SÃOZINHA GIRA

Por Nuno Rafael Gomes

saozinha gira

Nome completo
Maria da Conceição da Costa Fernandes

Nascimento
21/11/1938
Fermentões – Guimarães

Profissão
ReformadaNão há quem não conheça a Sãozinha Gira em Ponte — e, arrisque-se, nas freguesias circundantes. Não tem os jeitos de celebridade nem almejará o estatuto, mas seja-lhe feita justiça: quem não conhece a cara, saberá, certamente, o seu nome. E a fama perdura: depois de, “há coisa de 30 anos”, ter deixado a mercearia e tasca de que tomou as rédeas em 1964, passou o estabelecimento para a filha. E o espaço, claro, chama-se Sãozinha, pelo legado deixado e porque a proprietária herdou o nome da mãe.

Sãozinha Gira recebe o Mais Guimarães como quem recebe família: abre as portas da sua casa, diz-nos para, “se faz favor”, sentarmo-nos numa das cadeiras cozinha. Só não se sente à vontade quem não quer; mais tarde, há de saudar quem entra no estabelecimento com um reconfortante “olha quem é ele!”

Ao longo de 25 anos, abriu as portas todos os dias “das 7h30 às 22h00 sem parar”. “Ora almoçava eu ora almoçava ele”, explica, ao mesmo tempo que Fernando, seu marido, observa a conversa. E ele também ajuda a desfiar esta história: “Ou então almoçavamos ali, tínhamos uma mesinha e tudo.” Quando chegou a altura de “passar o negócio” para a filha, sublinhou uma única condição: “Disse-lhe que só tomava conta se não fechasse a porta ao meio dia.”

Logo pela manhã, entrava-lhe na venda gente que, antes de “apanhar o autocarro”, ali bebia “um portinho ou um bagaço”, quem sabe “um traçadinho, que é meio bagaço e meio Porto”. Era o “mata-bicho” antes da labuta e Sãozinha diz ter perdido conta a quantos serviu. Também há de não se recordar de quantos “ovos cozidos” ou “postas de bacalhau frito” saíram da sua cozinha para satisfazer a clientela. Eram esses os petiscos principais num tempo que já passou, “quando ainda se vendia vinho de pipa”.

Nesse tempo, também terá ajudado muita gente. “Havia muita pobreza. Mas eu ajudei e não me arrependi”, atesta, com um sorriso de missão cumprida. “O meu padrinho dava uma sopa e broa a pessoas que vinham dos lados de Sande [São Martinho] e Balazar, até iam descalços até à cidade e só lá é que punham os sapatos. E eu, quando vim para aqui, fiz o mesmo que o meu padrinho”, conta. E foi “na zona de Caneiros” que Conceição nasceu, no final da década de 1930. No final do 4.º ano de escolaridade, sabia que destino a adivinhava, mas bateu o pé: “Só pedia ao meu pai para não me pôr na fábrica.” E conseguiu. Quis o fado que se fixasse em Ponte, um ano depois de casar, e ali fizesse a sua vida, que teve tanto de “trabalhar” como de “ajudar”.

“Faço o que gostava que fizessem por mim”

Eram muitos os que, na impossibilidade de pagar tudo a pronto, lhe pediam para pagar as compras aos poucos. “E eu lá punha. Iam pagando consoante conseguiam, mas nunca ninguém me ficou a dever nada”, afirma. Nem que “os calotes” demorassem anos a desaparecer do livro: “Uma senhora apareceu aqui passado 20 anos. Emigrou e, depois, quando cá apareceu, nem eu sabia onde estavam os papéis. Mas ela lembrava-se de quanto devia e pagou”, recorda, orgulhosa da boa fé alheia. E diz, quase desvalorizando o altruísmo que ainda hoje lhe pauta a vida: “Faço o que gostava que fizessem por mim.”

Há mais de 40 anos que faz parte da Conferência Vicentina, uma associação da vila de Ponte que, sintetiza Sãozinha, “procura ajudar quem mais precisa”. E a solidariedade faz-se de muitos atos: “Agora fazemos visitas a quem estiver nos lares, mas mais aos que não tiverem visitas de familiares.” E tempo para si própria? Vai arranjando nos intervalos de cuidar da casa e de cozinhar para os filhos “que continuam a almoçar na casa da mãe”. Cuida do filho Zézé e, com Fernando, espera por ele às 17h30 “certinhas”, mesmo que Zézé só chegue a casa às 18h00. E nunca lhe notamos algum queixume quando relata o que faz pelo filho. Talvez seja por isso que, em Ponte, a saúdem como quem cumprimenta um familiar. Porque a Sãozinha Gira foi e é uma cara e voz familiar. •

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