Toco, toco, toco, pum, toco, pum, toco, pum
Por Vânia Dias da Silva.
por Vânia Dias da Silva
Jurista e Professora convidada no IPMAIA
Dedilho este texto embalada pelo rufo quente das caixas e dos bombos que animam o início da invernia vimaranense desde tempos imemoriais, enquanto vou corrigindo as já poucas fífias do meu filho de 8 anos que, ao meu lado, ensaia energicamente o toque do Pinheiro, ao som de uma cantilena inteligente que circula no Youtube e que, em poucas horas, lhe ensinou o que fui incapaz de lhe transmitir em dias.
Depois das papas de sarrabulho, dos rojões e das castanhas novamente degustados no recato de minha casa, do recolhimento do mais novo e, felizmente, do enésimo “toco, toco, toco, pum, toco, pum, toco, pum”, lá em baixo, permanece a troada habitual. Com o mesmo ritmo, com a mesma força e, a avaliar pelo que ouço, com todos quantos quiseram manter a festa. E não parecem poucos, apesar da proibição.
Quando o caro leitor ler estas linhas, o Pinheiro de 2021 será já passado e saberá muito mais do que sei agora, no exacto momento em que o cortejo censurado afinal acontece. Mas uma coisa é já certa: a Câmara Municipal de Guimarães perdeu a face. E perdeu-a por, mais uma vez, não ter sabido gerir uma coisa que era evidente e tinha a obrigação de não desconhecer.
A pandemia não acabou e a COVID-19 continua a dar-nos cabo da vida. Tanto nas coisas mais triviais, como no essencial. Com que grau de acerto se vão tomando medidas, é matéria que a história melhor avaliará, mas já todos percebemos que não há muito mais a fazer e que, por isso, com a segurança possível, “life goes on”. Foi exactamente isto que, estranhamente, a Câmara não compreendeu e não podia não ter compreendido, com a agravante de que deu o sinal contrário até ao último momento, acalentando esperanças que não podia ter dado, pelo menos no modo em que o fez.
Qualquer vimaranense sabe o que são as Nicolinas e, particularmente, o que é o Pinheiro – um grande ajuntamento de pessoas alegres que, em folia, celebram, com os excessos próprios e menos próprios, uma tradição que é única e que todos queremos preservar. Razão por que, é facto, a festa, celebrada em contexto pandémico, não era aconselhável, nos moldes habituais. E não é de agora que não era aconselhável no modelo tradicional. Há já dois meses que vínhamos percebendo o que era óbvio – a chegada do inverno iria agravar a aparente acalmia que a vacinação e o verão trouxeram. Só que a edilidade preferiu ignorar, levando tudo com a normalidade costumeira, até que, a dias do evento, escudando-se na protecção civil municipal – de que o Presidente de Câmara é o responsável máximo, note-se – deu o dito pelo não dito e proibiu o cortejo do Pinheiro. Resultado: a revolta instalou-se, como era previsível. E o cortejo e os ajuntamentos nos restaurantes e nas ruas aconteceram desordenados e em tom de desafio.
Se, ao invés, a Câmara tivesse prevenido esta circunstância e tivesse encontrado um formato “fazível” – por exemplo, permitir um cortejo apenas com a comissão e os finalistas, apelando ao resguardo da população, para permitir àqueles jovens experienciar algo que levarão para a vida, não tenho uma dúvida de que os Vimaranenses não só aceitariam, como aplaudiriam em gáudio. Mas não. A festa fez-se estragada, com efeitos desconhecidos, e com uma Câmara totalmente desautorizada. Foi só uma estupidez!
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