OS CUSTOS VIMARANENSES DOS ANOS SEM IMPRENSA

ESSER JORGE SILVA Sociólogo

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por ESSER JORGE SILVA
Sociólogo

 

Sondagens são um produto estatístico com que me habituei a lidar.
Um trabalho de grande dimensão e profundidade que resultou no relatório da avaliação do impacto da Capital Europeia da Cultura e em que participei – com muito orgulho, diga-se – permitiu-me um mergulho em profundidade na arte de conceber perguntas, no rigor da construção de amostras, nas estratégias de as aplicar em público e, mais do que isso, na descoberta da forma, muitas vezes indelével, como se orientam respostas.

Nos últimos anos vicissitudes académicas entregaram- -me unidades curriculares dessa arte de verificar a realidade com a estatística. Estou, gostosamente, sempre a aprender com elas.
No mês de julho passado uma sondagem política publicada em o “Comércio de Guimarães” enfureceu alguns e alegrou outros tantos. A sondagem apontava para uma expressiva tendência de voto em Domingos Bragança. A mim não me pareceu haver ali nenhuma novidade. Às muitas perguntas que me foram feitas respondi sempre da mesma forma:
não acredito em manipulações de sondagens como negócio de empresas que a elas se dedicam.
Descortina-se, todavia, na sociedade política portuguesa – assim como na vimaranense – a ideia de que todas as sondagens são o produto de uma qualquer manipulação a que responde primeiro o dinheiro. Nessa peregrina ideia, sondagens compram-se com o resultado que se pretende. Vai-se ali e, tal como se fosse um produto de feira, pede-se “saia mais uma sondagem por favor, de preferência com o partido X a ganhar por muitos”.
O aparecimento de uma nova sondagem recentemente publicada neste jornal recentrou as
conversas dos mentideiros locais e as “análises políticas” de café. Com resultados muito diferentes da anterior, nomeadamente manifestando uma aproxima- ção entre André Coelho Lima e Domingos Bragança, voltaram a aparecer os analistas que vêm nesta ferramenta de medição da realidade uma arma de combate político. Portanto, se a outra era um negócio do partido X, esta é um negócio do partido Y.

Afortunadamente vou verificando que esta forma de receber uma sondagem é um exclusivo dos indivíduos mais partidarizados. Desafortunadamente vou verificando que a desacreditação posta em prática pelos aparelhos partidários consigna também a desacreditação dos populares despolitizados, mas votantes. Parece persistir neste comportamento uma espécie de terra queimada na qual perdem os partidos e perdem os cidadãos.
Estes comportamentos dos profissionais de aparelho, que necessitam da política para viver, nem se dão conta da morte que vão infligindo à sua galinha de ovos de ouro. Ao venderem o descrédito da política desta forma, atribuindo-lhe a capacidade de tudo comprar, tudo transacionar, tudo manipular – passando a ideia que tudo é transacionável e que, pasme-se, eles têm dinheiro para tudo comprar – estão a dar um sinal muito claro aos votantes, pessoas que precisam de acreditar na política, para se afastarem rapidamente do lodaçal que por ali parece grassar. Esta atitude engrossa, sobremaneira, as taxas de abstenção.

Para além dos que não aprecem às urnas, estão agora a manifestar-se no número de votos em branco que tem aumentado exponencialmente nas últimas eleições.
Para debelar esta circunstância ajudava muito às pessoas a existência de um imprensa diversa e plural. Guimarães teve essa imprensa assim constituída. Não se tratava de ser “isento” palavra vã e falaciosa quando se fala em media. Não há imprensa “isenta” em lado nenhum do mundo. Tratava-se de se ser “independente”, qualidade que tem atrás de si a ausência de medo e a coragem do passo em frente com o argumento em riste. Infelizmente quase toda essa imprensa subsumiu-se na voragem da crise económica de 2008.
A partir de 2013 um profundo desinvestimento na imprensa, o avanço generalizado da pobreza de espírito, a instalação de uma sociedade frouxa e acrítica acabou por prejudicar tudo e todos, inclusive a qualidade predominante no interior dos partidos políticos. Os anos sem diversidade temática, confronto de opiniões, diversidade de perspetivas, debate de ideias, abordagens surpreendentes; estes anos todos sem nos chatearmos uns com os outros, sem nos diferenciarmos, sem a marcação de territórios identitários de política – que também se designa por ideologia – fez-nos retroceder para um certo espírito de paróquia.

Creio que é também chegada a hora de voltarmos a discutir a cidade, não para que dela nos tornemos senhores, mas para que nela nos tornemos cidadãos. Só dessa forma introduziremos qualidade na política.

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