ALDÃO… PRESENTE

MARIA CUNHA e CASTRO Junta de Freguesia de Aldão

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por MARIA CUNHA e CASTRO

Junta de Freguesia de Aldão“Ao que tudo indica, «imparir» tem muito a ver com o ato de parir para dentro. Fazer sumir. Nascer para o interior. Pessoas quando paridas saem do ventre da mãe e o Estado nunca mais as larga da mão. No caso da banca tudo é diferente. Veja-se o caso do BES e do BANIF: o dinheiro entrou para o seu ventre e nunca mais foi visto. Foi «imparido», literalmente.”

É provável que a nossa economia esteja a melhorar e ainda não tenhamos reparado no facto. Melhorar, como sabemos, pode não estar relacionado com fortalecimento estrutural, mas com a mudança na forma como afirmamos as coisas. É por isso que, aprimoraremos muito se em vez de termos uma economia fortemente estruturada, que é como quem diz, assente em alicerces profundos e não em estacas de madeira e passarmos a ter uma economia autossustentável que é como quem diz, uma economia que produz per se, alimenta-se per se e reproduz-se per se. Só não vê quem não quer que o nosso verdadeiro problema é a sustentabilidade, já agora, permita-se a ousadia de usar a palavra original que deve ser dita em estrangeiro:  sustainability, porque assim dito é muito mais profissional e, é certo e sabido que a empresa que contratar profissionais capazes de introduzir neologismos, de preferência anglicanismos (nunca aplicar galicismos que isso é jurássico), para afirmar competência profissional está no bom caminho da globalização (globalization no original e nunca «mundialização» que é coisa de francês pobre armado em culto).

Aliás, toda a organização que se der ao trabalho de mudar no sentido da novilíngua pode estar a caminho de nunca morrer. E pode fazê-lo através da inclusão de «maturidades» nos seus planos, isto é, mandar as dívidas para as calendas gregas que como sabemos, no caso dos gregos, é coisa literal e quer dizer “pagar só no dia de s.nunca à tarde”. «Maturidades», como sabemos, é a velhinha “data de vencimento”, «instituição» que muitos cabelos brancos criou aos contabilistas do século passado. Hoje está totalmente rejuvenescida, provavelmente através de uma operação plástica (diz-se lifting) que lhe retirou a idade mas deixou-lhe a sabedoria. «Maturidades» expressa também a ideia de que se está perante coisa madura, debatida, pensada e repensada. É claro que, lá para as ilhas britânicas se usa a palavra maturity, que muito prosaicamente quer dizer “data final de pagamento”. Todavia surge a pergunta: como se afirmaria a economia nacional no mundo global sem uma mostra tácita do conhecimento do mundo? Prá frente «maturidades», que isso é a solução certamente!

O escrevedor deste texto tem um carro em estado totalmente «imparido». Já não é bem um ativo. Na verdade anda muito próximo de um exausto chaço envelhecido em chapa de crise endémica. Em tempos dir-se-ia que estava totalmente amortizado, o que queria tão só dizer que o seu justo valor era zero. Podia também dar-se o caso de haver uns calotes em balanço que era necessário provisionar, isto é, prever a possibilidade de nunca mais se receber cheta de uma determinada dívida. Mas desde que a gestão se estrangeirou já não há provisões e amortizações; agora temos imparidades. Está bom de ver que uma empresa como o BES “impariu” muito dinheiro. Ao que tudo indica, «imparir» tem muito a ver com o ato de parir para dentro. Fazer sumir. Nascer para o interior. Pessoas quando paridas saem do ventre da mãe e o Estado nunca mais as larga da mão. No caso da banca tudo é diferente. Veja-se o caso do BES e do BANIF: o dinheiro entrou para o seu ventre e nunca mais foi visto. Foi «imparido», literalmente. Limpinho, limpinho. Perante uma «imparidela» destas o Estado não sabe como agir. Nem lhe passa pela cabeça anular as contas dos últimos dez anos e pedir os lucros de volta.   

É claro que “imparidade” é mais um anglicanismo introduzido na língua portuguesa à força bruta da mudança económica. Na verdade, para os nativos ingleses a expressão «impairment» quer dizer «enfraquecimento», «dano» ou «diminuição» e, às vezes, prejuízo. Em português de lei a expressão simplesmente não existia até começar a haver mudanças mundiais na figuração profissional do gestor económico.

É verdade que todas as profissões tendem a encontrar uma linguagem cifrada, promotora daquilo que configura a sua autoridade. Quando da disseminação da informática era um idílico escutar os profissionais dessa arte. A novidade expressiva legava aos informáticos a mesma autoridade que os médicos promovem quando querem marcar a sua posição de detentores de uma técnica impenetrável e, por isso, não recomendável a leigos. Eis agora os profissionais da gestão em estado de reforço do recorte da profissão através da produção de uma linguagem própria. O ridículo do linguajar estrangeiro tem um momento extraordinário no youtube com «o portuguesing do Zeinal».

Na verdade os novéis economistas deviam pensar um pouco na «accountability» (ups! I did it again!) que os próprios vendem ao desbarato como a quintessência organizacional. Em português «accountability» pode ser traduzido para «prestação de contas», sendo que o prestar contas aqui aludido não se limita à verificação contábil mas a todo o impacto dos atos da organização. Presume-se que o ato de conspurcar a língua deva constituir também uma preocupação sua.

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