BRASIL, LOGO SEXO

ESSER JORGE SILVA Sociólogo

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por ESSER JORGE SILVA
Sociólogo

(…) E uma daquelas moças (…) era tão bem-feita e tão redonda, (…) que a muitas mulheres da nossa terra, vendo-lhe tais feições, fizera vergonha, por não terem a sua como ela (…)

Carta de Pero Vaz de Caminha a El Rei D.Manuel, 1 de Maio de 1500

 

É homem? Viaja ou pensa viajar para o Brasil? Não escapa: vai atrás de mulheres brasileiras seguramente! A plantação mental é antiga mas só recentemente descobri que os portugueses em geral estão possuídos por uma representação do Brasil comandada pelo sexo. Não importa aqui se é amigo ou inimigo, homem ou mulher, conhecido ou desconhecido, com estudos e sem letras. Funciona como a experiência de Pavlov: mal soa a campainha Brasil, em Portugal saliva-se. É uma nova versão de “cogito, ergo sum” de Descartes traduzida na afirmação tuga “Brasil, logo sexo”. Como se em cada indivíduo residisse um Freud, ninguém se limita, infernizando a vida do viajante e família com declarações cuja realização já é dada como certa e sabida muito antes da imaginada explosão de prazer se dar. É espantoso o revirar de olhos. O riso maroto e constrangedor. A expressão de adivinho “a mim não me enganas tu”. Em muitos casos, o traço expressivo é de inveja: “quem dera que fosse eu”.

É preciso delimitar: o cenário ocorre apenas quando se é homem em viagem porque a nenhuma mulher portuguesa que vá para o Brasil se afirma ou declara que vai à procura da subida da líbido. De onde veio esta malha mental que poisou tanto sexo de “brasileiras” na cabeça de portugueses? Como compreender que homens portugueses enlouqueçam pelas mulheres brasileiras e mulheres portuguesas não se amaluquem pelos homens brasileiros. Toda a informação guia-nos para uma competência extraordinária delas em matérias do uso do corpo nas artes e manhas do sexo. Mas senso comum não chega e, por isso, é preciso continuar a perguntar: porquê? Como? Terão as mulheres brasileiras um dispositivo especial temperado com sãs pimentas afrodisíacas, corpos libertando fragâncias de intenso cheiro tropical, uma alquimia forjada em magias encantatórias, um projetar da voz serenamente apelativo e magnético ao ponto de atrair como se de sereias se tratasse?

Revisitemos um caso. Regressemos às “mães de Bragança” e a reportagem em 2003 da revista “Time” que ali encontrou a mais ocidental “Red District” lusitana? Guarda-se memória de uma espécie de greve de sexo no lar em confronto com uma hiperatividade dos maridos nas dezenas de casas de alterne existentes, em sofrida e esfomeada interação com competentes profissionais do sexo “made in Brasil”, por ali surgidas no apelo “dos mercados” como agora se diz. De uma delas guardei a resposta na TV: “veja bem, os homens chegam aqui dizendo-se infelizes, que suas esposas não se produzem, cheiram a refogado a maior parte do tempo, gritam com eles… e a gente apresenta-se assim, bem vestida, cheirosa, arrumada, dando um carinho, felicidade, enfim… tá entendendo”. Entendi: a literatura também apresenta as prostitutas não só como confidentes mas também como grandes psicólogas, capazes de resolver muitos problemas com origem no interior do lar do cliente.

Deixemos o imaginário levantado por Pero Vaz porque os arquétipos estão nos inconscientes coletivos deste lado do mar. O problema parece ser mais das relações entre portugueses e portuguesas cuja satisfação pede um estudo à moda de Alfred Kinsey. Há por aí muita insatisfação, muito desejo reprimido, muita vontade de fazer o que ainda não foi feito. Sobram algumas hipóteses explicativas. Faltam as provas. Será que tanta dívida não destrói a líbido? Tanto desejo de parecer não seca o ser? Sofisticação pela aparência não afoga a beleza que seria evidente? Há vergonha? Nojo? O credo da igreja católica continua a imperar? É pecado? Fazendo bem em casa vai para o inferno? Fazendo bem com brasileira vai-se para o céu? São questões.

No meio disto tudo aprendeu-se a diabolizar a mulher brasileira em Portugal. Colegas brasileiras revelaram-me o desconforto. Basta ouvir-se falar o português mais melodioso e sem arestas para haver sentidos em alerta. Em Braga uma colega jornalista de uma importante cadeia de televisão brasileira foi surpreendida pelo canalizador; ele propunha-se canalizá-la também pelo que queria saber quanto ela cobrava. Um professor de uma universidade chamou a atenção de alguém que intercedia por uma aluna brasileira: “cuidado, as brasileiras são manhosas e interesseiras”. Recentemente a esposa de um amigo foi escolhida pela alfândega do aeroporto de Lisboa. Aí as perguntas das autoridades surgiam formuladas não para uma pessoa mas para uma prostituta. Não estava escrito na testa dela mas prescrito na linguagem dele. É impossível imaginar uma mulher portuguesa sendo tratada como uma prostituta no Brasil. Eu acho bem. Ninguém trata uma engenheira com régua e esquadro, nem uma médica com bisturi, nem uma intelectual com uma biblioteca. Antes fosse. Saberiam que o equipamento de trabalho de uma mulher não lhe dá existência profissional. Mesmo prostituta.

Esta doença “sexomental” decorre das escolhas do mercado económico em que a procura larga de profissionais do sexo deu grande expressão à oferta escassa de brasileiras. Sim, porque o incomensurável maior número de prostitutas portuguesas não preocupa os portugueses. E ao contrário do queijo da serra que tem sucedâneos, como por exemplo “queijo tipo serra”, não se vislumbra por aí a “prostituta tipo brasileira”. Na voragem dos implantes que por aí grassa, seja de lábios, mamas, rabos, coxas e afins, escapa ao código pasquim que a generalidade das brasileiras são mulheres normais, preocupadas com a espuma dos dias, vivendo habitualmente e desejando que as deixem em paz e sossego. Aliás, como as mulheres portuguesas.

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