Café Oriental: A política ambiental como infraestrutura social

Por Francisco Teixeira.

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Por Francisco TeixeiraA candidatura de Guimarães a “Capital Verde Europeia” corresponde, depois da afirmação de Guimarães como “Cidade de Cultura”, à mais importante demanda estrutural do município, em linha com as obrigações e necessidades estruturais de Portugal e do mundo.

A afirmação política e programática do aprofundamento da qualificação ambiental de Guimarães tem a virtude de estruturar praticamente todas as outras políticas setoriais do município, desde as políticas de salvaguarda das paisagens naturais, da floresta e das reservas agrícolas, da água e tratamento dos lixos, passando pelo desenvolvimento urbano, pela mobilidade, pelo desporto, pela cultura, pela educação e, goste-se ou não, das implicações que daí se têm que derivar para o desenvolvimento turístico e industrial.

A água é, talvez, o principal e mais estrutural desafio de um concelho, um país e um planeta ambientalmente sustentáveis. A salvaguarda das fontes de água tem que ser, a todo o momento, a prioridade número um de toda a ação e planeamento políticos. Mais ainda que os monumentos nacionais, o património hidrográfico deve ser salvaguardado e protegido como condição vital da existência. A tolerância face às ameaças ao património hidrográfico deve ser igual a zero e, mais ainda, e mais difícil, a consideração do uso industrial da água deve ser ponderado aquando dos processos de licenciamento industrial e agrícola já que, ao contrário do que a retórica individualista faz crer, o uso da água é, maximamente, função do seu uso agrário, com a agricultura a gastar 75% da água disponível em Portugal.

Paralelamente, a salvaguarda das reservas dos territórios florestais e agrícolas, garantindo que as gerações vindouras disporão de reservas naturais de terrenos e paisagens (a partir das quais se estruturam as relações sociais e se criam as memórias coletivas), a que se soma a sua absoluta necessidade em termos de captura de carbono e melhoria das condições do ar em geral, constituem uma responsabilidade moral geracional, dos atuais decisores políticos para com as gerações vindouras.

Bem entendido, não há planeamento urbano ética e ambientalmente sustentável subordinado às pressões construtivas, individualistas ou especulativas, extrativistas ou economicistas, sem horizonte social e coletivo, sejam quais sejam as complexidades dos processos de planeamento de gestão do território. A política constitui, justamente, esse saber/dever de conciliação de decisão política complexa, capaz de articular o bem comum, uma ética de responsabilidade ambiental e um dever de pedagogia social e comunitária.

Mas não há exigências e responsabilidades ambientais que, simplesmente, passem pela paralisação das necessidades e direitos sociais impreteríveis de mobilidade física e social, de proximidade e acessibilidade cultural, de usufruto paisagístico. Por isso, a estruturação de um sistema de mobilidade urbana simultaneamente flexível e ambientalmente sustentável, capaz de conciliar a proximidade e a qualidade, exigem formas de planeamento, e execução, infraestrutural, ousadas e decididas, explicadas e participadas pelos cidadãos, maximamente inclusivas e consensuais. Se a política tem, e sempre terá, uma dimensão conflitual e competitiva, é nas políticas ambientais mais estruturais que se deve fazer o máximo esforço de consensualização social e participação comunitária, justamente porque a política ambiental carrega consigo dimensões infraestruturais de natureza biológica e ecológica a que ninguém, por mais ideologicamente cego ou interesseiro que seja, se pode esquivar.

Por último, umas palavras apenas para a indústria turística, que representa praticamente 10% do PIB português, o que tende a esmagar a possibilidade de um debate sobre as suas potencialidades e perigos.

O turismo é uma das indústrias mais poluentes do mundo, desde logo por via do transporte aéreo, mas também do transporte marítimo e do consumo exponencial de água potável. Para além disso, a própria natureza do “génio” turístico carrega consigo uma lógica de desgaste ambiental e de recursos perecíveis (como a água, desde logo), desequilibrando todas as estratégias de cuidado ambiental, com um efeito profundamente deletério sobre a vida urbana das cidades, desgastando os seus centros históricos, as suas sociabilidades tradicionais, as relações de memória intergeracional, expulsando as populações médias e pobres da habitabilidade local. Naturalmente, não se pode nem deve acabar com o turismo. Mas é impossível não concordar que só o desmaio cívico pós-democrático atrasa a sua regulação apertada, tal como outrora se apertou a regulamentação das indústrias tradicionais que matavam, e mataram, os nossos rios e paisagens, entretanto parcialmente recuperadas com enormes custos ambientais e económicos.

Responder integralmente aos desafios ambientais implica desenhar políticas e planear ações, debater e negociar interesses particulares, articulando-os com o interesse geral, sem perder de vista que a responsabilidade política ambiental é uma responsabilidade de justiça social, económica e geracional.

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