O OURIÇO E O RATINHO DO CAMPO NÃO HIBERNAM!
por JÚLIO BORGES Docente O pequeno ouriço e o ratinho do […]
por JÚLIO BORGES
Docente
O pequeno ouriço e o ratinho do campo brincavam alegremente no prado.
Toda a primavera havia sido assim. Acordarem ao raiar do sol e desfrutar do que a natureza lhes proporcionava. Sementes aqui e acolá, rebentos de flores em todos os locais por onde passassem, água fresca do ribeiro ainda intocado pelo bicho Homem que tudo destrói e contamina com as suas máquinas, preguiça e vontade de ter mais e mais coisas.
Chegado o verão, o calor intensificou-se e todos os animais começaram a dura tarefa de juntarem alimento para o outono húmido e cinzento e para o inverno rigoroso onde tudo se cobria de branco. Todos não! O ouriço e o ratinho continuavam a brincar e a aventurar-se por todos os buraquinhos e tocas que pudessem encontrar, como se a aventura não tivesse fim. Assim como o verão.
As formigas censuravam este comportamento e falta de bom senso dos dois amigos. As rãs coaxavam lições de moral. Os esquilos avisavam os dois amigos, prevendo a fome que estes iriam passar quando a comida escasseasse. E a coruja sustentada na sua sabedoria e gulodice, ria-se de si para consigo, saboreando os dois animaizinhos mentalmente, aguardando pela chegada do outono e inverno.
Mas a todos os pronúncios de desastre e calamidade os dois animaizitos faziam ouvidos moucos e seguiam a sua felicidade, não deixando perceber se estavam preocupados com os avisos e com as mudanças futuras que se aproximavam a grande velocidade.
Num dos seus passeios, encontraram uma casa humana muito estranha. Como todas as casas de humanos. Não havia despensas para guardar alimentos. Não havia galerias e espaços para se dormir. Existiam sim cadeiras e mesas e umas enormes caixas de madeira com objetos repletos de folhas e rabiscos. Mas, o mais estranho era que a casa estava vazia e repleta de folhas saborosas para comer e de sementes trazidas pelo vento que se armazenavam numas pequenas frinchas no chão.
Estavam salvos! Teriam uma vida de rei dos animais. Lugar seco e protegido, com alimento para subsistir no inverno, longe de predadores. Que maravilha aquilo iria ser.
Não contando a ninguém, continuaram as suas diabruras, travessuras e aventuras como se o outono estivesse longe, o inverno não chegasse a aparecer por aquele lado da floresta e a sua vida fosse curta demais para se preocuparem com o seu sustento e subsistência.
As primeiras folhas começaram a cair. As primeiras gotas de chuva fria encharcaram os prados, e as tocas mais próximas do solo e das raízes das árvores. O mês de outubro estava próximo e o outono fazia-se anunciar.
Os esquilos recolheram às suas tocas nos troncos das árvores. As formigas taparam todas as saídas dos formigueiros e as rãs e alguns sapos cavaram no solo o seu leito de hibernação. Apenas os dois amigos, inseparáveis e desprevenidos se mantinham acordados.
Viram as andorinhas partir, assim como os patos bravos e viram surgir com mais persistência pelo de raposa. Aquela matreira carnívora deveria andar por perto e pronta para enganar alguém ou a preparar alguma partida. Talvez à procura de outro jantar, pois com certeza já fizera a digestão do pobre e vaidoso Patolino.
Com as primeiras geadas e chuvas fortes correram velozes para aquela casa que os abrigaria durante as estações mais frias e onde viveriam confortáveis e descansados até o sol ser suficientemente quente para mais uma estação de aventuras começar.
Chegados ao destino de outono e inverno, qual não foi o seu espanto quando se depararam com a casa repleta de humanos, daqueles mais velhos e com óculos que falam constantemente e daqueles mais jovens que falam e falam, brincam e brincam.
O outono e inverno do ratinho e do ouriço foi num local seco e quente, onde encontravam alimento facilmente, mais não foi tão descansado como previam. O barulho era constante. Gritos e risadas, portas a bater e cadeiras a arrastar e aquela campainha irritante, constantemente a tocar.
Chegada à primavera, os dois amigos estavam cansados e com vontade de hibernar.
Mas para além da lição aprendida também aprenderam a ler.
Ilustração, ficha técnica:
O pequeno ouriço e o ratinho do campo
Aguarela s/ papel
Bárbara Correia da Silva
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