e que julgo que, em última análise, ditou o seu sucesso.
Em 2014 o símbolo da CEC ultrapassou o âmbito restrito do evento. Imaginavas agora que, 10 anos depois, esse símbolo ainda estivesse tão presente no dia a dia dos vimaranenses?
Embora um sucesso desta dimensão não possa ser totalmente previsto, o projeto de identidade foi pensado e construído para sobreviver ao intervalo temporal da Capital Europeia da Cultura. Em 2014, quando a Câmara Municipal de Guimarães nos convidou a pensar a identidade do município, defendemos, precisamente, que o capital emocional criado com a identidade da CEC devia ser formalizado em património institucional. Foi assim que nasceu a atual identidade da CMG. Portanto, se quando criámos a identidade não podíamos prever que o coração se iria tornar instantaneamente símbolo da cidade, creio que, entre a resposta da população e as sucessivas decisões institucionais nesta matéria, se foi tornando evidente que o símbolo ficaria bem firmado na história da cidade. Precisamente, como pretendíamos desde início.
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